Mariana tem razão, o salário mínimo pode não chegar aos 1.000€ em 2028. Mas Governo foi "realista" e isto pode não ser má notícia

13 abr, 09:00
Pedro Duarte, Miranda Sarmento e Montenegro na apresentação do Programa de Governo (LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO)

Os economistas Pedro Brinca, investigador e professor auxiliar da Nova School of Business and Economics, e Ricardo Ferraz, investigador do ISEG e professor na Universidade Lusófona, explicam os cenários em cima da mesa no que respeita à subida do Salário Mínimo Nacional

O novo Governo confirmou no seu Programa ter como "objetivo" aumentar o salário mínimo nacional (SMN) para 1.000 euros em 2028, Luís Montenegro voltou a afirmá-lo perante os deputados na quinta-feira, mas não avançou valores ou metas anuais de aumento. A única explicação que avançou é que a subida do SMN estará "em linha com a inflação mais os ganhos de produtividade como regra geral", cenários criticados pela coordenadora nacional do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua.

Mas o que quer isto dizer, que vai subir ou não vai subir? À CNN Portugal, o economista Pedro Brinca, investigador e professor auxiliar da Nova School of Business and Economics, explica que, "obviamente, Mariana Mortágua tem razão nestas críticas" e que é um facto que o SMN pode não chegar aos 1.000 euros nos próximos quatro anos, a duração da legislatura. No entanto, o especialista lembra que caso esta subida nominal do salário mínimo nacional não se verifique na totalidade, o nível de bem-estar e poder de compra de quem aufere este rendimento pode ainda assim aumentar.

"Se não chegar aos 1.000 euros, porque é que não chegou? Existe a subida nominal, mas o que interessa é o cenário real, o nível de bem-estar das pessoas. Se não chegar aos 1.000€ porque a inflação ficou abaixo do que era previsto, aí o poder de compra mantém-se, ou seja, na padaria, apesar de o aumento ter sido inferior ao previsto, será possível comprar o mesmo ou até maior número de pães", esclarece Pedro Brinca.

Ricardo Ferraz, investigador do ISEG e professor na Universidade Lusófona, acrescenta que "as subidas do salário mínimo não podem ser indiferentes à realidade económica vigente no país, não obstante ser um facto que Portugal não tem propriamente um valor elevado no contexto da União Europeia". O economista lembra que, no seu entendimento, o Governo aparenta "estar confiante numa conjuntura mais positiva e que o seu objetivo seja possível de ser atingido", mas alerta: "Há riscos".

"Imaginemos, por hipótese (esperemos que não), que os vários riscos económicos existentes se materializariam? Que a economia entrava numa profunda e prolongada recessão com destruição consecutiva de emprego. O que aconteceria se a subida do salário mínimo fosse indiferente a tudo isto? Nessa conjuntura altamente adversa, essas subidas contribuiriam provavelmente para aumentar, ainda mais, as falências, o desemprego, o número de contratados a tempo parcial (para evitar pagar o salário mínimo) e até as fraudes", detalha Ricardo Ferraz.

"Faz sentido o Governo ser realista"

Pedro Brinca diz que entende as críticas de Mariana Mortágua, mas não concorda com a coordenadora nacional do Bloco, porque, através deste modelo, o nível de bem-estar de quem recebe o SMN fica salvaguardado: "No caso de a inflação descer mais do que o previsto, os trabalhadores não perdem poder de compra - o que faz sentido - e o valor está ainda indexado à produtividade o que quer dizer que alavancamos o seu valor com a capacidade de a sociedade criar riqueza acumulada."

E no caso de a produtividade nacional ficar aquém das expectativas? "No pior cenário quanto à capacidade de produtividade, em que Portugal não foi capaz de gerar riqueza suficiente, também não seria viável alavancar o SMN", explica Pedro Brinca.

Para Ricardo Ferraz, "faz sentido o Governo ser realista já desde o início", lembrando que as subidas do SMN "devem ocorrer numa conjuntura de aumento da produtividade, de competitividade, de criação de riqueza e de emprego que permita às empresas pagar melhores salários". O investigador sublinha mesmo que "as subidas do salário mínimo têm de ser sustentáveis e acompanhar a realidade económica".

É certo que Portugal é um país de salários baixos quando comparado com a média da União Europeia, mas, na análise de Ricardo Ferraz, é uma questão de prudência a forma como o novo Governo pretende tratar a questão do SMN.

"O Governo nesta matéria parece ter sido prudente no seu programa. Agora, claro que, por motivos evidentes, os partidos que estão na oposição, e que querem conquistar eleitorado, não podem dizer isto. Faz parte do regular jogo político partidário", argumenta.

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