Agentes da PSP acusados de agredir várias pessoas na passagem de ano em Beja

Agência Lusa , RL
5 jan 2022, 16:26

Queixa denuncia uma "carga policial contra algumas pessoas, a maioria imigrantes”. A PSP rejeita ter feito uma intervenção policial “mais repressiva” em festejos ilegais na passagem de ano em Beja, mas abriu um processo de averiguações

Agentes da PSP são acusados de agredir várias pessoas, “a maioria imigrantes”, na madrugada de passagem de ano, em Beja, por uma das alegadas vítimas, um português que já apresentou queixa a diversas entidades, incluindo o Ministério Público.

Na queixa, à qual a Lusa teve hoje acesso, Nuno Matos, que a apresentou e é uma das alegadas vítimas, conta que, na madrugada do passado dia 01, cerca da 01:00, “houve uma carga policial contra algumas pessoas” que celebravam a entrada no novo ano na Praça da República”, local tradicional de várias celebrações na cidade de Beja.

“Estava cerca de uma dúzia de pessoas, dispersas em pequenos grupos”, e, “de forma abrupta”, chegaram “quatro veículos da PSP”, dos quais saíram “cerca de duas dezenas de agentes, aos gritos e insultos”, munidos de “cassetetes, distribuindo bastonadas indiscriminadamente, sem dirigir qualquer palavra antes”, alega Nuno Matos, de 58 anos, na queixa.

Nuno Matos relata que se afastou “calmamente do local”, mas foi “agredido de costas, com uma bastonada na mão esquerda”, tal como “outras pessoas presentes, com empurrões e violência injustificada”.

“A maioria das pessoas” que estavam na praça era constituída por “imigrantes”, os quais “foram cercados, agredidos e perseguidos, sem terem tido qualquer reação que não fugir ou tentar proteger-se”, argumenta.

Segundo o autor da queixa, “não houve nenhuma situação de resistência à autoridade, nenhuma ameaça, nem sequer comportamentos exagerados nas celebrações. Houve apenas uma desproporcional e desadequada demonstração de força”.

“Aliás, nem eu, nem outras pessoas presentes mais próximas foram sequer identificadas”, frisa, relatando que um dos presentes gravou em vídeo o ocorrido, “no sentido de recolher possíveis provas relevantes, tendo sido ilegitimamente coagido pelos agentes a não o fazer”.

Na queixa, Nuno Matos considera que “foi um evidente ato de uso exagerado da força e abuso de autoridade por parte dos agentes da polícia perante as circunstâncias, com laivos de xenofobia”.

Em declarações hoje à Lusa, Nuno Matos disse que, naquela madrugada, por volta da 01:00, foi à Praça da República para cumprimentar amigos e pessoas conhecidas que poderiam estar por ali.

Questionado pela Lusa sobre se algumas das pessoas estaria a violar regras decretadas para os dias de passagem de ano, nomeadamente a proibição de ajuntamentos de mais de 10 pessoas e de consumo de bebidas alcoólicas na via pública, Nuno Matos disse: “É possível”.

“Havia ali garrafas, havia copos. Eu tinha um copo na mão, não estava a beber, mas já tinha bebido. Mas, mesmo que a questão possa ser essa, o que me deixou indignado foi que não houve sequer tentativa de falar com as pessoas”, frisa.

Após a alegada agressão de que diz ter sido alvo, revela que ficou com ferimentos na mão esquerda e dirigiu-se às urgências do hospital, onde foi assistido.

Afirmando que está “incapacitado de usar a mão” e “impedido de trabalhar”, Nuno refere que pretende “pedir indemnização ou ser ressarcido de forma adequada”.

Após “dois dias a pensar no assunto”, diz que, por estar “indignado”, foi à Esquadra da PSP de Beja, na terça-feira, para relatar a situação e mostrar vídeos da mesma, mas foi-lhe dito que não havia registo de “nenhuma ocorrência fora do comum” naquela noite.

Nesse mesmo dia, acabou por apresentar queixas eletrónicas ao Ministério Público, à Inspeção-Geral da Administração Interna e ao Provedor de Justiça contra a PSP.

PSP averigua intervenção policial

A PSP rejeita ter feito uma intervenção policial “mais repressiva” em festejos ilegais na passagem de ano em Beja, mas abriu um processo de averiguações, após agentes terem sido acusados de agressões a várias pessoas.

“Relacionada com festejos não legalmente autorizados”, a intervenção policial, “pela sua natureza e [pelas] imagens divulgadas” em redes sociais e órgãos de comunicação social “desencadeou um processo de averiguações”, refere a PSP

Em comunicado enviado à agência Lusa, o Comando Distrital de Beja da Polícia informa que o processo “seguirá os seus trâmites normais, de acordo com os regulamentos internos da PSP”.

No comunicado, a PSP refere que, na madrugada do passado dia 01, “foi alertada para a existência de uma fogueira” na Praça da República.

“Chegada ao local, a PSP constatou a veracidade da existência de uma fogueira, que consubstancia uma prática ilícita, carecendo de autorização por parte das entidades competentes”, explica.

Segundo a PSP, junto da fogueira estavam “vários grupos de pessoas (de número superior a 10) a consumirem bebidas alcoólicas na via pública, ações proibidas” à luz da resolução de Conselho de Ministros que decretou medidas para o período de Natal e passagem de ano e até ao dia 09 deste mês devido à pandemia de covid-19.

“Perante os ilícitos verificados, ponderado o número de pessoas envolvidas (aproximadamente 50) e o contingente policial que se deslocou ao local, a PSP optou por se limitar a fazer cessar os ilícitos referidos”, relata o comando.

E fê-lo “sem qualquer outro procedimento, promovendo a dispersão dos vários grupos de pessoas presentes no local, com recurso ao diálogo, de forma proativa e pedagógica”, acrescenta.

“Nunca se verificou a necessidade do recurso a uma intervenção mais repressiva, apesar do registo de alguns momentos de maior tensão e exaltação, ao longo do diálogo mantido com as pessoas envolvidas, aparentemente embriagadas, na sua generalidade”, frisa.

O Comando Distrital de Beja da PSP refere que “não teve nota de qualquer intervenção em que estivessem envolvidos, especificamente, imigrantes”,

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