P. Ferreira-Sporting, 0-0 (destaques)

18 dez 2000, 00:00

Um Glauber de ouro A influência de Glauber, um caso raro de agilidade semelhante na decomposição e elaboração do ataque, atingiu proporções tais, que, a determinado momento, transmitiu a sensação de que o jogo jamais poderia realizar-se sem a sua intervenção. Sem ele, o encontro disputar-se-ia na mesma, mas seria forçosamente menos belo. Mesmo com o requinte de Rafael garantido.

Glauber

Omnipresente é termo excessivo, que ainda assim apetece aplicar-lhe, mesmo sob o risco de despertar a ira de quem reclama, justamente, a exclusividade. Ainda que idolatrado, Glauber não é um deus, especialmente no que a expressão tem de justo e imparcial. Como bom brasileiro, dirá, quando muito, que é Deus quem lhe ilumina os gestos. Reparte, é verdade, mas no cuidado de o fazer sempre para o mesmo lado, procurando uma variedade muito restrita de pés. Castiga, aos primeiros passos de embaraço, as ameaças de estragos, cirurgica e providencialmente, embora dispensando-se da dureza de uma punição exemplar e dolorosa, transmitindo repetidamente a sensação de ocupar todas as porções de relvado, revolvido ou incólume, e de nada poder fazer-se sem a sua inspirada intervenção. Desde o desarme, que desenha no primor de uma simulação ou drible, à assistência, tirada a régua e esquadro. Sem ele, teria havido jogo na mesma, mas não tão belo e intenso. Graças a Deus... 

Rafael

A finta, feita de ziguezagues, que a areia apurou numa redução de centímetros, tornando-a vertiginosamente mais curta e ameaçadora, compõe a mais delicada e fina arte de uma equipa assustadoramente charmosa, capaz de deliciar no mais aflitivo gesto de destruição, mesmo num relvado decomposto por centenas de dribles e outros tantos arranques. Os fiozinhos do denso e peculiar perfume, que inebria e deixa zonzo quem o aspira, exalaram quase sempre dos seus pés, no jeito muito especial para confundir adversários e deixá-los de costas voltadas para a bola, procurando-a desesperadamente. Porque quem encanta, tem também por hábito não saber resistir à atracção de um excesso, Rafael viu o golo, que desenhara com tanto cuidado, desfazer-se diante de Nélson, num toque ou adorno que deveria ter dispensado, quando a defesa do Sporting já havia ficado para trás. 

Everaldo

Desarmá-lo é um caso bicudo, que Rui Jorge ensaiou, repetidas vezes, sem êxito. Acelera, abranda, pára e provoca, parecendo aguardar o movimento desesperado do defesa para contornar a tentativa na última fracção de segundo. Diverte-se no método como organiza o ataque e prepara o inesperado, irritando quem o segue e lhe pisa os calos, ali, com a bola aparentemente à mercê. Pedro Barbosa não pôde compreender e exasperou-se com a renitência de Everaldo em ceder-lhe o flanco que reservara para si e para o Sporting. 

Gaspar e João Armando

Nenhuma aceleração ou encenação de Acosta os perturbou. Precisos, rigorosos, dispensaram-se de marcações milimétricas, de artes subreptícias ou de derrubes violentos. A interpretação do argentino resumiu-se a um curto reportório de quedas, algumas delas refinadamente encenadas, e os movimentos de João Pinto ficaram muito aquém dos limites da grande área e do real perigo. 

Nélson

Um par de voos felinos mantêm Schmeichel a lamentar-se pela sorte e a maldizer o joelho, que não deveria ter cedido. Mais do que isso, garantiram ao Sporting o empate que não chegou a merecer. Nenhum lapso a apontar-lhe, em intervenções anormalmente frequentes. Só mérito a registar. 

Paulo Bento

Manteve a equipa atada nos frágeis arames que anunciavam a decomposição numa dezena de fragmentos, remendando em nós firmes de arreganho e na solda característica do passe curto, mas preciso. Sem ele, muitos metros adiante, rastreando o perigo, patrulhando entre ameaças, talvez Nélson não escapasse sem marcas do embaraço.

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