O maior genoma conhecido encontra-se numa simples planta do solo da floresta

CNN , Amanda Schupak
15 jun, 17:00
Feto-forquilha Nova Caledónia (Pol Fernández I Mató)

Não se saberia só de olhar para elas, mas algumas plantas têm muito mais ADN do que outras. E talvez ainda mais espantoso, algumas têm muito mais ADN do que a maioria dos animais – incluindo humanos. Agora, os cientistas estão a revelar exemplos ainda mais extremos de um fenómeno de genoma-gigante ainda que a sua existência permaneça um mistério.

Uma nova investigação identificou o maior genoma conhecido de qualquer organismo vivo num feto despretensioso encontrado em Nova Caledónia, um arquipélago do Pacífico Sul- A planta rara contém 160 mil milhões de pares de base, unidades acopladas que constituem as cadeias de ADN, de acordo com o estudo. Por comparação, o genoma humano consiste de meros 3 mil milhões de pares de base.

“Pequenas coisas humildes podem esconder o mais espetacular dos segredos dentro delas”, diz o biologista evolucionário Jaume Pellicer, investigador do Instituto Botânico de Barcelona, em Espanha, e autor correspondente do estudo publicado a 31 de maio na revista especializada Cell.

Os genomas massivos também são raros. De acordo com Pellicer, dos cerca de 12 mil genomas de plantas documentados, todos exceto cerca de meia dúzia têm uma ordem de grandeza mais pequena do que a de um feto-forquilha, chamado Tmesipteris oblanceolata, tal como descrito na investigação.

“Os limites da biologia estão aí para serem descobertos”, diz Pellicer. E ele o saberá – já que continua a descobri-los.

Antes desta investigação, o maior genoma conhecido de qualquer fungo, planta ou animal pertencia à flor Paris japonica, que contém 149 mil milhões de pares de bases (pares de gigabases, ou Gbp).

Pellicer integrou a equipa que revelou a descoberta sobre a P. japonica num estudo de setembro de 2010. Também foi coautor de um artigo, em maio de 2017, em que se colocava a hipótese de 150 Gbp poderem corresponder ao limite superior do tamanho de um genoma. Agora, provou que estava errado.

“Para ser honesto, o principal interesse deste projeto não é encontrar um recorde de tamanho do genoma das plantas”, diz Pellicer. “Queremos investigar diferentes casos de gigantismo genómico.”

O biólogo evolucionista Jaume Pellicer, autor correspondente do novo estudo, analisa espécies de fetos que crescem como epífitas numa árvore em Grande Terre, a principal ilha do arquipélago francês de Nova Caledónia, em 2023. (Oriane Hidalgo)

Os fetos são conhecidos por terem genomas maciçamente repetitivos. Após analisar amostras relacionadas da Nova Zelândia e da Tasmânia, Pellicer concentrou-se no feto-forquilha de Nova Caledónia como um potencial alvo do estudo.

Em maio de 2023, ele e a sua equipa recolheram amostras da diminuta planta na natureza e trouxeram-nas para o laboratório, onde compararam o genoma do feto com as espécies de tamanho genómico conhecidas.

A quantidade de ADN no genoma gigante do feto-forquilha pode ser 50 vezes superior à dos humanos, mas isso não significa que o feto seja mais complexo ou que tenha mais genes. Apenas cerca de 1% do seu genoma corresponde a genes que codificam proteínas, calcula Pellicer. O resto são sequências repetitivas não funcionais, há muito consideradas “ADN lixo”, apesar de os cientistas agora saberem que na verdade não são lixo. Grande parte dessa algaraviada genética pode afetar o funcionamento dos genes.

A forma exata como o feto acumulou tantos pares de bases ainda é um enigma por resolver. O que pode estar em causa, segundo Pellicer, é uma combinação de poliploidia desenfreada – ou ter mais do que dois conjuntos de cromossomas, algo que é comum nas plantas, ainda que não em animais – e a acumulação de sequências de ADN não cofidicantes capazes de se replicarem e de se deslocarem no genoma.

“A questão mais interessante que este estudo não é capaz de abordar é a razão pela qual [o genoma] se torna tão grande e como os fetos, especificamente, são capazes de lidar com as consequências de ter um genoma tão desnecessariamente grande”, diz o especialista em fetos Eric Schuettpelz, investigador de botânica e curador do departamento de botânica do Instituto Smithsonian, que não colaborou com a investigação. “Os fetos parecem ser muito maus a livrarem-se do ADN repetitivo e dos cromossomas extra.”

A quantidade de ADN no genoma gigante do feto-forquilha pode ser 50 vezes maior do que o de um humano. A planta contém 160 mil milhões de pares de base, unidades acopladas que compõem as cadeias de ADN. (Pol Fernández I Mató)

Afinal, os genomas gigantescos não são uma vantagem. O gigantismo genómico, ou obesidade genómica, é extremamente ineficaz, explicam os especialistas. É preciso muita energia e nutrientes para produzir tanto ADN. A maioria das plantas tem genomas muito mais pequenos, o que lhes permite reproduzirem-se mais rapidamente, produzir mais descendentes e adaptar-se mais rapidamente ao ambiente. Ter de copiar uma quantidade tão grande de material genético de cada vez que uma célula se divide “é simplesmente uma loucura”, diz Schuettpelz.

É um mistério como é que plantas com genomas tão pesados conseguem continuar a sobreviver, diz David Baum, professor de botânica na Universidade de Wisconsin-Madison, que não esteve envolvido no estudo.

Investigadores tentam localizar uma das populações de Tmesipteris oblanceolata na ilha de Grande Terre, em 2023. (Pol Fernández I Mató)

Pellicer e os seus colegas acreditam que o tamanho do genoma pode influenciar as hipóteses de extinção de uma planta. A equipa está atualmente concentrada na investigação que sugere que as espécies vegetais com genomas grandes estão sobre-representadas na Lista Vermelha da flora ameaçada da União Internacional para a Conservação da Natureza e a analisar se o tamanho do genoma pode ajudar os conservacionistas a identificar plantas potencialmente ameaçadas.

Poderá haver uma planta com um genoma ainda maior do que o do feto-forquilha? Talvez.

"Não vou continuar a brincar com os limites biológicos", diz Pellicer. "Eles existem para serem quebrados."

Amanda Schupak é jornalista de ciência e saúde na cidade de Nova Iorque.

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