Subida das taxas de juro continua a impulsionar os resultados dos bancos, mas também já está a fazer baixas no negócio bancário, com o crédito e os depósitos em queda.
Os principais bancos portugueses tiveram um lucro recorde de 1,99 mil milhões de euros no primeiro semestre do ano, em que faturaram mais de 4,2 mil milhões na margem financeira. Como era esperado, a subida das taxas de juro continuou a impulsionar os resultados da banca. Mas também já está a provocar baixas no negócio: tanto o crédito e os depósitos caíram.
Caixa Geral de Depósitos, BCP, Santander Totta, BPI e Novobanco lucraram mais de 11 milhões de euros por dia na primeira metade do ano, um resultado nunca visto – pelo menos desde 2008, antes da grave crise afundar o setor.
Embora cada um tenha um negócio muito próprio, a margem financeira foi o principal motor dos resultados dos cinco principais bancos do mercado nacional. “O ano está a correr muito bem”, disse o CEO do BCP, Miguel Maya. Os outros banqueiros também têm muitas razões para sorrir.
Entre os juros cobrados nos empréstimos às famílias e empresas e os juros pagos nos depósitos, os bancos viram a faturação quase duplicar entre janeiro e junho deste ano: mais de 4,2 mil milhões em juros significou 23 milhões por dia. Foi o resultado, sobretudo, de o aumento das taxas de juro se ter refletido mais rapidamente nos empréstimos do que nos depósitos, o que tem motivado muitas críticas aos bancos.
Já as comissões líquidas – outra parte importante do negócio dos bancos – tiveram um decréscimo de cerca de 2% para 1,2 mil milhões de euros. Um valor que não deixa de ser relevante depois de terem carregado no preçário nos últimos anos para contrariar os juros baixos.
O bom desempenho atirou o setor para patamares de rentabilidade elevados, um tema que era até há pouco tempo o “calcanhar de Aquiles” da banca portuguesa e uma fonte de preocupação para as autoridades de supervisão.
O Novobanco, que apresentou um lucro de 373 milhões de euros até junho, atingiu um ROE (rentabilidade dos capitais próprios) de 28%, batendo toda a concorrência. Só a Caixa se aproximou destes níveis, com um ROE de 20%. O BCP, cuja atividade continuou a ser pressionada pela Polónia, deu o maior salto em termos de rentabilidade, passando de um ROE de 2,4% há um ano para 16,8%. Uma performance que “escancara” a porta para a distribuição de dividendos, como adiantou o CEO Miguel Maya.
Crédito em queda, depósitos estancam fuga
Se a subida dos juros está a dar mais receita aos bancos, também está a ter um impacto negativo no balanço. Tanto o crédito concedido à economia como os depósitos caíram no semestre passado. Sendo que os depósitos até já estancaram a fuga que estavam a registar para os Certificados de Aforro.
Os banqueiros afastaram a crítica/acusação de que tenham pressionado o Governo a baixar a remuneração dos certificados, dada a razia que estava a provocar nos depósitos. “Não houve conversa, nem de corredor”, reagiu o CEO do BCP. “É um mito”, disse Paulo Macedo.
Junho foi já um mês de recuperação das poupanças dos depositantes, mas não compensou as saídas de 7,4 mil milhões de euros em comparação com o ano passado.
Banca perdeu depósitos e crédito
Em termos agregados, os principais bancos portugueses viram a carteira de depósitos e de empréstimos contrair no primeiro semestre do ano. Mas houve exceções.
Além dos certificados, muitas famílias optaram por fazer reembolsos do crédito para baixar a prestação da casa e fizeram-no recorrendo às poupanças depositadas nos bancos, o que também ajuda a explicar a contração do stock de depósitos neste período.
Em relação ao crédito, a contração da carteira dá-se pelas amortizações antecipadas, mas não só. Há menos procura por crédito e também as empresas estão a adiar investimentos ou estão a gerar mais dinheiro, pelo que já não necessitam do financiamento bancário, explicaram os responsáveis do Santander.
“Menos crédito e menos poupança. É uma tendência que vai continuar a haver um decréscimo enquanto tivermos esta situação de crescimento económico muito baixo ou de recessão, no caso da Europa”, explicou Pedro Castro e Almeida.
Mais de 50 mil créditos renegociados, mas não há problema
Os bancos revelaram que renegociaram mais de 50 mil créditos, na sua maioria por iniciativa própria do que ao abrigo do decreto-lei 80-A/2022 que obriga as instituições a encontrar uma solução para as famílias em maiores dificuldades.
Ainda assim, os banqueiros consideram que “não há um problema transversal” no crédito da casa, embora reconheçam que há casos pontuais que têm tentado resolver.
Os líderes da Caixa e do BPI colocaram as coisas noutros termos: de que nenhuma casa foi executada por incumprimento no pagamento da prestação. “As pessoas têm feito um esforço significativo nas contas para conseguirem pagar o crédito à habitação”, salientou João Pedro Oliveira e Costa.