As declarações de Boris Johnson surpreenderam os líderes de vários países europeus, não só porque a Ucrânia formalizou o pedido de adesão à União Europeia no mês passado, na sequência da invasão, mas também porque compara a luta pela sobrevivência de um país com a escolha dos britânicos.
Boris Johnson está a ser alvo de várias críticas por parte de líderes políticos europeus e britânicos depois de comparar a luta dos ucranianos na defesa do seu país à decisão do Reino Unido de sair da União Europeia (UE).
No discurso de encerramento do Congresso do Partido Conservador, que decorreu este sábado em Blackpool, o primeiro-ministro britânico começou por salientar que uma vitória da Rússia na Ucrânia "significará o início de uma nova era da intimidação por toda a Europa de Leste", pelo que o mundo está a enfrentar agora um momento em que tem de escolher "entre a liberdade e a opressão".
"Sei que há algumas pessoas no mundo, até em alguns governos ocidentais, que invocam aquilo a que chamam 'real politik' e que dizem que seria melhor chegarmos a acordo com a tirania", acrescentou.
"Eu sei que o instinto das pessoas deste país [Reino Unido], tal como o dos ucranianos, é escolher a liberdade, sempre", disse, e deu "um exemplo recente" disso mesmo – o Brexit: "Quando os britânicos votaram a favor do Brexit, em grande escala, não acredito que o fizeram porque eram minimamente hostis em relação aos estrangeiros. Mas porque quiseram ser livres para fazer as coisas de forma diferente e para que este país se possa gerir a si próprio."
As declarações de Boris Johnson surpreenderam os líderes de vários países europeus, não só porque a Ucrânia formalizou o pedido de adesão à UE no mês passado, na sequência da invasão russa, mas também porque sugeriam que o Reino Unido saiu do bloco europeu para escapar à sua "tirania".
O antigo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, classificou as palavras de Boris Johnson como uma ofensa para o povo ucraniano: "Boris Johnson compara a luta dos ucranianos ao voto do povo britânico pelo Brexit. Ainda me lembro do entusiasmo de Putin e Trump após o referendo. Boris, as suas palavras ofendem os ucranianos, os britânicos e o bom senso.”
Boris Johnson likens Ukrainians’ fight to British people voting for Brexit. I can still remember the enthusiasm of Putin and Trump after the referendum. Boris, your words offend Ukrainians, the British and common sense.
— Donald Tusk (@donaldtuskEPP) March 19, 2022
Também Guy Verhofstadt, ex-primeiro-ministro da Bélgica que representou o Parlamento Europeu nas negociações do Brexit, descreveu a comparação da "luta corajosa da Ucrânia" com o processo da saída do Reino Unido da UE como "insana".
"O Brexit foi sobre desfazer liberdades e deixar a UE. Os ucranianos querem mais liberdade e desejam aderir à UE", frisou, numa publicação no Twitter.
Johnson's comparaison of the courageous fight of Ukraine with Brexit is insane…
Brexit was about undoing freedoms and leaving the EU…Ukrainians want more freedom and to join the EU! https://t.co/DOtaNTpiWN
— Guy Verhofstadt (@guyverhofstadt) March 19, 2022
Os conservadores britânicos também manifestaram o seu desagrado para com as declarações de Boris Johnson. Gavin Barwell, um ex-deputado conservador, sublinhou que o voto no Brexit "não é comparável" à luta pela sobrevivência e pela defesa de um país contra uma invasão. Barwell disse ainda que esta comparação é "embaraçosa", lembrando que "os ucranianos estão a lutar pela sua liberdade para aderirem à UE", lembrando o pedido de Zelensky para se juntar aos 27.
Apart from the bit where voting in a free and fair referendum isn't in any way comparable with risking your life to defend your country against invasion + the awkward fact the Ukrainians are fighting for the freedom to join the EU, this comparison is bang on https://t.co/j6qhtNvFYO
— Gavin Barwell (@GavinBarwell) March 19, 2022
Boris pede à China que condene a invasão russa
Depois de um sábado marcado por um discurso duramente criticado, Boris Johnson deu este domingo uma entrevista ao The Sunday Times na qual deixou um apelo à China, aliada estratégica de Moscovo, para se juntar aos países ocidentais na condenação à invasão russa.
“À medida que o tempo passa e o número de atrocidades russas aumenta acho que se torna cada vez mais difícil e politicamente inconveniente para as pessoas, ativa ou passivamente, tolerar a invasão de Putin", disse o líder britânico.
O chefe do executivo britânico considerou que os países que não querem decidir em que lado se posicionam neste conflito, estão confrontados com "dilemas consideráveis".
"Acho que em Pequim começam a surgir dúvidas", acrescentou.