O Sporting-Benfica mostrou que num duelo entre grandes pode prevalecer o rigor de quem defende. E até pode ser decidido pelas figuras teoricamente menos cotadas
«Fomos a única equipa que tentou ganhar o jogo»MARCO SILVA
«Os jogadores criativos do Sporting e do Benfica não apareceram no jogo individualmente porque as duas equipas souberam anular o um contra um.»
JORGE JESUS
O que ficou do Sporting-Benfica?
Que dificilmente o conjunto de Marco Silva chegará ao título (embora não seja impossível).
Que o Benfica se mantém como principal candidato
E algumas coisas mais.
Não foi um dérbi excitante, dentro do campo. Fora, até foi: enchente em Alvalade, clima aparentemente normal nos dias anteriores ao jogo e muito tenso depois dele (que até chegou ao corte de relações institucionais por parte do Sporting
Mas centremo-nos então em coisas que interessem. No futebol, no jogo
O espetáculo soube a pouco
Não é costume, mas este duelo entre grandes foi decidido por jogadores teoricamente menos cotados. Figuras menores na constelação sportinguista e benfiquista: Jefferson, marcador improvável do 1-0 e autor de bela exibição, e Jardel, outro «goleador» imprevisto, do lado do Benfica.
Artur, depois de dias de sombra e dúvida sobre se teria condições para substituir Júlio César, acabou por mostrar que tecnicamente continua a ser um grande guarda-redes, assinando enorme defesa que impediu Carrillo de fazer o 1-0. No golo, ainda travou um primeiro remate e não tinha hipótese de chegar à recarga. E sim, acusou também dois momentos de menor concentração, mas nenhum deles comprometedor.
As defesas não «ganharam», mas também não perderam
«Nunca vi o Sporting com capacidade para nos fazer golo, mas também não vi o Benfica com muita capacidade para fazer golo (…) Tivemos a sabedoria e a sorte de saber posicionar os jogadores de forma a que uma segunda bola pudesse ressaltar para um jogador nosso»
JORGE JESUS
Um exemplo de uma exibição bem conseguida? William Carvalho
Outro caso de desempenho muito positivo? Paulo Oliveira
Nani, já se disse, passou ao lado do jogo. Mas também Salvio. E mesmo Lima. E até Carrillo, se descontarmos aquele belo cabeceamento.
Ou seja: as defesas melhores que os ataques; quem precisava de anular o jogo contrário passou melhor durante o clássico do que quem teria arte para desfeitear o adversário.
Jorge Jesus argumentou, no final, que também há beleza «em defender bem» e em saber interpretar o «momento defensivo». Uma ideia a remeter para tese que José Mourinho apresenta há muito: a de que «são as defesas que ganham campeonatos».
O empate premiou essa tal prioridade que o Benfica quis dar ao rigor defensivo, mas o campeão saiu de Alvalade com a sorte grande: a derrota esteve mesmo por breves momentos e implicaria a reentrada do Sporting na corrida ao título e um FC Porto que ficaria a meros três pontos.
Embora tendo jogado mais que o rival, o Sporting também não mostrou, na verdade, muito maior capacidade para chegar à baliza contrária. Mostrou atitude, alma, mas acusou falta de talento ofensivo para contrariar o tal «momento defensivo» preparado por Jesus.
O FC Porto mais perto e o Sp. Braga a espreitar o pódio
«Não entendo os que dizem que jogam em contra-ataque. Para jogar em contra-ataque é preciso espaço. Seria absurdo dizer que uma equipa não quer aproveitar espaços porque não joga em contra-ataque. A chave é saber o que fazer com a bola para que a posse não acabe num contra-ataque. Ninguém oferece espaço. É preciso trabalhá-lo. E quando o temos, temos de aproveitar»
JULEN LOPETEGUI
Quem tirou mais créditos do duelo lisboeta foi, obviamente, o FC Porto
Herrera, com dois passes para golo, provou que ainda pode chegar perto, no FC Porto, do que rende na seleção mexicana. Mas o que fica, essencialmente, da vitória portista no reduto do Moreirense é o instinto matador de Jackson:
Os dragões ainda têm caminho para poder ultrapassar o Benfica -- e isso até pode nem obrigar a um triunfo na Luz. E fica a ideia de que, depois de quase um dia de dragão virtualmente «abatido» com a derrota na Madeira, o tropeção do Benfica em Paços pode ter servido de «ponto de viragem» (psicológico, pelo menos) para águias e dragões nessa luta que, depois do dérbi de Alvalade, parece cingida a dois.
E escrevi «parece» porque há sempre uma réstia de esperança para o Sporting na luta pelo título (pequena, é certo, porque necessita de anular sete pontos com o Benfica, ou oito caso não tenha melhor diferença de golos, e ainda três ao FC Porto).
No entanto, um olhar mais detalhado para a classificação mostra-nos outra coisa: o Sp. Braga, em clara curva ascendente (o triunfo claro no Estoril voltou a mostrá-lo), começa a sonhar não só com o quarto lugar (acabado de conquistar ao V. Guimarães), mas mesmo com o terceiro (está a seis pontos do Sporting).
Faltam 42 pontos em disputa, 14 jornadas a cumprir. O Benfica
Será importante perceber se, para o Benfica, nos meses finais da época, será vantajoso ou nem por isso ter ficado tão cedo fora das competições europeias. Até agora, esse dado não foi relevante, porque a Champions só volta para a semana e, portanto só aí o FC Porto passará a ter mais jogos nas pernas que o rival da Luz.
Tudo muito em aberto, portanto. E assim é que é bom.
«Nem de propósito» é uma rubrica de opinião e análise da autoria do jornalista Germano Almeida. Sobre futebol (português e internacional) e às vezes sobre outros temas. Hoje em dia, tudo tem a ver com tudo, não é o que dizem?