Mundial 2002: o dia mais feliz de Ronaldo

30 jun 2002, 19:27

Renascido para ser campeão e melhor marcador «Nem no melhor dos meus sonhos isto acontecia», disse um «Fenómeno» renascido.

Habitualmente pouco expressivo e especialista em declarações banais, Ronaldo surgiu transfigurado na zona mista, uma hora depois de consumada a conquista do título. O número 9 do Brasil foi o último jogador do Brasil a deixar o balneário e, para evitar o previsível sufoco de microfones de todo o Mundo - ou não fosse durante umas horas a pessoa mais requisitada à face da Terra - fez as únicas declarações aos jornalistas do alto de um palanque, não sendo permitidas entrevistas particulares.

Ronaldo era a imagem da felicidade e admitiu que não estava ainda com os pés no chão: «A ficha está caindo devagarinho, não dá para perceber o que está acontecendo, estou voltando à realidade pouco a pouco. Estou muito, muito emocionado e vai demorar algum tempo a voltar ao normal. Mas estou certo que todos à nossa volta, e em especial no Brasil, respiram felicidade».

Depois do inferno por que passou nos últimos anos, Ronaldo teve a consagração mais desejada - e o fenómeno admite que os dois golos marcados na final ultrapassaram as suas maiores expectativas: «Nem no melhor dos meus sonhos isto acontecia. Mas felizmente foi um sonho marvilhoso que todos puderam partilhar comigo».

Como uma vedeta na noite dos óscares, Ronaldo tinha preparada uma dedicatória muito especial: «Tenho muito que agradecer a Deus e às pessoas que me acompanharam nos momentos mais difíceis. Em especial ao fisiterapeuta Filé - o Nilton Petroni - que nunca me abandonou durante a minha recuperação. Ele não está aqui agora, mas sei que está vibrando comigo e eu quero lhe dizer que o meu primeiro pensamento foi para ele», revelou.

O todo-o-terreno com motor de Ferrari, como um dia lhe chamou Valdano, admite que o bis na final foi a cereja no topo de um bolo que já estava saboreado: «A minha grande vitória foi voltar aos relvados, jogar futebol e marcar golos. Esta conquista do penta veio coroar a minha luta, e premiar minha recuperação. Mas acredito que mesmo se tivéssemos perdido a minha vitória pessoal já estava conquistada. De cada vez que entro em campo depois da lesão sinto-me um vencedor», garantiu.

A pensar noutro Mundial e nos Jogos Olímpicos

Tendo igualado Pelé como melhor marcador brasileiro em Mundiais, Ronaldo terá, previsivelmente, mais um Campeonato do Mundo pela frente (vai ter 29 anos em 2006). Algo que poderá permitir-lhe superar a marca de Gerd Müller, que com 14 tentos é o melhor goleador de todas as edições da prova. Mas Ronaldo preferiu dividir a glória com os companheiros: «A vitória do colectivo supera todos esses pormenores, e nessa altura não posso nem quero esquecer um grupo maravilhoso, solidário, com toda a gente a ajudar o parceiro. Estou feliz por ser o melhor marcador do Mundial, mas não há conquistas pessoais que possam ultrapassar isso. Claro que daqui por uns tempos vou encontrar novos objectivos, porque sou muito ambicioso, mas agora quero comemorar e festejar com os meus companheiros, não pensar em metas pessoais».

O homem dos dentes grandes e do penteado bizarro rejeitou também a ideia de que teria, com esta conquista, pago uma dívida aos torcedores brasileiros, depois do fiasco na final de há quatro anos: «Não sinto que tivesse uma dívida a pagar, mas é verdade que todos os que lá estivemos - Cafú, Roberto Carlos, eu, Rivaldo, Denilson e Dida - queríamos apagar essa imagem. Mas ainda há pouco, na cabina, comentei com eles que a única diferença entre estas equipas foi que há quatro anos não tivemos direito a essa festa bonita. Não é justo fazer mais comparações, o grupo de 1998 deu tudo o que tinha e também era muito forte. Mas o destino quis adiar para agora essa grande alegria», acentuou.

A terminar, Ronaldo deixou a certeza de que o escrete vai continuar a contar com ele para outras conquistas: «Agora quero comemorar, mas depois estou certo de que outros objectivos virão. Se as regras dos Jogos Olímpicos se mantiverem e for permitida a entrada de três jogadores com mais de 23 anos, dar a primeira medalha de ouro ao Brasil é um bom objectivo». Os jornalistas brasileiros insistiram: e a conquista do sexto título, em 2006, na Alemanha? Aí, Ronaldo achou que era ambição a mais para uma noite. «Ainda falta muito tempo, temos quatro anos para pensar nisso. Temos uma coisa boa, já estamos livres de participar nas eliminatórias». Gerou-se um silêncio embaraçado na sala ante a gaffe do campeão. Finalmente, o assessor de imprensa Ricardo Setyon lá lhe deu a má notícia - a partir de 2002 o campeão do Mundo deixa de ter qualificação garantida. «Temos de entrar? Isso é que é uma pena...», lamentou o craque, sem perder o sorriso.

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