opinião
Estudante de Doutoramento em Teologia na Universidade da Santa Cruz, Roma

O que mudou a vida do Papa Francisco e pode mudar a tua

22 jul 2023, 16:00

Não era fácil substituir dois gigantes como foram João Paulo II e Bento XVI. Qual é o carisma do Papa Francisco? Um homem que ouve antes de falar. Empático. Quer compreender mais do que acusar. Esforça-se por se colocar na posição do seu interlocutor. Fala com linguagem simples e com exemplos conhecidos. Recorda a importância da confissão. Penso que não houve nenhum Papa que o tenha feito com tanta insistência. Não é só um apelo à Igreja e aos fiéis: é fruto da sua experiência pessoal, o reconhecimento da sua debilidade, como testemunhas nestes momentos.

Buenos Aires, 21/09/1953. Jorge Mario Bergoglio tem 17 anos e preparava-se para ir festejar o dia dos estudantes com os seus companheiros. Decidiu passar antes na paróquia de S. José das Flores. Encontrou-se com um padre desconhecido, que lhe inspirou confiança. Decidiu confessar-se. Não foi mais uma confissão. Foi o momento em que descobriu de um modo novo que Deus está vivo. Regressou a casa com a convicção de que Deus o chamava para ser sacerdote. “Nessa confissão aconteceu algo que não sei explicar e que me mudou a vida; foi a surpresa de um encontro com Alguém que está à tua espera”(1). 

Sardenha, 22/09/2013. Francisco tem o seu primeiro encontro com jovens numa viagem apostólica como papa e confessa: “Ontem completei 60 anos desde o dia em que ouvi a voz de Jesus no meu coração. Não digo isto para que me ofereçais um bolo (...) Não me arrependi! Mas porquê? Porque me sinto como Tarzan, forte para ir em frente? Não, não me arrependi porque sempre, até nos momentos mais tenebrosos, nos momentos do pecado, nos momentos da fragilidade, nos momentos da falência, olhei para Jesus e confiei n’Ele, e Ele não me deixou sozinho”(2). Aquela confissão mudou-lhe a vida. Descobriu que Deus o amava não apesar das suas fraquezas, mas através delas. C.S. Lewis em “The four loves” descreve este “amor de benevolência”, como o mais exigente. Estamos habituados a ser amados pela nossa beleza, pela nossa simpatia ou excelência. No entanto, Deus ama-nos porque somos Seus filhos, não pelas nossas qualidades. 

Roma, 27/09/2013. Francisco enfrenta a sua primeira grande entrevista com Antonio Spadaro (3) que lhe pergunta: “Quem é Jorge Mario Bergoglio?”. Faz-se silêncio. O Papa está pensativo e responde: “Não sei qual será a resposta”. Um novo silêncio, e finalmente a resposta. “Eu sou um pecador. Esta é a definição mais exata. Não se trata de um modo de falar ou de um género literário. Sou um pecador”. Continua o Papa: “Poderia dizer que sou uma pessoa ambiciosa e, ao mesmo tempo, ingénua. Mas a melhor síntese, a que me sai de dentro e mais verdadeira é esta: “sou um pecador em quem o Senhor pôs os Seus olhos”.

La Paz (Bolívia), 10/07/2015. Numa das visitas mais desafiantes do seu pontificado, Francisco visita a maior prisão do país. Diante dos mais de 6000 reclusos pergunta-lhes: “Quem está diante de vós?” E responde:”Aquele que está diante de vós é um homem perdoado. Um homem que foi e está salvo dos seus muitos pecados. E é assim como me apresento. Não tenho muito mais para vos dar ou oferecer, mas o que tenho, e amo, quero dar-vo-lo, quero partilhá-lo: É Jesus, Jesus Cristo, a misericórdia do Pai” (4). Numa entrevista concedida a Andrea Tornielli, que deu origem ao livro “O nome de Deus é misericórdia”, acrescenta: “Cada vez que cruzo a porta de uma prisão, para uma celebração ou uma visita, vem-me sempre à cabeça este pensamento: “Porquê eles e não eu”? Eu tinha que estar aqui, merecia estar aqui. Os seus crimes poderiam ser os meus, não me sinto melhor do que as pessoas que tenho à minha frente”(5).

Roma, 29/03/2019. O Papa Francisco institui a iniciativa 24 horas para o Senhor e pede que seja implementada em todas as dioceses para que muitos jovens se aproximem da confissão. O Papa confessa-se em público e senta-se no confessionário para confessar vários jovens. É o caso de Letizia Speziali, uma rapariga de 15 anos de Perugia, que reconheceu depois: “A confissão não foi um interrogatório. O Papa deixou-me falar. Perguntou-me de onde sou e disse-lhe que sou de Perugia”. O Papa sorriu e disse “Perugia, a cidade dos chocolates Baci”. Estava tão emocionada que começou a chorar, e o Papa diz-lhe: “'Não te quero ver triste, os rostos dos jovens devem ter sempre o sorriso de Jesus”. Francisco dá o exemplo. A confissão é o encontro com a alegria de Deus, não é um método de autoajuda nem um cosmético. É a passagem da miséria à misericórdia, é a escrita de Deus no coração. Sempre que nos aproximamos dela, vemos que somos preciosos aos olhos de Deus, que Ele é Pai e nos ama mais de quanto nos amamos a nós mesmos. 

Lisboa, 2-8 de agosto de 2023. O Papa quer que estes dias sejam a tua oportunidade de mudar a tua vida, o teu momento de conversão. O Papa sabe, por experiência própria, que a confissão é um ingrediente fundamental neste processo. Converter-se é transformar-se em algo melhor. E participar na JMJ é a expressão desse desejo de conversão, de não se conformar. Por isso, o Parque do Perdão em Belém conta com 150 confessionários, construídos por reclusos dos estabelecimentos prisionais de Coimbra, de Paços de Ferreira e do Porto. Em cada confessionário, e em diferentes idiomas, estará disponível um padre para acolher e escutar os jovens peregrinos, convidando-os a fazer essa mesma experiência de misericórdia. Este guia, que conta com milhares de downloads, pode ser uma ajuda (6). Para mim, como sacerdote, poder ser instrumento de Deus na confissão e poder-me confessar cada semana é das maiores alegrias que Deus me pode dar. O Papa Francisco espera que esse Parque do Perdão, na Cidade da Alegria, seja a oportunidade de um reinício na tua vida. Ele espera que possas voltar a pôr o contador a zero, esvaziar o peso da mochila carregada com marcas do teu passado e com aquelas coisas que gostarias de esquecer. Já pensaste em arriscar, entrar num confessionário e passar pela mesma experiência libertadora do Papa Francisco? 

 

Notas

(1) Papa Francisco, Audiência de 2013/05/15

(2) Papa Francisco, Discurso de 2013/09/22

(3) Entrevista do Papa Francisco a Antonio Spadaro a 19/08/2013 publicada no Observatorio Romano, Ano XLV, n. 39 (2333), 2013/09/27.

(4) Papa Francisco, Discurso de 2015/07/10

(5) Papa Francisco, “O nome de Deus é misericórdia”, Editorial Planeta, Lisboa 2016, p. 29.

(6) O guia da confissão pode-se consultar aqui.

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