opinião

Quantos bispos vão resignar?

13 fev 2023, 23:25

Agora não há desculpas. A Igreja, o Estado e o país têm um retrato, tão fiel quanto possível, do que foram — e são — os abusos sexuais na Igreja Católica portuguesa. Mais de 500 denúncias validadas e quase cinco mil possíveis vítimas (número que só pode pecar por escassez) de norte a sul do país, do litoral ao interior, sem esquecer as ilhas.

Agora não há desculpas. As orientações do Papa Francisco são claras, a justiça está em campo, a comunicação social tem feito o seu papel de escrutínio e a sociedade civil — católica e não católica — está hoje mais consciente do que nunca das trevas onde a Igreja mergulhou nas últimas décadas.

Agora não há desculpas. Está demonstrado que a Igreja Católica portuguesa ocultou durante anos crimes hediondos, mudou padres de paróquias, escondeu-os em conventos, desacreditou os testemunhos dos que tiveram a coragem de denunciar os seus predadores e desvalorizou publicamente os crimes que foram – e continuam a ser – cometidos dentro de confessionários, em altares, capelas, igrejas, casas paroquiais.

Agora não há desculpas. O relatório da Comissão Independente não é apenas uma resenha histórica de um passado longínquo sobre a realidade dos abusos sexuais na Igreja. É a demonstração de que alguns destes clérigos, criminosos, continuam em funções com a cumplicidade da hierarquia católica.

Agora não há desculpas e a Igreja portuguesa tem de escolher um de dois caminhos: ou muda profundamente os seus métodos e os seus padrões de conduta para restaurar a confiança numa instituição milenar, ou continua a virar a cara para o lado, como tem feito.

Recuperar a confiança pode começar com o mais simples e humilde dos atos: um pedido de desculpas sincero às vítimas. Mínimos olímpicos que o presidente da Conferência Episcopal, D. José Ornelas, se apressou a cumprir, logo a seguir à apresentação do relatório da Comissão Independente. O ato não é desvalorizável, bem pelo contrário. Um pedido de desculpas sincero é fundamental para o processo de cada uma das vítimas que foram ignoradas durante anos.

Mas que reflexão fará a cúpula da Igreja portuguesa no seu todo? Quem é que pode aceitar que um bispo e um administrador diocesano não tenham respondido à Comissão Independente? Porque temos nós de continuar a ouvir os dislates de D. Manuel Linda, Bispo do Porto, que atua como um inimputável que nem a Deus teme? Será possível que se mantenham bispos em funções que cobardemente andaram anos a esconderem-se por debaixo da sua mitra? Quantos terão a humildade de resignar depois da humilhação pública a que foram sujeitos esta semana? Quantos dos que se dizem “pastores” vão ter a humildade de reconhecer que durante anos, décadas, o seu “rebanho” se perdeu durante a sua vigia?

E quantos padres serão definitivamente afastados? Ou o abuso sexual, para a Igreja, é menos grave do que o incumprimento do celibato?

“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.”

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