Paços de Ferreira-Benfica, 0-0 (crónica)

21 out 2000, 22:15

Noite de tédio na Mata Candidato e sensação não cumpriram expectativas. O jogo, de delícias prometidas, foi quase entediante, salvo por loucas correrias e pontadas de emoção. De talento e arte distinguiram-se apenas leves vestígios. Especialmente nos pés de Poborsky, cujo sacrifício a vincados cuidados defensivos fica difícil de perceber.

Um candidato persistente, um surpresa orgulhosa e nada de particularmente distinto ou brilhante no resultado da fusão de ambos no mesmo relvado. Duas gotículas miseráveis espirraram do aperto nas simulações de Poborsky, que, para cúmulo, o jogo perdeu cedo demais, nas pitadas de génio de Dani, detectáveis apenas ao microscópio, e, mais tarde, no rendilhado de Everaldo. 

O encaixe era meramente vulgar. Denso, intenso, mas repulsivo, ao alcance de qualquer interpréte sem ponta de encanto, condição que o Paços tinha de sobra e que o Benfica, comentara-se, havia recuperado numa tarde recente, na Luz, nos pés de Miguel, que em Paços de Ferreira batiam paciente e compassadamente no banco, para não gelar. 

No relvado os estímulos eram raros. As bancadas, cansadas de alarmes falsos, já não se erguiam aos dribles-promessa. Renderam-se momentaneamente aos fracassos desenhados uns metros mais abaixo, para fervilharem pelo fim, nos estertores de um jogo que fedia a suor, sem vaporizar uma nuvenzinha de perfume. Pouco ou nada de melhor podia ser gerado do que o cruzamento de Maniche, que um adversário intrometido roubou à cabeça de Van Hooijdonk, ou a reviravolta de Poborsky, que, noutros tempos, Dani transformaria numa obra de arte, mesmo de olhos fechados. No começo de noite em Paços de Ferreira, com os olhos bem abertos, o menino capaz de prodígios deixou que a bola descansasse nos braços de Pedro. 

Estranhos sacrifícios 

O Benfica movia-se em articulações básicas, quase rudimentares, deixando que Chano se distinguisse como um dos mais velozes, talvez o ponto preferido de um jogo condenado a perder sentido. Não que a culpa fosse do espanhol, organizado, metódico, resistindo às tentações do ataque e amarrado à face mais defensiva da trama, que sacrificava até Poborsky e os pés mais deliciantes de uma equipa que procura desesperadamente talento e pontos de desequilíbrio. O mais óbvio estava ali, correndo como um louco a fechar o flanco, a desesperar-se e a cometer excessos em que o árbitro foi cúmplice. 

Van Hooijdonk era pouco. Ainda assim, suficiente para garantir a primeira e última vantagem do Benfica. Escapava-se, quando João Armando o travou. Num agitar ostensivo do punho direito do árbitro, os encarnados conseguiam cheirar o golo e distinguir as formas indeléveis da vitória. João Armando saía mais cedo para o duche e tudo se simplificava. Havia quase uma hora para jogar e muitos pontapés para flagelar a bola. 

Com o intervalo pelo meio e retoques estratégicos à mistura, nada mudou. O Paços de Ferreira, mesmo perdendo Rafael numa longa e irritante troca de mimos com Fernando Meira, mesmo tentando perceber o que se passava com Paulo Vida, mesmo em desvantagem numérica, bastava para o Benfica. Chegava a crescer nos improvisos de Everaldo, baralhava as contas e levantava dúvidas sobre quem realmente jogava com menos um, sobre quem experimentava maiores aflições. 

Compulsivamente, empurrado por uma defesa contemplativa, Enke esclareceu a parte da dúvida que um simples exercício de contabilidade ou um leve esforço de memória deixara em aberto. Pulou, voou, desunhou-se e gritou para evitar a humilhação. O Benfica, que transmitira suaves sinais de melhoras, algumas até agradáveis, voltava ao ponto de partida, regredia até à estaca zero em que José Mourinho lhe pôs a mão, há precisamente um mês. Com a atenuante de recorrer à equipa B na falta de dinheiro e reforços e com a agravante de ter agora nove pontos de atraso em relação ao F.C. Porto. 

Expulsão acertada 

Para o árbitro não sobram grandes críticas. Quando muito, sérias dúvidas sobre as quedas de Paulo Vida e Van Hooijdonk em áreas adversas e um punhado de lamentos por questões de pormenor e pequenas faltas. Na expulsão, João Armando não lhe deu alternativa. Pedro sim, reservava outra escolha a João Armando, quando se atravessava no caminho do holandês, prometendo chegar primeiro à bola. Duarte Gomes pagou-se da precipitação com um vermelho directo. Sem direito a troco nem reclamação.

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