Porque é que os cremes anticelulite são um engodo (mas isso não quer dizer que não os deva usar)

10 set 2023, 11:00
Pernas (Pexels)

Assim que chega o verão, dispara a procura por cremes que melhorem a aparência da pele, mas as promessas feitas nem sempre resultam nos resultados esperados. É o caso dos cremes anticelulite. Uma dermatologista e uma farmacêutica explicam

As promessas estão logo nas embalagens e as imagens das campanhas mostram peles lisas, sem qualquer sinal de gordura. Mas são os cremes anticelulite tudo aquilo que dizem ser? Longe disso. Mas não temos de os demonizar.

“Os cremes anticelulite podem melhorar ligeiramente a aparência da pele com celulite, e de forma temporária”, começa por explicar Marta Ferreira, farmacêutica, doutoranda em Tecnologia Farmacêutica e com uma pós-graduação em Cosmetologia Avançada. A mesma responsável diz que “apesar de muitos destes produtos alegarem resultados impactantes, analisando a literatura científica publicada, não é claro se os estudos realizados avaliaram devidamente o efeito do creme, ou se avaliaram também pessoas que passaram a fazer dieta e a realizar exercício físico de modo adequado”.

Da mesma opinião é a dermatologista Helena Toda Brito, que refere que “a maioria dos cremes contra a celulite não têm evidência científica da sua eficácia”. 

Por definição, celulite é a inflamação do tecido celular, em especial do tecido adiposo subcutâneo, dando aquela aparência de “casca de laranja”, dada a irregularidade da aparência da pele. Afeta particularmente a zona das coxas e nádegas. Em 2018, um estudo publicado na revista International Journal of Women's Dermatology já alertava para a escassez de evidência científica quanto à eficácia do tratamento da celulite, uma condição dermatológica que afeta entre 80% a 90% das mulheres em todo o mundo. 

Quanto a formas de combate, há técnicas em clínica, como a radiofrequência e a mesoterapia, que ajudam a melhorar a microcirculação e redução do tecido adiposo, que acabam por oferecer efeitos imediatos, mas cuja manutenção depende de um estilo de vida ativo e saudável e da continuidade destas técnicas. Ainda assim, até técnicas como laser e radiofrequência podem não ser tão ‘milagrosas’ quanto o desejado, como diz o estudo Cellulite: An Evidence-Based Review, de 2015, e publicado na revista científica American Journal of Clinical Dermatology

Já quanto aos cremes anticelulite, são os que apresentam menor eficácia, pois “o principal desafio”, mesmo com massagens vigorosas, “é que os ingredientes ativos atinjam o seu alvo em concentração suficiente para ter um efeito terapêutico”, explica o mesmo estudo. 

“Infelizmente a eficácia dos cremes anticelulite é bastante reduzida, devendo o foco estar na adoção de um estilo de vida saudável, com uma dieta equilibrada e atividade física regular”, adianta Helena Toda Brito, dermatologista no Hospital Lusíadas.

Os cremes anticelulite podem, no entanto, ser aliados na hidratação da pele e no estímulo da sua firmeza, seja pelas massagens associadas à aplicação destes cosméticos, como também à presença de determinados compostos nas suas formulações. Mas, tal como as formas tecnológicas de dizer adeus à celulite, o adeus é sempre um até já que requer compromisso - leia-se, cuidados diários com o corpo, seja a nível de treino, sono, comida ou stress.

Olhando para aquilo que a ciência já sabe sobre os cremes anticelulite, Marta Ferreira, também autora do blogue A Pele Que Habito, esclarece que aquilo que “a literatura científica destaca” é que “a cafeína e aminofilina, extratos de gingko, centelha asiática e castanheiro da índia” podem ser benéficos neste tipo de cremes. “Contudo, a sua eficácia é pouco consensual”, frisa. 

“Os cremes que apresentam alguma eficácia comprovada são os que contêm retinoides (que atuam através do aumento da formação de colagénio, tornando a pele mais firme e espessa) ou ingredientes estimulantes como a cafeína, chá verde e gengibre (que podem ajudar a melhorar temporariamente a circulação local e diminuir a retenção dos líquidos)”, enaltece Helena Toda Brito.

No estudo de 2018 levado a cabo pelo médico Neil Sadick explica-se que se acredita “que as metilxantinas melhorem a celulite, estimulando a lipólise [processo que resulta na degradação de lipídios em ácidos gordos e glicerol]” e que, “por outro lado, acredita-se que os retinóides reduzam a celulite aumentando a espessura dérmica, aumentando a angiogénese [mecanismo de crescimento de novos vasos sanguíneos a partir dos que já existem], sintetizando novos componentes do tecido conjuntivo e aumentando o número de fibroblastos ativos”. 

“No geral, certas formulações podem melhorar a produção de colágeno e reduzir a flacidez da pele, mas raramente são eficazes na celulite, que requer extensa remodelação de gordura, colágeno e tecido conjuntivo”, conclui o estudo.

No entanto, a eficácia destes cremes não depende apenas da frequência com que são aplicados, nem das massagens que são feitas nesse momento. O estilo de vida e a alimentação dizem muito sobre o quão fácil (ou não) pode ser combater a celulite (ou manter os resultados que alguns tratamentos ajudam a conquistar). Mas há outros fatores em jogo que podem tornar uma pessoa mais propensa a ter celulite ou mais dificuldade em combatê-la, como são as alterações hormonais, o sedentarismo e o tabagismo.

Tal como diz a Academia Americana de Dermatologia, o excesso de peso “pode tornar a celulite mais visível”. Mas “se desenvolver pele flácida enquanto perde peso, a celulite pode tornar-se mais percetível”, sendo, por isso, importante aliar o exercício físico à bola alimentar. “Ter mais músculos faz com que a sua pele pareça mais lisa e firme. Substituir gordura por músculo também pode tornar a celulite menos percetível”, diz o organismo.

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