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André Villas-Boas, Pinto da Costa e o FC Porto: Agitação? Era preciso passar por isto!

25 jan, 10:00

Rui Santos escreve sobre o momento do FC Porto, no dia em que André Villas-Boas inaugurou a sua sede de candidatura: “um acto de coragem!”

Não existem dúvidas de que a entrada em cena de André Villas-Boas (AVB) como candidato assumido à presidência do FC Porto correspondeu a um momento único na história dos Dragões, talvez com algumas similitudes com o momento em que Pinto da Costa decidiu travar a marcha a Américo de Sá, com a pequena diferença de que, nessa altura, ninguém apelidou Pinto da Costa de traidor, e mesmo que tenha apelidado ninguém se apercebeu, porque não havia redes sociais e não havia esta facilidade estonteante de réplica, de cena e contracena a que hoje assistimos num ritmo diabólico, no futebol e fora dele.

Não sabemos, ninguém sabe, se AVB vai ganhar o acto eleitoral do FC Porto, o que seria terrível para Pinto da Costa, cujo cenário poderia ter evitado se, em tempo útil, não tivesse entrado em negação juntamente com todos aqueles que engordou de uma forma, até, inaceitável.

É preciso dizer, sem sofismas, que a entrada em campo de AVB, devidamente preparada e, portanto, sem corresponder a um impulso infantil, constitui um acto quase heróico, porque o sistema criado por Pinto da Costa tinha exactamente como fundamento e propósito não deixar que outras ideias ganhassem raízes, assim como outras figuras que não estivessem alocadas e controladas pelo “regime”.

E sempre foram muitas entre dirigentes, (ex) treinadores, (ex) jogadores, empresários, intermediários, e gente posicionada nos media, com muita, pouca ou nula exposição.

Nesse plano, também é preciso dizer, sem sofismas, que o mérito de Pinto da Costa é grande, porque não apenas conseguiu controlar potenciais conflitos em seu redor, como foi capaz de condicionar ilustres personalidades da cidade do Porto e ainda — como dizer? — congelar o próprio País, e não apenas o “país desportivo”, completamente ineptos para lidar com o condicionamento da acção e da opinião.

A inauguração da sede de candidatura de AVB é, em si própria, um acto histórico muito significativo e demonstra que, não obstante algumas episódios lamentáveis já ocorridos, nomeadamente junto da sua residência, AVB está pronto para lidar com as ameaças e até para as denunciar, como o fez quando apresentou formalmente a sua candidatura e não teve qualquer problema em afirmar que “é preciso cortar com o status quo, no qual impera o medo e ninguém se exprime livremente sem ser ameaçado”.

Para além, confesso, de achar muita piada a alguns “portistas” que apoiaram cegamente Pinto da Costa durante anos e que, hoje, ou estão calados ou se manifestam a favor de AVB (típico nas chamadas “revoluções”), não posso deixar de relevar a factualidade de muitas observações já protagonizadas por AVB — no plano do medo e das ameaças; das intermediações e da falta de transparência; do poder das claques e das causas e consequências da exaustão financeira — terem sido objecto de análise nos nossos espaços de opinião, perante a indiferença ou mesmo a repulsa de alguns falsos democratas.

A partir do momento em que Pinto da Costa se convence que consegue absorver todos os focos de frágil oposição (como aconteceu com Martins Soares, por exemplo), convence-se também de que a sua ‘armada’ iria acabar por estugar o passo de André e que este acabaria por ceder. Esse convencimento de ‘poder absoluto’ acabou por trair Pinto da Costa. E, portanto, se houve alguma traição neste processo foi de Pinto da Costa a si próprio.

Agora ou mais tarde, esta transição tinha de acontecer (com ou sem AVB), porque o tempo é inexorável e os líderes não são eternos, sobretudo naqueles casos em que as lideranças não se reformam por dentro, de modo a convencer os eleitores que as renovações internas, no sentido de corrigir algumas malformações quase congénitas, acabam por assegurar o crescimento e a modernização do clube. Não foi o caso e essa é a ‘tragédia’ que se abateu sobre o FC Porto. Uma “tragédia” que suscitará o aparecimento de novas dinâmicas capazes de revitalizar o FC Porto.

Não. O FC Porto sem Pinto da Costa não é menos FC Porto.

O FC Porto para ser mais FC Porto não tem de ser dependente nem aliado nem do Benfica nem do Sporting.

O FC Porto, para ser mais FC Porto, só tem de se reafirmar dentro de si próprio, fazendo a purga que é necessária para fazer do FC Porto aquilo que merece ser: um clube inclusivo, democrático, verdadeiramente livre, capaz de dizer ao Mundo que respeita os valores essenciais do Desporto e do associativismo.

Aqueles que querem um FC Porto fraco não percebem a importância que o FC Porto deve ter no futebol em Portugal e no País.

Já chega da narrativa tóxica da vitimização.

Vítimas são todos aqueles que dizem amar a democracia e depois se comportam como Salazares.

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