Filhos de Gabriel García Márquez publicam romance inacabado que o falecido autor queria "destruir"

CNN , Pau Mosquera e Oscar Holland
8 mar, 17:12
Gabriel García Márquez em Cartagena, Colômbia, em 1991. Ulf Andersen/Hulton Archive/Getty Images/File

"Todos os livros que ele não terminava e com os quais não ficava satisfeito eram destruídos. Por isso, o facto de ele não ter destruído este livro, penso eu, é também um sinal de que se tornou um pouco indecifrável para ele. Um Gabo (como García Márquez era carinhosamente conhecido) completamente no seu perfeito juízo teria terminado o livro ou tê-lo-ia destruído."

O último romance de Gabriel García Márquez, "Memória das Minhas Putas Tristes", foi publicado há 20 anos, mas o legado do falecido autor colombiano não terminou aí.

Após a sua morte, em 2014, uma obra inacabada - composta por até cinco rascunhos em que o vencedor do Prémio Nobel da Literatura estava a trabalhar durante os últimos anos da sua vida - ficou guardada no seu arquivo pessoal na Universidade do Texas, nos Estados Unidos.

Na quarta-feira, dia em que García Márquez completaria 97 anos, o romance agora terminado, "Vemo-nos em agosto", foi publicado pelos filhos do autor, Rodrigo e Gonzalo García.

Mas, como os dois reconhecem no preâmbulo do livro, García Márquez não queria que a obra fosse publicada. "Este livro não funciona", lembram-se de o pai lhes ter dito antes de morrer. "Tem de ser destruído."

Depois de rever os manuscritos, a família determinou que eles continham a essência do escritor que cativou tantos leitores durante décadas. No livro, os filhos de García Márquez admitem que publicá-lo foi um ato de "traição". Mas Gonzalo disse numa conferência de imprensa na terça-feira que nada foi acrescentado que não estivesse incluído nos vários rascunhos do romance deixados pelo seu pai.

"O romance estava um pouco disperso num certo número de originais, mas estava completo", revelou, enquanto os irmãos apresentavam o livro no Instituto Cervantes de Madrid.

Exemplares de "En agosto nos Vemos" (em Portugal, "Vemo-nos em Agosto"), o livro póstumo do escritor e Prémio Nobel Gabriel García Márquez, em exposição em Bogotá, Colômbia. Fernando Vergara/AP

"Não é tão polido como os seus melhores livros", acrescentou Rodrigo. "Mas, como dizemos no prólogo, tem definitivamente muitas das suas características marcantes: prosa bonita, conhecimento do ser humano, poder de descrição."

García Márquez trabalhou no romance durante vários anos até começar a sofrer de demência. A perda de memória do autor colombiano minou a sua confiança no seu trabalho, contaram os filhos.

"Ele nunca guardou livros não publicados", disse Rodrigo. "Todos os livros que ele não terminava e com os quais não ficava satisfeito eram destruídos. Por isso, o facto de ele não ter destruído este livro, penso eu, é também um sinal de que se tornou um pouco indecifrável para ele. Um Gabo (como García Márquez era carinhosamente conhecido) completamente no seu perfeito juízo teria terminado o livro ou tê-lo-ia destruído."

Passado num local não identificado das Caraíbas, "Vemo-nos em agosto" acompanha a protagonista Ana Magdalena Bach numa viagem anual à ilha onde a mãe está enterrada. Todos os anos, enquanto lá está, "por uma noite aceita um novo amante", de acordo com uma sinopse da editora Penguin Random House, que descreveu o romance como uma "profunda meditação sobre liberdade, arrependimento, autotransformação e os mistérios do amor".

O romance póstumo surgiu dos manuscritos graças ao trabalho de aperfeiçoamento do editor e agente literário Cristóbal Pera, que editou os dois últimos livros que García Márquez publicou em vida.

Os filhos de García Márquez confirmaram que não há outros romances inacabados guardados. "Toda a obra de Gabo está agora disponível para os seus leitores", confirmou Gonzalo.

*Michael Rios contribuiu para este artigo

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