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Diretor TVI Norte

Três meses de guerra e nada será como dantes

24 mai 2022, 18:53

Passaram três meses e hoje é claro que todos estão a perder na guerra, menos os negócios.

Seria uma operação especial de dias onde um dos maiores exércitos do mundo controlaria a imensa Ucrânia e assumiria uma posição de força perante a NATO e os países da região que tivessem qualquer veleidade de querer desafiar o poder geopolítico de Moscovo.

A Rússia agarrava os tratados de paz de 2014, que não foram cumpridos e a defesa do Donbass que esteve em estado de guerra nestes últimos anos. Ninguém se importou e a situação esteve a apodrecer ali diante dos olhos de todos.

Putin encenou o diálogo, fez desfilar naquela mesa gigantesca os líderes do ocidente. Chegou a agendar encontros com Biden e repetiu a tese de que era necessário definir uma nova ordem mundial, sem os Estados Unidos terem um papel de domínio. Com este argumento, convenceu a China, deixou a Turquia com um papel principal e campo para condicionar negociações, a NATO e até a União Europeia. Dividiu estados africanos e asiáticos e optou por partir para a guerra com um ataque brutal aos arredores de Kiev enquanto dividia forças na conquista das zonas costeiras, travando a economia do país e da região. A guerra está a ter efeitos brutais nos combustíveis, nos alimentos, no crescimento da Europa e nos EUA. A Rússia tenta contornar as sanções, mas está a ter também efeitos devastadores do isolamento ocidental.

Putin assume que nada será como dantes e admite até não voltar a ter relações normais com o ocidente. A China segue atenta a oportunidade de ganhar ainda mais espaço nesta nova ordem mundial, aproveitando gás e petróleo a preço de saldo para fazer crescer a economia e assumir novos mercados com produtos ainda mais baratos.

A guerra tem muito mais protagonistas do que russos e ucranianos e só vai terminar quando forem consolidadas outras vitórias. A indústria do armamento vive uma euforia como ninguém acreditava há um ano. As grandes fortunas estão a aumentar brutalmente com os negócios de matérias-primas, alimentos e o transporte de bens. A inflação empobrece os mais pobres e enriquece quem já muito tem.

O caldo tem todos os ingredientes. Putin vai consolidando novos territórios que obviamente não vai abandonar. Kiev acredita que a ajuda internacional pode ainda mudar parte do curso da guerra, mas a brutalidade de cada dia que passa está a desgastar quem ainda resiste.

António Guterres e a ONU voltaram ao silêncio e vamos acreditar que estão empenhados na tal diplomacia silenciosa. O Papa Francisco estará no mesmo caminho.

Quanto tempo vai demorar até que todos tenham derrotas suficientes para perceberem que a guerra não tem saída nem vencedores?

Em que moldes o diálogo se fará? Como se resolve a tentação de ter vencedores triunfantes e derrotados humilhados, que terão a óbvia tentação de uma vingança logo que possível?

Será uma tarefa difícil reconstruir casas e pontes na Ucrânia, mas é impossível reerguer quem tombou, juntar as famílias da mesma forma, dar esperança e sorrisos aos meninos que perderam as mães, os pais, a casa…o futuro.

São milhões de deslocados, a grande maioria mulheres e crianças.

Três meses depois…será a hora de colocar o diálogo como a grande prioridade e de fazer mesmo tudo para parar de alimentar esta tragédia. Não ouvimos hoje isso nos discursos, não vimos nenhuma ação concreta nesse sentido. A hora é ainda dos falcões.

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