Wolfsburgo: as irresistíveis crónicas de Tintin

18 fev 2015, 18:55

Kevin de Bruyne é a estrela da equipa de Vieirinha, que tem sido adaptado a lateral direito

Ponto forte: ataque todo-o-terreno

Associado a uma marca de automóveis, o Wolsburgo tem um ataque todo-o-terreno. É uma equipa possante em ataque organizado, até pelo perfil de ponta de lança, muito forte a jogar na área (Bas Dost ou Bendtner), mas destaca-se também pela capacidade para utilizarar «caminhos alternativos» para o golo. Um terço dos golos (21 de um total de 64) resulta de lances de bola parada, vertente em que a equipa de Dieter Hecking é muito forte (como será analisado adiante), e o peso das transições rápidas – 20 por cento (13 golos) - também é assinalável. O Wolfsburgo é uma equipa que explora bem o espaço, sobretudo através de Kevin de Bruyne, mas também com Vieirinha, Perisic e agora Schurrle.

Ponto fraco: descoordenação à retaguarda

Com 34 golos sofridos em 29 jogos (mais de um golo por jogo, em média), o Wolfsburgo revela-se, em contrapartida, uma equipa com algumas lacunas defensivas sensíveis. O resultado em Leverkusen é mais um indicador disso mesmo, apesar do triunfo, sobretudo se tivermos em conta que o adversário do Sporting tremeu apesar dos três golos de vantagem que chegou a ter. Um dos problemas mais significativos está relacionado com o espaço que se cria entre o «duplo pivot» e a linha mais recuada, e que depois acaba por agravar as dificuldades de coordenação no quarteto defensivo, que facilmente perde a referência da linha posicional.


A figura: Kevin de Bruyne

As crónicas do Wolfsburgo têm todas as assinaturas de Kevin de Bruyne, o Tintim do futebol belga. Os números do compatriota de Hergé são impressionantes: onze golos e quinze assistências em 29 jogos (esteve presente em todos os encontros). Isto corresponde a uma influência direta (golo ou assistência) em 41 por cento dos 64 golos do Wolfsburgo esta época. Só nos quatro jogos disputados após a pausa de inverno somou cinco golos e duas assistências. É um jogador muito difícil de travar, sobretudo quando «embala», dado o notável controlo de bola em velocidade, e por ser igualmente forte ao nível do passe. Especialmente perigoso em transição rápida, gosta de cair nas alas, mas é influente em todos os contextos. Não é só o melhor jogador do Wolfsburgo, é um dos jogadores europeus em melhor momento de forma.


Onze base:




DIEGO BENAGLIO
: se Rui Patrício teve uma noite infeliz no Restelo, o internacional suíço teve poucos motivos para sorrir em Leverkusen, ainda que a sua equipa tenha conseguido a vitória. O antigo guarda-redes do Nacional falhou em dois tentos do Bayer, confirmando a tendência para pontuar a sua elevada qualidade com um falhanço claro de vez em quando. Ótimos reflexos, elasticidade e frieza são alguns dos atributos do capitão do Wolfsburgo. A jogar com os pés costuma simplificar, embora tenha dificuldades em direcionar os pontapés longos para a referência ofensiva (Bas Dost, normalmente).

VIEIRINHA
: a utilidade e polivalência do internacional português estão à vista. Foi a extremo direito que mais vezes jogou, mas parece fixar-se cada vez mais como lateral direito, e até lateral esquerdo já foi numa ocasião (frente ao Hamburgo). Exímio a cruzar, está a construir também uma boa ligação com Bas Dost. É o segundo jogador da equipa com mais assistências.

NALDO
: aos 32 anos o que falta em velocidade é compensado com posicionamento e experiência. Faz lembrar o benfiquista Luisão nesse aspeto (e no físico, já agora), e em comum com o compatriota tem também a influência nas bolas paradas. Os cantos procuram-nos quase sempre, ali pela zona de penálti, com alguns bloqueios à mistura (três golos desta forma, e ainda um tento em que Perisic acaba por desviar junto ao guarda-redes). Mas para além disso é forte também na cobrança de livres diretos (dois golos). Tem seis golos apontados e participou em todos os jogos da equipa.

KNOCHE
: na segunda época como titular, o central de 22 anos revela ainda alguma oscilação no rendimento. Alterna entre jogos muito positivos, com uma abordagem serena e confiante, com outros encontros em que revela ansiedade, por vezes exagerando na referência individual para a marcação, e também com erros repetidos na primeira fase de construção.

RICARDO RODRÍGUEZ
: internacional suíço de apenas 22 anos, é um dos laterais esquerdos mais competentes do futebol europeu. Muito influente no processo ofensivo, quer através dos cruzamentos em lances de bola corrida, quer na cobrança de lances de bola parada (de todo o tipo). Tem seis golos marcados e ainda três assistências. Defensivamente sente-se relativamente confortável em situações de 1x1, mas nem sempre fecha bem junto dos centrais, revelando alguma descoordenação com Knoche, sobretudo quando este acompanha o movimento do adversário que recua para o espaço entre-linhas.

LUIS GUSTAVO
: o internacional brasileiro tem um pé esquerdo muito refinado, mas a sua influência no início do processo ofensivo é muitas vezes pincelada com erros importantes, quase sempre por culpa de uma abordagem algo displicente (responsabilidade clara em três golos). Falha a primeira mão devido a castigo.

GUILAVOGUI
: esteve nos planos do Benfica no início da época, mas acabou por rumar ao Wolfsburgo, onde tem assumido o papel de «segundo volante». É um médio muito intenso fisicamente, forte nos duelos individuais e com imenso pulmão no vai-e-vem entre uma área e a outra. Esteve a contas com um problema físico, mas em todo o caso falha também a primeira mão devido a castigo.

BAS DOST
: suplente de Ivica Olic na fase inicial da temporada, fixou-se como titular após a saída do croata para o Hamburgo, e tem justificado plenamente a aposta. Tem dez golos apontados esta época, quatro dos quais em Leverkusen, no passado sábado. Tem o típico perfil de «pinheiro», alto e forte fisicamente, capaz de segurar a bola na frente e permitir a subida da equipa, e muito eficaz no jogo aéreo. Não é muito dotado tecnicamente, mas joga bem a um toque, seja para finalizar ou para corresponder a uma tabela. Tem três assistências também.

PERISIC
: o internacional croata é um daqueles jogadores que assume o duplo papel de extremo/segundo avançado, muitas vezes trocando com Kevin de Bruyne. Não é um flanqueador puro, até porque muitas vezes joga na direita, embora seja canhoto. Está menos goleador do que na época passada, mas continua a ser um elemento influente (três golos e cinco assistências). Falhou os dois últimos jogos devido a lesão, pela que a sua utilização no primeiro duelo com o Sporting é incerta.

SCHURRLE
: sonante reforço de inverno, recrutado ao Chelsea, promete juntar-se a Kevin de Bruyne, também comprado aos «blues», para elevar o potencial da equipa. Ainda não se estreou a marcar mas precisou de apenas três minutos para fazer a primeira assistência. É um jogador de qualidade indiscutível, para reforçar as alas do Wolfsburgo, ainda mais carenciadas com o recuo de Vieirinha para lateral direito. Já marcou ao Sporting esta época, na Liga dos Campeões, e agora volta a surgir no caminho da equipa portuguesa.

Outras opções:

Com Luis Gustavo e Guilavogui afastados da primeira mão, devido a castigo, Maximilian Arnold
terá, em princípio, a titularidade garantida. O médio de apenas 20 anos substituiu o lesionado Guilavogui nos últimos jogos, de resto. Já com estatuto de internacional alemão, é um jogador bem mais fino do que Guilavogui, e que utilizado como «segundo volante» torna-se muito perigoso a lançar transições rápidas. Na goleada ao Bayern de Munique assistiu os dois golos de Kevin de Bruyne.

Para a outra vaga a meio-campo a possibilidade mais forte é Christian Träsch
, embora o camisola 15, nos últimos meses, praticamente só tenha jogado a lateral direito, posição que discutia com Jung mas que agora parece pertencer a Vieirinha. Jung
cruzou-se com o FC Porto na época passada, quando era ainda jogador do Frankfurt. Conserva algumas dificuldades perante bolas colocadas nas costas ou no espaço que o separa do central, ainda que ao serviço do Wolfsburgo esteja a mostrar-se menos ofensivo do que no emblema anterior.

Para o lado esquerdo a alternativa é o experiente Marcel Shafer
, internacional alemão de 30 anos. A dupla Naldo-Knoche parece inseparável, e por isso o terceiro elemento da hierarquia, o suíço Timm Klose
, fez apenas três jogos de início (no último jogo esteve ausente por lesão).

A contratação de Schurrle deve limitar a presença de Daniel Caligiuri
no «onze». O médio ofensivo alemão (de ascendência italiana) é rigoroso taticamente, tanto no apoio ao lateral como a fechar junto da zona central, e também finaliza com qualidade (quatro golos esta época), mas não tem sido muito eficaz a criar ocasiões de golos (apenas uma assistência).
Aaron Hunt
tem estado na sombra de Kevin de Bruyne, mas ainda assim vai rentabilizando o tempo de utilização, já com quatro golos marcador. Pode jogar como «10» ou mais num perfil de segundo avançado, pois aparece bem na área em apoio ao ponta de lança.

Para a posição 9 o técnico Dieter Hecking conta ainda com o dinamarquês Nicklas Bendtner
, que costuma dar-se bem com adversários portugueses (seis golos à Seleção Nacional e um «hat trick» ao FC Porto na Liga dos Campeões). Alternativa a Bas Dost, com características semelhantes, tem três golos apontados em quinze jogos (apenas quatro como titular).

Análise detalhada:

Depois de um início atribulado, com apenas um triunfo nos primeiros sete jogos da época, o Wolfsburgo encontrou depois a estabilidade. O adversário do Sporting teve um primeiro ciclo de dez jogos sem perder (oito triunfos consecutivos), que foi interrompido por duas derrotas, mas retomado logo de seguida num ciclo de invencibilidade que ainda se mantém. O adversário europeu do Sporting não perde há dez jogos
, e enfrenta a equipa portuguesa moralizado pela goleada ao Bayern (4-1), logo no recomeço da Bundesliga, e agora pelo triunfo espetacular em Leverkusen (4-5).

O desenho tático está claramente definido de Dieter Hecking, e parte de um 4x2x3x1. O técnico de 50 anos gosta de laterais ofensivos, um risco assumido tendo em conta a proteção dos dois médios mais defensivos. Um mais posicional (Luis Gustavo), e outro com um raio de ação alargado (Guilavogui), sobretudo verticalmente. Este «segundo volante» tem liberdade para aparecer junto da área contrária, até porque De Bruyne cai muito nas alas
, onde procura criar desequilíbrios. Tal como o Sporting, o Wolfsburgo explora muito o jogo exterior
, através de combinações simples entre os extremos e os laterais, incentivados a arriscar, ou com a aproximação de um terceiro elemento, função habitualmente assumida por Kevin de Bruyne, mas que também pode ser solicitada a um dos médios mais recuados.

A liberdade concedida ao duplo pivot não se regista apenas no processo ofensivo. Em organização defensiva estes dois elementos adiantam-se no terreno para seguir referências individuais e pressioná-las quando recebem a bola. Uma missão que dificulta o início da construção de jogo do adversário, mas que deixa depois um espaço perigoso nas costas
.


Isto acaba por acentuar a tendência da linha mais recuada para descoordenar-se
. Knoche e Ricardo Rodríguez mostram pouca sintonia, e por vezes um mero pontapé de baliza do guarda-redes contrário cria embaraços naquela zona, com hesitações relativamente a quem disputa a bola no ar e quem faz a cobertura em profundidade. A experiência de Naldo permite antecipar muitos problemas, mas a velocidade já não permite colmatar estas falhas dos parceiros. E o central brasileiro também tem de estar atento ao lado direito, pois Jung tem alguns problemas em respeitar a linha defensiva, e esse é naturalmente um dos aspetos em que Vieirinha procura ainda rotinas.
Organizado em 4x4x2 (De Bruyne forma a primeira linha de pressão junto ao ponta de lança), o Wolfsburgo tenta formar o bloco em zonas adiantadas, ainda que a pressão nem sempre seja intensa. O plano passa por ter a equipa curta (embora com aquela quebra recorrente entre os médios defensivos e os centrais), e colocar muitas unidades junto à bola. Se o Sporting conseguir sair dessa teia pode tentar explorar rapidamente o lado oposto, que fica a descoberto.

Essas transições podem criar problemas ao Wolfsburgo, mas esse é também um trunfo bem explorado pela equipa alemã no plano ofensivo, sobretudo com as acelerações de Kevin de Bruyne. No que diz respeito às bolas paradas, o Sporting deve estudar muito bem um antídoto para a fórmula alemã, que está bem identificada mas continua a funcionar. Os cantos são cobrados a fugir ao guarda-redes, para a zona da marca de penálti, onde surge Naldo nas alturas, muitas vezes sozinho, por força do «jogo de bloqueios»
. Em alternativa, e para fugir à atenção redobrada no brasileiro, optam ocasionalmente por cobrar o canto para o exterior da área, para um remate de primeira.

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