opinião
Correspondente nos Estados Unidos da América

A vergonha deste Natal

21 dez 2021, 19:40

As imagens de militares da GNR a maltratar imigrantes são uma vergonha para o país. Vergonha, também, é o facto de terem recebido tratamento “fofinho” de quem os devia punir. Estas são as vergonhas deste Natal

Apesar de dedicar este espaço aos Estados Unidos e à sua actualidade política, o exclusivo TVI/CNN Portugal sobre os imigrantes seviciados pela GNR leva-me a abrir uma excepção. E faço-o agora, porque quando a actualidade segue em frente precisamos de ajudar a que o caso não seja esquecido, no frenesim da Rendeirite e do ómicron.

As chocantes imagens sugerem um comportamento raramente documentado em Portugal. Mas são semelhantes às que mais commumente se veem nos Estados Unidos, onde algumas polícias, num sistema fragmentado e descentralizado em mais de seis mil autarquias, funcionam com impunidade, espancam e, por vezes, matam sem justificação legal.

Embora de gravidade inferior, Portugal teve, em tempos idos, anos áureos dos abusos policiais, inspirados nos “safanões” Salazar. Mesmo depois do 25 de Abril, as práticas violentas da polícia eram rotina em muitas esquadras.

A modernização técnica das forças de segurança e a sua profissionalização e resultante modernização moral tornou os casos de abuso mais raros.

Mas este incidente revoltante apresenta outras ordens de preocupação. Parece claro, nesta altura, que os agressores tinham antecedentes que a GNR, o Ministério da Administração Interna e a Justiça trataram com pouca seriedade.

Este tratamento brando de pessoas que, sendo credoras da confiança pública, dela tão gravemente abusam é, em si, outra vergonha e outro escândalo.

O sistema de justiça, que faz foguetório – aqui sim, foguetório – com Manuel Pinho para lavar o fedor de João Rendeiro, deixa reincidentes da GNR nas fileiras desta e condena outros militares a penas suspensas.

Penas suspensas, suspensão de funções por 90 dias para alguns e esconder os casos à opinião pública até a divulgação das imagens forçar o assunto não é digno de uma democracia.

Sem punição exemplar, não há castigo. Sem castigo, a impunidade cresce. E com impunidade, os direitos humanos são uma farsa – o seu respeito dependente dos humores de homens perigosos, armados.

É isso que acontece em alguns lugares nos Estados Unidos e seria uma pena que, em Portugal, por laxismo e sabe-se lá o que mais se permitisse a mesma coisa.

Seremos sempre mais do que o somatório dos nossos defeitos.

Mas há defeitos mais graves que outros. Os brandos costumes, neste caso, são um desses graves defeitos. Com o crescimento do populismo e do nativismo que ele atrai, esta não é a altura para deixar de exigir as maiores consequências, a quem, de forma tão vil, abusa de outros seres humanos e a quem, sem vergonha, fecha os olhos ao que se passa.

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