Champions: entre a ilusão e a lei do mais forte

14 abr 2022, 01:14
Liverpool-Benfica (PETER POWELL/EPA)

Para Portugal, os quartos de final voltaram a ser a fronteira

Os quartos de final voltaram a marcar a fronteira para as equipas portuguesas na Liga dos Campeões. O Benfica despediu-se em Anfield, com três golos que valeram o empate mas não foram suficientes, frente a um Liverpool que trazia uma vantagem confortável da Luz. Valeu a lei do mais forte, é ela que vai valendo numa competição cada vez mais elitista. Mas que ainda vai dando algum espaço à surpresa. Esta época, cabe ao Villarreal transportar essa ilusão. Entre dados, recordes e curiosidades, um olhar para o que fica e para o aí vem na reta final da Liga dos Campeões.

A história portuguesa

Na época em que Portugal voltou a ter três equipas na fase de grupos pela primeira vez desde 2018, esteve perto um inédito pleno de qualificação para os oitavos, mas o FC Porto viu fugir o apuramento na última jornada, frente ao Atlético Madrid, caindo em dezembro pela primeira vez desde a chegada de Sérgio Conceição. O Sporting saiu vivo de um grupo com Ajax e Borussia Dortmund depois de perder os dois primeiros jogos e apurou-se para a fase a eliminar apenas pela segunda vez na sua história, mas perdeu as ilusões logo na primeira mão, com os cinco golos sofridos frente ao Manchester City. Seguiu o Benfica, que começou por deixar o Barcelona pelo caminho na fase de grupos e depois surpreendeu o Ajax, primeiro com o empate a dois golos na Luz e depois com o golo de Darwin Nuñez a selar a vitória em Amesterdão. Garantia pela quinta vez a presença nos quartos de final e despede-se com a imagem positiva deixada em Anfield, mas a história acabou como as anteriores, com a eliminação. Desde a criação da Liga dos Campeões, em 1992/93, a única equipa portuguesa a superar a barreira dos quartos de final foi o FC Porto, na corrida para a conquista do troféu em 2003/04.

Uma ilusão amarela

Os 50 mil habitantes de Villarreal, ou Vila-real no valenciano original, não encheriam o Allianz Arena, mas a equipa tem um coração do tamanho do mundo. Um ano depois de vencer a Liga Europa na tensa final decidida ao fim de 22 penáltis frente ao Manchester United, triunfo que valeu a presença nesta edição da Liga dos Campeões, o Villarreal passou em segundo lugar na fase de grupos e bateu o pé aos gigantes. Primeiro a Juventus, com uma vitória por 3-0 em Turim depois do empate a um golo na primeira mão. E depois o Bayern Munique. A surpresa começou a escrever-se no El Madrigal, com o golo de Danjuma a dar vantagem para a segunda mão, e consumou-se em Munique, quando Chukwueze finalizou a jogada que Parejo começou e Moreno continuou. É a segunda vez que o Villarreal chega aqui, 16 anos depois de se ter estreado na Liga dos Campeões atingindo a meia-final, numa campanha que se cruzou com o Benfica na fase de grupos e terminou com a eliminação frente ao Arsenal. Vai agora defrontar outro peso-pesado, o Liverpool, com a esperança de uma presença histórica na final e a sonhar com um triunfo que contraria todas as probabilidades. Há muito que a Champions está reservada a clubes com pedigree. Com grandes meios, mas também com peso histórico. O último clube a vencer a competição pela primeira vez foi o Chelsea, em 2012. E antes disso é preciso recuar até ao século passado e à vitória do Borussia Dortmund em 1997. Esta época, o Manchester City é o outro clube que continua à procura de inscrever o nome pela primeira vez na lista de vencedores.

Do recorde de Guardiola ao toque de Emery

Por falar em pedigree. Carlo Ancelotti, Pep Guardiola, Jurgen Klopp. Juntos, três dos treinadores semifinalistas da Liga dos Campeões 2021/22 têm seis Liga dos Campeões no palmarés. O treinador do Real Madrid venceu a competição por três vezes, duas com o Milan e outra com os merengues, em 2014, na sua primeira passagem pelo Bernabéu. Klopp venceu com o Liverpool em 2019 e Pep Guardiola em 2009 e 2011, ambas com o Barcelona. Agora, com o apuramento do Manchester City frente ao Atlético Madrid, o catalão torna-se o primeiro treinador a orientar equipas em nove meias-finais da competição, isolando-se como detentor de um recorde que partilhava até aqui com José Mourinho. Ancelotti, por seu lado, passa a fazer companhia ao português, somando a sua oitava meia-final. E depois há Unai Emery. O espanhol não tem o ilustre passado na Liga dos Campeões dos rivais, mas o «senhor Liga Europa» é o denominador comum das duas épocas consecutivas do Villarreal a dar cartas na Europa. O treinador que disputou cinco finais da segunda competição europeia de clubes e venceu quatro, três delas seguidas com o Sevilha, nunca tinha chegado tão longe na Liga dos Campeões. A aura de Emery esbateu-se nas passagens pelo PSG, onde não foi além dos oitavos de final da Champions nas duas temporadas que passou em Paris, e pelo futebol inglês, onde chegou à final da Liga Europa com o Arsenal na primeira temporada, antes de sair logo em novembro na época seguinte. Mas em Villarreal o treinador espanhol reencontrou o equilíbrio e recuperou o seu toque especial na Europa. Desde que Emery assumiu o comando do Villarreal, o clube só perdeu dois de 25 jogos nas competições europeias, curiosamente ambos frente ao Manchester United na fase de grupos desta temporada.

A Espanha renascida e os suspeitos do costume

O apuramento do Villarreal alimenta também alguns sinais de recuperação do futebol espanhol. Mesmo com o Barcelona prematuramente pelo caminho e o Atlético Madrid a cair nos quartos de final, a Espanha volta a colocar duas equipas nas meias-finais. Se essa foi durante muito tempo a «quota» habitual, o facto é que a tendência tinha-se esbatido e, depois de há duas temporadas não ter sequer havido nenhum representante espanhol nos últimos quatro, esta é a primeira vez em cinco anos que voltam a ser dois. O outro representante é o suspeito do costume. O Real Madrid, o clube mais ganhador da história da Taça dos Campeões, com 13 troféus no palmarés, está nas meias-finais pela 10ª vez nas últimas 12 temporadas. Foi cilindrado pelo Chelsea durante oitenta minutos na segunda mão dos quartos de final, mas sobreviveu, uma vez mais. «Há algo de milagroso nisto», disse no final do jogo Jorge Valdano, falando dessa relação quase sobrenatural que os merengues parecem ter com a competição. Sobreviveram desta vez à custa do campeão europeu em título, um Chelsea que também não conseguiu combater a maldição que impede o vencedor de revalidar o troféu. Na era Liga dos Campeões só um clube o conseguiu. O Real Madrid, claro, tricampeão entre 2016 e 2018. Mesmo sem o Chelsea, Inglaterra também chega às meias-finais com dois clubes. Nada de novo aqui: é a terceira vez que acontece nas últimas quatro temporadas. E por sinal, em ambas a final foi exclusivamente inglesa.

Darwin, Diaz e a vénia aos trintões

A Liga dos Campeões é o grande palco para a revelação e afirmação de talentos e do ponto de vista português há destaques óbvios. Desde logo Darwin Nuñez, o avançado uruguaio que saltou para o palco europeu em estilo e se despede com seis golos, recorde para um jogador do Benfica na era Champions, todos eles marcados a pesos-pesados: dois ao Liverpool, dois ao Barcelona, um ao Bayern Munique e outro ao Ajax. Mas também Luis Díaz, o colombiano que explodiu na primeira metade da época no FC Porto, saiu em janeiro para Liverpool e marcou na Luz o golo que inclinou decisivamente os quartos de final a favor dos «reds». Mas esta tem sido sobretudo a época em que os veteranos fizeram questão de mostrar do que são feitos. Mesmo com Cristiano Ronaldo e Messi, os grandes dominadores da competição na última década e meia, a ficarem pelo caminho nos oitavos de final, esta é a Liga dos Campeões dos «trintões». De Robert Lewandowski, que se despediu frente ao Villarreal a marcar o 13.º golo europeu da época. E sobretudo de Karim Benzema, o avançado francês que nunca tinha marcado mais de sete golos numa só temporada da Champions e esta época já leva 12. Sete deles nas eliminatórias: um hat-trick na segunda mão dos oitavos frente ao PSG, outro na primeira mão dos quartos de final e por fim o golo que selou o apuramento frente ao Chelsea. Numa épica recuperação do Real Madrid que começou de resto num passe mágico de outro trintão de luxo: Luka Modric, do alto dos seus 36 anos, numa trivela de sonho para Rodrygo marcar o 1-3.

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