O que é uma oligarquia e como ela surgiu na Rússia

7 mar 2022, 07:00
Vladimir Putin com Vagit Alekperov (Alexei Nikolsky/AP)

Oligarcas e ditadores entendem-se. Evolução da “elite de poder” nasceu na União Soviética, até chegar aos “amigos de Putin”, que talvez nem sejam assim tão amigos

Platão e Aristóteles, na Grécia antiga, definiram o que entendiam por oligarquia. Para o primeiro tratava-se de um regime que tem como base a qualificação da propriedade, isto é, o “rico detém o poder” que está vedado aos pobres.

Aristóteles não divergiu muito desta ideia, de que se trata de um sistema cujo poder tem como base a riqueza, mas avançou que os detentores do poder devem ser poucos “em número”, para que consigam manter o controlo do Estado.

Tratando-se de um grupo, ele pressupõe a existência de uma coligação, ou mais, para defender os seus próprios interesses e fazer avançar as suas propostas.

A oligarquia russa mergulha as suas raízes na época soviética, quando, após a morte de Estaline, surge uma liderança coletiva, estruturada numa hierarquia rígida em redor dos órgãos dirigentes do Partido Comunista da URSS. Cada setor chave da economia, então dominada pela política, foi organizado como uma estrutura de pressão cujos conflitos eram solucionados, em última análise, pelo Politburo, a mais alta autoridade no partido e no país. Mas para se conseguir uma posição favorável do Politburo era necessário pertencer-se à nomenclatura. Temos, assim, um pequeno grupo a tomar as decisões para toda a sociedade e país.

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Este sistema, pesadamente burocrático, vai cansando e exaurindo a sociedade, situação que perto do final do Século XX é óbvia para Mikhail Gorbachev e para os políticos da sua geração. Daí que, quando sobe ao poder, ele procure avançar com reformas que libertassem a sociedade e a tornassem competitiva. Gorbachev deseja ainda que essa competição também se faça a nível político, mas o resultado não será o que o líder soviético desejava. E ao minar a autoridade legítima do partido, lesou a sua capacidade para gerir os conflitos entre as formações rivais da elite.

Mas não foi Gorbachev quem anulou a oligarquia soviética, esse golpe de misericórdia foi dado por Boris Ieltsin, ao dissolver o Partido Comunista da URSS após o golpe de agosto de 1991. Ao fazê-lo, eliminou o âmago da estrutura oligárquica e reordenou a hierarquia económica, retirando importância e peso ao setor militar-industrial.

Ieltsin decidiu transformar a economia socialista russa em economia de mercado e fê-lo com programas de privatização e liberalização económica, numa autêntica terapia de choque. O seu opositor Alexander Rutskoi insurgiu-se contra a forma como Ieltsin estava a conduzir o processo reformador, indo ao ponto de o classificar de “genocídio económico”.

É com as reformas de Ieltsin que surge a nova oligarquia. Agora já não é o partido, nem é o Politburo quem irá deter o poder, mas sim um grupo restrito de pessoas que vão aproveitar da situação para se apoderar de grande parcela da riqueza nacional.

Essas pessoas constituem a nova oligarquia russa. Tornam-se milionárias através de situações pouco claras. Aliás, a época de Ieltsin é marcada por uma corrupção generalizada, inflação, colapso económico e profundos problemas sócio-políticos.

Vladimir Putin, que sucede a Ieltsin, ao ser inquirido sobre como tencionava lidar com os oligarcas russos, respondeu que não existiam oligarcas na Rússia. uO ex-homem forte do KGB sabia que não estava a ser verdadeiro, porque os oligarcas existiam e existem; o que ele pretendeu foi passar a mensagem de que era ele quem detinha o poder e quem quer que lhe fizesse sombra ou se lhe opusesse teria a sorte de Mikhail Khodorkovski.

Oligarca do tempo de Ieltsin, Khodorkovski tirou partido das reformas de Ieltsin e tornou-se um dos mais poderosos dos oligarcas russos, uma situação desagradável para Putin, que procurava refrear a apetência de poder do novo grupo. Proprietário da empresa petrolífera Yukos e das suas subsidárias, Khodorkovski tornou-se uma pedra no sapato de Putin, que não aceitou a ideia de poder ser desafiado por ele nas urnas, como muitos afirmavam.

Em 2003, o jovem oligarca vê-se confrontado com a cobrança pela justiça de todos os impostos atrasados e sonegados da Yukos que Putin nacionaliza, ao mesmo tempo que Khodorkovski é julgado e condenado a nove anos de prisão por roubo, fraude e sonegação fiscal. A mensagem estava dada e os oligarcas entenderam-na. Putin tinha vencido o grupo dos milionários, muitos dos quais pontuam no seu círculo de amigos.

São esses que agora estão sob pressão das sanções do Ocidente. Foi isso que prometeu o presidente dos Estados Unidos na semana passada: “Aos oligarcas russos e líderes corruptos que ganharam milhares de milhões de dólares com este regime violento: basta! (…) Em conjunto com os aliados europeus, vamos encontrar e apreender os iates, apartamentos de luxo e jatos privados. Vamos atrás das vossas fortunas de origem duvidosa."

 

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