Senhorios querem aumento das rendas além dos 5,43% previstos ("somos pessoas, temos família"), inquilinos consideram "inadmissível" qualquer subida superior a 1%

31 ago 2022, 18:00
Imobiliário em Portugal (Getty Images)

Inquilinos pedem mesmo a intervenção do Governo - que na próxima segunda-feira terá novidades. Proprietários sublinham que vêm de quase dois anos sem aumento e também querem a intervenção do Governo: "Quem tem de encontrar uma fórmula para a vida das pessoas não se tornar impossível é o senhor António Costa"

A inflação custa a todos. Mas inquilinos e senhorios voltam a estar, uma vez mais, em extremos opostos na solução para o problema. Se os arrendatários admitem que as rendas têm de ser atualizadas em linha com os rendimentos, os proprietários querem ir além dos 5,43% previstos para o próximo ano.

“Um aumento de 5,43% nas rendas é inadmissível para a maioria das famílias. Não é só para as mais pobres”, resume Romão Lavadinho, presidente da Associação dos Inquilinos Lisbonenses. Para a associação, o Governo devia “fazer sair uma norma-travão” que impedisse a portaria que atualiza o valor das rendas de forma automática com base na inflação do ano anterior.

Os inquilinos recusam um cenário de congelamento e fixam uma linha vermelha para a subida: 1%. Segundo Romão Lavadinho, o valor tem em conta a subida nos salários na Função Pública, “já que no privado não houve atualização”.

Mas para os senhorios esse cenário não faz qualquer sentido. Para António Frias Marques, presidente de Associação Nacional de Proprietários, a própria fórmula de atualização das rendas – que tem em conta o valor da inflação sem a componente da habitação – devia ser revista.

“Se há uma inflação de 9%, não compreendemos porque é que a atualização do valor da renda é de apenas 5,43%. Se a renda já estava desatualizada, ainda fica mais”, reage o porta-voz, lembrando que os senhorios têm de enfrentar custos de impostos, obras e de condomínio, além dos aumentos no supermercado ou na energia: “Os senhorios também são pessoas de carne e osso e têm famílias. Vem tudo a subir. Também há um agravamento dos juros. E nos bancos ninguém bate”.

De referir que a atualização automática não obriga os senhorios a subir rendas, fixando apenas o intervalo máximo em que podem fazê-lo. Em última instância, o proprietário pode querer manter o valor.

"O senhor António Costa"

O Governo está a trabalhar num pacote de medidas para contrariar o impacto da inflação no bolso dos portugueses, onde devem também constar propostas no que respeita às rendas. Nesta matéria, há quase um mês que o executivo diz estar a “analisar” o problema. O pacote será aprovado em Conselho de Ministros Extraordinário da próxima segunda-feira.

E, como o tempo até lá é curto, inquilinos e senhorios deixam propostas concretas. Porque ambas as partes estão de acordo numa coisa: se as rendas subirem como manda a lei, o incumprimento vai disparar, já que os custos sobem em todas as áreas da vida.

Pelos inquilinos, além da norma-travão para impedir a atualização automática, pede-se ao Governo que considere o aumento dos salários e das reformas, no âmbito da negociação com os parceiros sociais e do Orçamento do Estado para 2023. Questionado sobre a capacidade das empresas para responder aos aumentos no atual contexto, Romão Lavadinho argumenta que “a maior parte das grandes empresas está a beneficiar com a inflação”. Já quanto às restantes, pequenas e médias, que constituem a parte mais considerável do tecido empresarial português, o porta-voz concretiza que “o Governo deve diminuir impostos e criar apoios”.

“O ónus desta situação não pode recair sobre os proprietários”, insiste António Frias Marques, da Associação Nacional de Proprietários, lembrando que a atualização máxima permitida em 2022 foi de 0,43%. No ano anterior não houve qualquer subida.

“A medida aceitável é ser permitido uma atualização da renda de acordo com a inflação. Quem tem de encontrar uma fórmula para a vida das pessoas não se tornar impossível é o senhor António Costa. Desde 2015 que está previsto um subsídio de renda. A lei está publicada, mas nunca foi regulamentada”, argumenta, apontando este apoio como uma possível solução.

Retrato do Arrendamento

O valor das rendas deverá aumentar 5,43% em 2023, segundo os números da inflação dos últimos 12 meses até agosto divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). O valor efetivo só será apurado quando, a 12 de setembro, forem publicados os dados definitivos.

Na prática, para os inquilinos dos senhorios que decidirem aplicar a fórmula na íntegra, estão em causa mais 5,43 euros por cada 100 euros de renda. Em Portugal, onde existem quase 923 mil contratos de arrendamento, cerca de 70% das rendas encontram-se abaixo dos 400 euros. Apenas 2,2% têm um valor acima dos mil euros, segundo dados do INE. As rendas anteriores a 1990, congeladas para inquilinos com carências económicas, são cerca de 200 mil.

O coeficiente de atualização das rendas deve ser publicado num aviso em Diário da República até 30 de outubro para se tornar efetivo. Só depois desta publicação é que os proprietários poderão anunciar aos inquilinos o aumento da renda, sendo que a subida só poderá efetivamente acontecer 30 dias depois.

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