A guerra no mar. Como a Rússia já conseguiu o que queria e um ataque a Odessa parece "pouco provável"

17 mar 2022, 07:00
Navio e helicóptero da Marinha da Rússia em exercícios no Mar Negro, ao largo da Crimeia (AP)

Carlos Branco, major-general e comentador CNN, afirma que o principal objetivo russo para a cidade já foi conseguido. Um ataque, a acontecer, “terá de ser feito em coordenação com forças terrestres”

Em três semanas de invasão russa da Ucrânia, o papel da Marinha da Rússia, ao contrário do Exército e da Força Aérea do país, tem estado relegado para segundo plano.

A tomada da ilha Zmiinyi, no segundo dia de conflito, muito comentada pela resposta de um dos 13 soldados ucranianos no terreno, foi importante para controlar as rotas marítimas para a zona ocidental da Ucrânia. À exceção deste evento, e do desembarque desta segunda-feira em Berdyansk, cidade portuária a cerca de 70 quilómetros de Mariupol, esta força tem tido poucas ações de relevo.

No entanto, a sua presença no Mar Negro é fulcral.

“A Marinha (russa) está a desempenhar o seu papel. Não está numa postura neutral”, afirmou à CNN Portugal o major-general Carlos Branco, que diz que, para a Frota do Mar Negro ser bem empregue, “terá sempre de ser destacada na zona de Odessa”.

A cidade costeira de Odessa é a terceira maior da Ucrânia. Pelo seu porto, o maior do país, passa uma grande parte do comércio da Ucrânia. O bloqueio feito a esta infraestrutura foi um dos principais objetivos alcançados pela Marinha russa, dado que a suspensão da navegação comercial traz graves consequências à economia ucraniana.

Na terça-feira, vários especialistas em assuntos navais reportaram uma aproximação à cidade de 14 navios russos, separados em três grupos, no que poderá ser entendido como uma movimentação preparatória.

Dominado o mar, poderão as forças russas fazer um ataque anfíbio a Odessa? “Neste momento, é pouco provável”, considera o major-general.

“A Frota do Mar Negro tem sete navios de desembarque, de dois tipos diferentes. Esses navios transportam, no total, 3600 soldados, acompanhados de 70 carros de combate ou 153 viaturas de transporte de pessoal. Uma força com 3600 soldados é apreciável, mas não será suficiente para atacar a cidade. A haver um ataque, terá sempre de ser feito em coordenação com as forças terrestres que se aproximem de Odessa a partir do norte. A isto, há que acrescentar o facto de o porto de Odessa estar minado e de essa zona ser difícil para um desembarque anfíbio”.

Para além da inviabilidade prática de um ataque nesta altura, o investigador do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI) duvida também que a Rússia tenha interesse em atacar Odessa neste momento.

“Nesta altura, não sei se a Rússia está interessada em Odessa. O efeito principal já foi conseguido, que é inviabilizar Odessa como estrutura naval. As forças russas estão muito concentradas a leste, não podem combater em todo o lado. O que está agora em causa é Mariupol, que eu estou convencido que tem as horas contadas. Enquanto os russos não conquistarem Mariupol e não consolidarem o controlo de toda aquela faixa ucraniana que dá para o Mar de Azov, tenho muitas dúvidas que abram outra frente”, explica o major-general Carlos Branco.

No entanto, no caso de haver um ataque, feito sempre em conjunto com as forças terrestres, Carlos Branco elenca as várias tarefas que a Marinha da Rússia poderá desempenhar.

“Nesse caso (de um ataque a Odessa), a Marinha pode garantir a defesa aérea, atacar posições críticas da cidade através de mísseis de cruzeiro, dar apoio de fogos às unidades terrestres e, ainda, destruir o sistema de comunicações das forças ucranianas na zona de Odessa”.

O avanço russo para a Odessa implica uma grande deslocação de leste para oeste. O major-general explica qual poderá ser a movimentação estratégica rumo à “Pérola do Mar Negro”.

"As forças russas estão a tentar capturar Mykolaiv, que está nas margens de um rio (Bug Meridional) muito largo. Atravessar o rio aí é muito difícil e só há uma ponte, é bastante arriscado fazê-lo no meio de um aglomerado urbano. Para o fazer, as forças russas deslocaram-se para norte, até Voznesens’k. Nessa zona, o rio é mais estreito e podem lançar pontes improvisadas. É por aí que vão tentar passar se decidirem ir para Odessa”.

Contudo, voltando a abordar a Marinha, Carlos Branco reforça a ideia principal. “Enquanto Mariupol não cair e não existir uma movimentação significativa para oeste, um desembarque em Odessa é pouco provável”.

Apesar disso, nos últimos dias, os habitantes da cidade têm-se preparado para um potencial ataque anfíbio. Os enviados especiais da CNN Portugal à cidade, André Carvalho Ramos e Ricardo Silva, têm testemunhado os preparativos dos locais para uma possível ofensiva a partir do Mar Negro.

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