Continua esta tarde a quarta sessão de julgamento do caso Jéssica, a menina de três anos morta em junho do ano passado em Setúbal
Uma das testemunhas arroladas no processo do caso Jéssica relatou em tribunal o momento em que viu Jéssica Biscaia ao colo da mãe, Inês Sanches, na manhã do dia 20 de junho de 2022, horas antes de ter sido declarado o óbito.
“Ia ao colo da mãe, tapada, parecia que ia a dormir. Tinha as perninhas de fora."
O idoso ia a passar junto à Praça do Quebedo, em Setúbal, onde por volta das 09:00 do dia 20 de junho de 2022 Inês foi ao encontro de Ana Pinto, a alegada ama, e da filha Esmeralda Montes para recuperar a filha, depois de cinco dias aos cuidados da família Montes, acusados de utilizar a criança como garantia de pagamento de uma dívida.
Segundo a acusação do Ministério Público, no momento descrito pela testemunha Jéssica Biscaia estava já em estado crítico, com várias peladas no cabelo, vários hematomas e marcas de queimaduras.
De acordo com a testemunha, que conhecia Jéssica por frequentar o mesmo café onde a menina ia com a mãe, não era hábito Inês pegar a filha ao colo: “Nunca a tinha visto ao colo da mãe".
“Ia deitada no colo da mãe, nos braços da mãe. A mãe andava em passo apressado”, descreve a testemunha. “Como está ali uma escola pensei que ela tivesse ido buscar a menina à escola e que ela viesse a dormir. Depois vi na televisão que a menina tinha morrido.”
No momento descrito pela testemunha, Inês Sanches dirigia-se a casa. Após isso, acredita o MP, deitou na cama a filha, que, em sofrimento, acabou por morrer horas depois.
Testemunha confirma dívidas de mãe de Jéssica à família Montes: “A Inês a mim paga-me a bem ou paga-me a mal”
Semanas antes da morte de Jéssica Biscaia, Esmeralda Montes e Ana Pinto (Tita) foram a um café perto da casa de Inês Sanches, onde terão pedido informações sobre a morada da mãe da criança.
“A Esmeralda estava agressiva, enervada, e disse ‘a Inês a mim ou paga-me a bem ou paga-me a mal'. Perguntaram onde era a casa onde a Inês morava e eu só apontei a direção. Não disse a morada certa.”
O depoimento em causa foi de imediato interrompido pela arguida Esmeralda Montes, que, a partir do banco dos réus, decidiu responder às alegações da testemunha: “É mentira! Eu disse isso?! Eu disse isso?!”.
A arguida, filha da alegada ama da menina, foi de imediato chamada à atenção pelo juiz presidente do coletivo, que rapidamente repôs a ordem na sala de audiências.
Criança achava que ia para colónia de férias
Na última semana de vida, uma segunda-feira de manhã, Jéssica chegou ao café ‘Joker’, em Setúbal, de mochila às costas, acompanhada da mãe. Segundo a terceira testemunha ouvida esta tarde no processo, empregada de balcão, a menina estava muito feliz. Acreditava que ia brincar com mais crianças, mas terá sido entregue pela mãe, Inês Sanches, pela última vez a Ana Pinto (‘Tita’), Esmeralda e Justo Montes.
“‘Xanda’, ‘Xanda’, vou para a escolinha”, foi a última frase que Sandra ouviu de Jéssica Biscaia. “Deu-me um abracinho, estava muito contente. A Inês também me disse que a menina ia para uma colónia de férias.”
A mesma testemunha recorda ainda ter visto Jéssica Biscaia, cerca de duas semanas antes, “cabisbaixa e dorida” e com evidentes sinais de violência.
“Tinha uma nódoa negra na cara. Depois do almoço voltou ao café com a mãe, que levantou a blusa. Vi que tinha uma marca de dentada no braço (aparentava ser de criança), nódoas negras numa das pernas.”
Questionada pelo MP sobre se Inês e Jéssica iam acompanhadas de alguém, a testemunha afirma que o padrasto, Paulo Amâncio, acompanhava ambas mas que estava no interior do café quando Inês, na esplanada, mostrou o corpo da menina. Segundo a testemunha, Inês recusava a ideia de levar a menina ao hospital.
“Vão achar que sou eu que lhe dou maus-tratos.”