Rússia-Ucrânia: “O risco de um grande conflito é real”

CNN Portugal , FSC/AM
22 fev 2022, 06:36
Ucrânia

Apesar de inconclusivo, o encontro do Conselho de Segurança mostrou um grande alinhamento nos apelos à diplomacia para tentar ainda evitar uma guerra total na Ucrânia. Um apelo subscrito pelos EUA, França, Reino Unido e Irlanda, mas também pela Índia, Quénia, Gana e Emirados Árabes Unidos

Ao fim de 90 minutos muito tensos, a reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU terminou sem decisões, tal como era expectável. A Rússia, para além de ter poder de veto sobre qualquer decisão do Conselho de Segurança, tem atualmente a presidência rotativa deste órgão. A inoperância da ONU foi criticada pelo embaixador da Ucrânia, na sua intervenção de fundo: “As Nações Unidas estão doentes. É um facto. Foram atingidas pelo vírus disseminado pelo Kremlin. Irão sucumbir a este vírus?”, questionou o representante ucraniano.

Apesar de inconclusivo, o encontro do Conselho de Segurança mostrou um grande alinhamento nos apelos à diplomacia para tentar ainda evitar uma guerra total na Ucrânia. Um apelo subscrito pelos EUA, França, Reino Unido e Irlanda, mas também pela Índia, Quénia, Gana e Emirados Árabes Unidos. Desta coincidência, a representante dos EUA retirou a existência de uma “mensagem unida: a Rússia não deve começar uma guerra”. 

A China, que tem alinhado com a Rússia, tratou os dois lados da mesma forma, pedindo “moderação” e “soluções razoáveis ​​para as preocupações de ambas as partes”.

Rosemary Di Carlo, sub-secretária-geral da ONU para assuntos políticos e de manutenção de paz, declarou esta noite, na reunião de emergência do Conselho de Segurança, que a decisão da Rússia “se arrisca a ter consequências regionais e globais”. “Lamentamos a ordem de hoje, para o envio de tropas russas para o leste da Ucrânia, supostamente numa missão de paz”, disse a representante da ONU, considerando que “o risco de um grande conflito é real e tem de ser prevenido a todo o custo”.

A responsável pelas Nações Unidas reiterou “o total compromisso da ONU com a soberania, independência e integridade territorial da Ucrânia, dentro de suas fronteiras internacionalmente reconhecidas, de acordo com as resoluções da Assembleia Geral.”

Rússia acusa; Ucrânia responde

A Rússia, que este mês preside ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, acusou a Ucrânia e o Ocidente de serem os responsáveis pela guerra. O Ocidente, por ter “incentivado” a Ucrânia para um conflito; a Ucrânia por ter “sabotado” os Acordos de Minsk, ao ignorar os separatistas apoiados por Moscovo, segundo Vasily Nebenzya, embaixador russo.

A resposta do seu homólogo ucraniano foi dura, repetindo as garantias dadas horas antes pelo presidente Zelensky: “Estamos na nossa própria terra. Não temos medo de nada nem de ninguém. Não vamos dar nada a ninguém. As fronteiras internacionais da Ucrânia estão e vão continuar imutáveis."

Acusando a Rússia de ter encenado um motivo para o conflito, Sergiy Kyslytsya exigiu que Moscovo "cancele a decisão de reconhecimento [da independência dos territórios reclamados pelos separatistas] e volte à mesa de negociações.” Exigiu também "a retirada imediata e completa das tropas de ocupação".

Ocidente arrasa a Rússia

A representante do Reino Unido no Conselho de Segurança (CS) da ONU afirmou esta noite que o envio de tropas ordenado por Vladimir Putin “terá consequências sérias e amplas”, desde logo na perda de vidas, após a Rússia ter “desencadeado as forças da guerra, morte e destruição sobre o povo da Ucrânia”. “Ao tentar redesenhar as fronteiras pela força, as ações da Rússia mostram um desprezo flagrante pelo direito internacional”, afirmou Barbara Woodward.

“A Rússia escolheu o caminho da confrontação”, acusou também Nicolas de Rivière, o embaixador da França, que é membro permanente do CS, tal como o Reino Unido. 

O embaixador da Irlanda prometeu apoio “inabalável” à Ucrânia, enquanto o Gana reafirmou o compromisso com “as fronteiras internacionalmente reconhecidas da Ucrânia”. lamentando “a decisão da Federação Russa de virar as costas aos acordos de Minsk”.

Menos assertivos, a Índia e os Emiratos Árabes Unidos pediram “contenção a todos os lados”. Também a China se limitou a uma declaração mínima, sem se comprometer.

“Todas as partes envolvidas devem exercer moderação” e “procurar soluções razoáveis ​​para as preocupações umas das outras”, disse Zhang Yun, o representante de Pequim nesta reunião - sem defender a Ucrânia, e sem afrontar a Rússia. Recorde-se que Putin e o líder chinês Xi Jinping afirmaram recentemente uma nova parceria entre os dois países para desenhar uma “nova era” na geopolítica global.

EUA: Tropas russas em “missão de paz”? “Disparate! Sabemos o que eles realmente são”

A embaixadora norte-americana nas Nações Unidas, Linda Thomas-Greenfield, arrasou esta noite as alegações de Moscovo de que as tropas russas que foram enviadas para território ucraniano estão em “missões de manutenção da paz”. “Isto é um disparate. Nós sabemos o que eles realmente são!”, declarou a diplomata norte-americana, na sessão de emergência do Conselho de Segurança. O reconhecimento da independência de regiões no leste da Ucrânia por parte de Putin é “claramente a base para a tentativa da Rússia de criar um pretexto para uma nova invasão da Ucrânia”, denunciou a representante dos EUA. 

"O claro ataque da Rússia à soberania e à integridade territorial da Ucrânia não foi provocado", sublinhou Linda Thomas-Greenfield, alertando que o líder russo está "a testar nosso sistema internacional, está a testar a nossa determinação e a ver até onde nos pode levar a todos".

“Putin quer voltar atrás no tempo, para uma época em que os impérios governavam o mundo. Mas não estamos em 1919”, avisou Thomas-Greenfield. As ações da Rússia, afirmou a diplomata americana, são a violação de princípios básicos do direito internacional, e “ninguém pode ficar à margem”.

Esta madrugada, o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, anunciou que todo o pessoal do Departamento de Estado norte-americano seria retirado de Lviv ainda durante esta noite, por razões de segurança, e “passará a noite na Polónia”. Lviv é a principal cidade no Oeste da Ucrânia, perto da fronteira polaca.

Segundo Blinken, “o pessoal retornará regularmente para continuar seu trabalho diplomático na Ucrânia e prestar serviços consulares de emergência. Eles continuarão a apoiar o povo ucraniano e o governo ucraniano, coordenando os esforços diplomáticos”. O chefe da diplomacia norte-americana fez questão de frisar que esta medida não significa um abandono da Ucrânia.

“O facto de estarmos a tomar precauções para a segurança do pessoal do governo dos EUA e dos cidadãos dos EUA, como fazemos regularmente em todo o mundo, de forma alguma prejudica o nosso apoio ou nosso compromisso com a Ucrânia. O nosso compromisso com a Ucrânia transcende qualquer local.”

Japão condena “violação do direito internacional”

O ministro dos Negócios Estrangeiros do Japão, Yoshimasa Hayashi, condenou a Rússia pela “violação do Direito Internacional” ao reconhecer a independência das “repúblicas populares” controladas por rebeldes pró-russos. Numa conferência de imprensa esta terça-feira de manhã, o MNE japonês deixou a garantia de que “vamos prestar muita atenção ao desenvolvimento da situação, com séria preocupação, e cooperar com a comunidade internacional, como o G7, para coordenar medidas rigorosas, incluindo sanções”.

Segundo o diário nipónico Yomiuri Shimbun, o Japão está disponível para alinhar com as sanções económicas que os EUA e os seus aliados ocidentais decidam, incluindo a proibição de venda de chips e outras exportações tecnológicas consideradas essenciais. O Japão é a terceira maior economia mundial, e um dos grandes exportadores de tecnologia de ponta, nomeadamente componentes da indústria automóvel, sensores e outros equipamentos altamente especializados.

No passado o Japão optou, frequentemente, por aplicar à Rússia sanções mais suaves do que os Estados Unidos. Uma abordagem mais cautelosa que se justificava tanto pelas disputas fronteiriças entre os dois países (nomeadamente sobre a soberania de ilhas ocupadas pela Rússia após a II Guerra Mundial) como pela necessidade de importar gás natural russo. Esses cuidados parecem estar a ser postos de lado conforme a Rússia tenta reconstituir o seu poderio militar, numa renovada parceria com a China.

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