Pagamentos do GES através de contas estrangeiras poderiam vir a dar problemas mais tarde, admite ex-gestor

30 out 2023, 14:08
Manuel Pinho à chegada ao tribunal na primeira sessão do julgamento do caso EDP (Foto: António Pedro Santos/Lusa)

Durante a sessão do julgamento de Manuel Pinho, da sua mulher, e de Ricardo Salgado, um antigo gestor do GES admitiu ainda ter conhecimento de que era comum a realização de pagamentos a colaboradores através de contas estrangeiras

O ex-chairman da Rioforte, Manuel Fernando Moniz Galvão Espirito Santo Silva, assumiu esta segunda-feira em tribunal que era comum o Grupo Espírito Santo realizar pagamentos através de contas estrangeiras e que essa estratégia poderia vir a trazer problemas para o GES. “Sabíamos disso, com certeza falava-se disso”, afirmou em resposta a uma pergunta do advogado de Manuel Pinho, destacando, depois, que se “pensava que mais tarde isso se iria resolver”.

Já sobre se Manuel Pinho, quando foi nomeado para ministro, mantinha uma relação privilegiada com o BES, Manuel Espírito Santo Silva sublinhou que “obviamente há sempre uma relação pessoal”. “Mas não me posso pronunciar sobre isso”, acrescentou.

Pinho já havia alegado anteriormente, em tribunal, que os pagamentos do GES que recebeu no estrangeiro durante o período em que exerceu funções como ministro da Economia foram uma imposição do BES. Já esta segunda-feira foram detalhadas as reuniões e os avanços e recuos que existiram na atribuição de Projeto de Interesse Nacional (PIN) à Herdade da Comporta e a realização do torneio de golfe Ryder’s Cup, um dos maiores mundialmente, em 2018, nesse mesmo local.

Em 2006, numa altura em que estava a ser discutida a viabilidade de a Herdade da Comporta ser classificada como PIN, Carlos Manuel Espírito Santo Beirão da Veiga, gestor do empreendimento e uma das testemunhas, contou em tribunal que houve uma reunião entre este representante, o dono na altura da cadeia de hotéis AMAN e Manuel Pinho. 

“Apresentámos ao Ministério da Economia o grupo AMAN e explicámos que, numa das zonas do terreno, havia já um projeto para hotel aprovado”, afirma Carlos Beirão da Veiga. 

Também Manuel Galvão Espírito Santo Silva destacou que esteve presente em reuniões com Manuel Pinho e com o fundador do grupo de hotelaria AMAN, “por cortesia” e também porque existia interesse da parte deste grupo de “construir mais um ou dois hotéis” no Norte do país.

Já precisamente sobre as vantagens que a Comporta teve ao ser anunciada como Projeto PIN, um regime criado durante o governo de José Sócrates para agilizar investimentos avultados e a sua tramitação, Manuel Galvão Espírito Santo Silva disse que se tratou de “uma via verde para o projeto”. “Quando Manuel Pinho foi para o Ministério da Economia lançou essa ideia (dos projetos PIN) e era um canal que facilitava a Comporta e todos os projetos”, realçou também.

Outro dos temas em análise no julgamento foi a escolha da Herdade da Comporta, do grupo BES, como candidata à Ryder Cup 2018. Uma decisão direta de Manuel Pinho, que já como ex-ministro em janeiro de 2010, encabeçava a comissão de candidatura nacional a este torneio de golfe. 

“A proposta para a candidatura custou cerca de um milhão de euros”, disse Carlos Beirão da Veiga, ressalvando estudos realizados na altura sobre o impacto que a prova iria ter para o país, cerca de 550 milhões de euros.

Portugal nunca chegou a ser selecionado para organizar a Ryder’s Cup, tendo perdido para França. Mas já em 2010, quando a comissão liderada por Pinho selecionou a Herdade da Comporta como o local para a eventual prova, existiram críticas feitas pelo Turismo do Algarve, que se mostrou “indignado” por a região, distinguida múltiplas vezes como melhor destino de golfe do mundo, ter sido afastada. O presidente da instituição, Nuno Aires, acusou mesmo a Federação Portuguesa de Golfe e o ex-ministro da Economia Manuel Pinho de "falta de transparência".

Questionado sobre se a decisão da escolha da Herdade da Comporta para a organização deste evento está ligada ao facto de Manuel Pinho ter feito carreira anteriormente como administrador do BES, Beirão da Veiga disse que isto “não teve qualquer influência”.

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