É redondo, estranho e flexível. O que é? A alternativa mais económica para a menstruação

CNN Portugal , MCP
5 mar 2023, 16:00
Copo menstrual ( foto: Oana Cristina )

Num mundo em que os preços e a preocupação com o ambiente crescem a passos largos, o copo menstrual é uma alternativa de higiene íntima que tem convencido cada vez mais mulheres

Não existem formas de tornar o ciclo menstrual divertido, mas existem formas de o tornar tolerável, também para a carteira e para o ambiente. No que diz respeito a métodos de higiene íntima, o copo menstrual é uma alternativa a métodos “tradicionais” - como pensos higiénicos e tampões - que é defendida como mais económica e sustentável. No entanto, é pouco usada e pouco divulgada.

Alexandre Valentim Lourenço, diretor do Serviço de Ginecologia do Hospital de Santa Maria, explica à CNN Portugal que “o copo menstrual foi um método utilizado na ginecologia há alguns anos para contar os mililitros de sangue perdidos durante a menstruação nos estudos que foram feitos para vários medicamentos”, o que fez com que os copos menstruais não fossem comummente passados de mães para filhas, uma vez que “não foram introduzidos como uma prática social”. No entanto, devido à internet e à maior consciência ambiental, o panorama começa a mudar.

Foi assim com Juliana, de 25 anos, e Maria João, de 20, ambas de Guimarães, que conheceram o copo menstrual através de redes sociais. “Comecei a usar depois de ter visto um vídeo no Youtube. Antes disso, nunca tinha ouvido falar, nem nenhuma amiga minha usava”, confessa Juliana, designer gráfica.

Foi sobretudo o fator ecológico que as convenceu, mas depois de uns quantos cliques depressa se aperceberam de outros benefícios. Maria João, estudante de Design de Comunicação, assume que o que a 'agarrou' “foram as questões ambientais, porque ajuda à redução de plástico no planeta”, mas, reflexões feitas, “mesmo a nível económico, fazer a diferença numa casa com três mulheres", que é o seu caso, "onde cada uma tem as suas preferências, seria muito significativo”. 

Para se ter uma comparação, segundo a calculadora de uma marca que comercializa copos menstruais, uma jovem de 25 anos que tenha tido o primeiro período aos 11 anos, como foi o caso de Juliana, já terá gastado 1.341,61 euros em pensos higiénicos, por exemplo. E acumulou ainda 6,7 quilos de lixo. Uma mulher com 54 anos, que tenha começado a menstruar aos 12 anos, terá gastado cerca de 7.000 euros e produziu 36,1 kg de lixo. Em contrapartida, sublinha a marca, uma mulher que ao longo dos seus ciclos só utilize o copo menstrual gastará no máximo cerca de 100 euros e produzirá 60 gramas de lixo. Isto porque só tem de comprar um novo copo, que custará à volta de 20 euros, a cada 10 anos.

“Higiene íntima com menos odor, menos sujidade e maior conforto”

Mas não só de argumentos sobre sustentabilidade e economia vivem estas utilizadoras. Existem outros sobre praticidade e conforto que também convencem as mulheres.

O copo menstrual permite um maior intervalo entre as idas à casa de banho, já que garante 12 horas sem fugas. 

“Às vezes esqueço-me que estou com o período, porque não sinto nada.Tento sempre trocar de manhã para que durante o dia não tenha essa necessidade e depois só o volto a fazer à noite. Quando passamos a usar o copo começamos a perceber que não temos tanto fluxo como achávamos”, conta Maria João.

Uma mulher com um fluxo moderado pode nem chegar a encher o copo durante os dias que durar o período. Mas, se for esse o caso, o ginecologista Alexandre Valentim Lourenço pede cautela para o uso do copo. “Nestes casos, é um método que pode ser facilmente mal usado, porque como a pessoa sangra pouco pode pensar que pode deixar passar 24 horas ou 48 horas e isso pode trazer complicações infecciosas”, alerta.

Ainda no que toca à saúde, ao contrário dos habituais absorventes, que podem provocar irritações, alergias ou secura vaginal, com o copo, se for bem usado, não há proliferação de bactérias ou microorganismos precisamente por este se encontrar em vácuo no canal vaginal. 

“Há uma higiene íntima melhor, com menos odor, menos sujidade da roupa interior e maior conforto. Em algumas situações pode-se tornar mais facilitador da vida social, nomeadamente porque não é manifestado externamente”, acrescenta o especialista.

"Não estamos habituadas a ouvir falar"

Mas se o copo menstrual tem assim tantos benefícios, ao ponto de ser distribuído num kit de sobrevivência num cenário apocalíptico na série da HBO "The Last of Us", o que leva as mulheres a optar por produtos mais caros?

Para Maria João, o problema pode estar relacionado com tabus à volta da menstruação, que leva as mulheres a não conversar o suficiente sobre o tema. “Infelizmente, acredito que estejamos limitadas. Já não vejo tanto aquela coisa de ir comprar pensos no supermercado quase que escondidas, mas ainda é algo que choca muito. Noutro dia dei por mim a falar no meu grupo de amigos sobre o copo, que para mim é algo normal, e tanto rapazes como raparigas estavam chocados. Fizeram piadas porque acharam estranho”, conta.

“É uma coisa diferente e que não estamos habituadas a ouvir falar”, reitera Juliana. “Depois de conhecer, adiei a compra porque não sabia se faria sentido gastar dinheiro numa coisa assim e mesmo depois de comprar não comecei a usar logo porque não sabia bem como usar. Aquilo tem uma pontinha para puxar e eu ao início nem percebi que se podia cortar essa pontinha, então era desconfortável. Depois fui experimentando e consegui.”

Segundo Alexandre Valentim Lourenço, o copo menstrual não é para qualquer mulher e esse pode ser o seu calcanhar de Aquiles. “Não é facilmente usado por muitas mulheres, porque a sua colocação dentro da vagina faz com que as mulheres tenham de ter uma boa perceção do seu corpo”, que nem toda a gente tem, sublinha. “É como o tampão. Se uma mulher não consegue usar tampão, certamente não vai conseguir aderir ao copo menstrual”, compara ainda.

Para Maria João foi muito fácil. “Eu tive a sorte de encontrar logo uma dobra adequada para mim e adaptei-me super bem. Depois, a nível de limpeza, esterilizo na primeira e última utilização do mês. Portanto, às vezes basta levar uma garrafa de água comigo, se for a casas de banho públicas, e dentro da casa de banho consigo com a garrafa de água limpar o copo e voltar a utilizar”, explica.

Para o ginecologista, a internet tem vindo a desempenhar um papel importante na divulgação de mais informação. No seu entender, a solução não está em programas informativos, está apenas no maior uso do método. “Tem de haver utilização e facilitação dessa utilização. Acho que se tem de mostrar como se deve usar corretamente e isso são as utilizadoras que o têm de fazer. Uma informação que diga vantagens e desvantagens não ultrapassa os limites da percepção corporal nem da boa utilização do mesmo”, refere.

A Câmara Municipal de Lisboa, por exemplo, já aprovou uma recomendação do PS para distribuição gratuita de produtos de higiene feminina reutilizáveis nas escolas públicas do concelho, como forma de combate à pobreza menstrual e promoção de hábitos de consumo ambientalmente mais sustentáveis.

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