Iwao Hakamada foi condenado à morte na década de 60. Aos 87 anos, tem a oportunidade de defender a inocência num novo julgamento

13 mar 2023, 16:02
Iwao Hakamada, no centro, à entrada para o Supremo Tribunal de Tóquio em março de 2023. (Kazuhiro Nogi/AFP via Getty Images)

Japonês insiste não ter cometido o crime pelo qual foi condenado - e que lhe valeu o título de recluso que mais tempo passou no corredor da morte

Iwao Hakamada foi acusado de roubar e assassinar o diretor da empresa onde trabalhava, a sua mulher e os dois filhos adolescentes, na década de 60. Apesar de ter inicialmente confessado o crime, o suspeito acabaria por mudar o testemunho e defender a sua inocência ao longo do julgamento - sem sucesso. Aguardou no corredor da morte durante décadas e só agora, com 87 anos, viu concedida a oportunidade de ter um novo julgamento. 

Os factos remontam a 1966, quando as quatro vítimas foram esfaqueadas até à morte e posteriormente carbonizadas num incêndio na casa onde viviam, em Shizuoka. Hakamada admitiu as acusações que lhe eram imputadas, a princípio, embora mais tarde viesse a esclarecer que tinha sido vítima de agressões por parte das autoridades japonesas que o obrigaram a uma confissão forçada. Durante as restantes décadas em que permaneceu preso, manteve sempre a sua inocência. 

Passou 45 anos no corredor da morte em solitária, sem qualquer contacto com o exterior. Como é habitual no sistema prisional do Japão, só seria informado do dia da execução na mesma manhã da ocorrência. As décadas em confinamento valeram-lhe o título de recluso que mais tempo passou no corredor da morte - até novos dados forenses virem a mudar o rumo do processo em 2014.

Iwao Hakamada e a irmã, Hideko, fotografados após uma conferência de imprensa em 2019. (Kazuhiro Nogi/AFP via Getty Images)

Análises de ADN revelaram que o sangue encontrado em diversas provas supostamente incriminatórias não pertenciam a Hakamada e recontextualizavam o que se sabia sobre o crime. Foi libertado provisoriamente nesse mesmo ano, em que também lhe foi concedido um novo julgamento pelo tribunal distrital de Shizuoka, para logo se deparar com uma série de impasses judiciais que se prolongaram por anos. 

Em 2023, com 87 anos e uma saúde debilitada, foi-lhe finalmente concedido o direito a um novo julgamento. A decisão foi recebida com alívio pela família e por grupos humanitários que consideram "justo" que Hakamada possa defender a sua versão dos acontecimentos enquanto ainda está vivo. 

"Esta decisão significa uma oportunidade há muito esperada de fazer justiça a Iwao Hakamada, que passou mais de meio século sob pena de morte, apesar da injustiça flagrante do julgamento que determinou a sua condenação", declarou Hideaki Nagawa, diretor da Amnistia Internacional do Japão. "Agora que o Supremo Tribunal de Tóquio reconheceu o direito de Hakamada ao julgamento justo que lhe foi negado há mais de 50 anos, é imperativo que os procuradores permitam que isto aconteça". 

O representante da Amnistia Internacional japonesa reforça ainda que a condenação foi baseada numa "confissão forçada" e que todas as provas - sobretudo as reveladas em 2014 - suscitam "sérias dúvidas" quanto à alegada participação de Hakamada no crime. "E mesmo assim, aos 87 anos de idade, não lhe foi dada uma oportunidade de contestar o veredicto que o manteve sob ameaça constante de execução durante a maior parte da sua vida". 

A irmã de 90 anos, Hideko Hakamada, passou décadas a defender a inocência do irmão e a lutar pela possibilidade de um novo julgamento. Termina assim uma luta que se estendeu por mais de metade da sua vida: "Esperei 57 anos por este dia, e agora chegou. Foi finalmente retirado um peso dos meus ombros", afirmou aos jornalistas, sem conseguir esconder o sorriso eufórico. 

A irmã e o advogado de Iwao Hakamada celebram a decisão do Supremo Tribunal de Tóquio em março de 2023, depois de décadas de luta por um novo julgamento. (Kazuhiro Nogi/AFP via Getty Images)

 

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