O peso de se chamar James Bond: “Imaginem ouvir a mesma piada todos os dias durante décadas”

CNN Portugal , MJC
28 abr 2023, 16:08
Daniel Craig em "007 - Sem tempo para morrer"

O documentário "O Outro Bond" conta a história de pessoas que têm o mesmo nome do agente secreto 007. Uma maldição para uns, uma fonte de rendimento ou até mesmo a salvação para outros

Quando, em 1952, Ian Fleming escreveu a sua primeira história sobre um agente secreto britânico queria dar-lhe o nome “mais chato” (nas suas próprias palavras) que conseguisse encontrar. Olhou à sua volta e lembrou-se do livro com o qual identificara os pássaros que sobrevoavam a sua mansão na Jamaica: “Birds of the West Indies”, do ornitólogo James Bond. E, sem consultar o investigador, batizou com esse nome o seu agente 007. Depois disso, vários pais decidiram dar o nome de James Bond aos seus filhos. E esses outros James Bond também têm agora direito a um filme: o documentário “O Outro Bond” (“The Otther Fellow”), do realizador austríaco Matthew Bauer, que está disponível na plataforma Filmin.

Durante uma década, explica o jornal El Pais, Bauer contactou centenas de pessoas com o nome do agente secreto. Segundo dados oficiais, nos Estados Unidos existem 75.249 pessoas com o apelido Bond, sendo que o nome próprio mais comum entre elas é James (2,89%, ou seja, 2.242 “James Bonds”). “Que uma pessoa se chamasse assim há 40 anos não importava muito. Agora...”, lamenta-se um entrevistado. Na época das redes sociais, ser James Bond significa ser alvo de piadas e de chacota, sobretudo quando estreiam novos filmes. “Imaginem ouvir a mesma piada todos os dias, durante décadas”, queixa-se outro dos entrevistados.

Chamar-se James Bond é carregar o estigma de alcoólico, mulherengo e aventureiro. Mas o filme mostra um James Bond, encenador, gay e nova-iorquino que é exatamente o oposto disso. Claro que as notícias sobre os seus espetáculos acabam sempre por se misturar com as notícias dos filmes por causa da tag “James Bond”. Mas, por outro lado, aproveita para ganhar algum dinheiro a gravar anúncios para casinos online da Costa Leste dos Estados Unidos porque legalmente pode dizer, sem pagar direitos de autor: "O meu nome é Bond, James Bond".

Entre as histórias contadas no documentário está a do prisioneiro 280.938 do Estado de Indiana: numa operação stop, o motorista afroamericano James Bond foi parado pela polícia e quando disse o seu nome o agente achou que ele estava a gozar e levou-o para a esquadra. Acabou por ficar 60 dias detido. Algum tempo depois, foi injustamente acusado de assassínio (do qual já foi entretanto ilibado) na sua cidade, South Bend, uma cidade com pouco mais de cem mil habitantes onde existe um outro James Bond, este um homem branco, cujo negócio quase entrou em falência quando o noticiário televisivo informou (sem colocar uma foto do suspeito) que um James Bond do Indiana tinha sido preso por homicídio.

Em “O Outro Bond” também há um ex-James Bond que mudou de nome para fugir ao bullying, um político corrupto da Guiana, um advogado de Filadélfia, uma família do Texas que há quatro gerações tem sempre um James Bond ("O James Bond antes de ser James Bond", diz o membro mais antigo dessa árvore genealógica). E há dois casos de pessoas que mudaram de nome para chamar-se James Bond.

O primeiro é Gunnar Schäfer, agora legalmente James Bond. O seu pai, sobrevivente da Segunda Guerra Mundial, desapareceu misteriosamente em 1959, quando Schäfer tinha dois anos. Algum tempo depois, em 1964,  ele viu “Goldfinger” no cinema e sentiu que, de alguma forma, o filme se relacionava com a história do seu pai. Decidiu então tornar-se um alter ego do espião. É por isso que só bebe martinis e champanhe Bollinger. Na sua cidade natal, Nybro, no sul da Suécia, Schäfer criou o museu James Bond, com todo tipo de veículos e acessórios dos filmes de 007.

A segunda história é de uma mulher, vítima de violência por parte do marido, que durante anos fugiu com o filho do agressor por todo o Reino Unido. Só conseguiu escapar dele quando renomeou o seu filho como James Bond e se tornou, ela própria, a "senhora Bond".

Bauer também filma (com recriações) a história do primeiro James Bond famoso, o ornitólogo, que sem saber influenciou Fleming. Quando descobriu o facto, através da televisão, ficou irritado com o escritor. Mas depois acabaram por se tornar amigos.
 

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