"Todos os homens com 16 anos ou mais levantem as mãos": o que se sabe e nem por isso sobre o que as tropas israelitas fizerem dentro do al-Shifa

16 nov 2023, 10:44
Imagem divulgada pelas forças israelitas dos militares dentro do complexo do Hospital al-Shifa (Foto: IDF)

Israelitas começaram na madrugada de quarta-feira uma operação dentro do hospital de Gaza onde garantem que o Hamas operava um centro de comando. No ocidente, há quem tenha ficado "chocado" e há quem assegure - com bases nos serviços de informação - que o Hamas operava mesmo neste hospital

Sem água, eletricidade e quase nenhuma comida. Era assim que já se encontrava o Hospital al-Shifa antes da operação das Forças de Defesa de Israel, as quais, ao longo de cinco dias, foram cercando o complexo hospitalar, alegando que ali se localizava um centro de comando do Hamas. 

Pelas três da manhã de quarta-feira, os israelitas entraram no hospital. Segundo testemunhas citadas pela Reuters, os tanques ficaram estacionados à entrada dos serviços de urgência. O diretor dos hospitais de Gaza, Mohammed Zaqout, revelou que os soldados israelitas entraram pelos serviços de urgência e pelo edifício de cirurgia, onde também se encontram as unidades de cuidados intensivos. 

À CNN Internacional, um médico do al-Shifa revelou que lhes foi dado um aviso de 30 minutos antes de Israel começar a sua operação. "Foi-nos pedido para ficarmos afastados das janelas e varandas", explicou. "Conseguimos ouvir os veículos blindados muito perto da entrada."

Testemunhas citadas pela BBC e AFP contam que as forças de Israel usaram altifalantes para ordenarem a todos os homens, entre os 16 e os 40 anos, que saíssem dos edifícios do hospital - exceto da urgência e da ala cirúrgica - e se dirigissem ao pátio. "Todos os homens com 16 anos ou mais levantem as mãos", gritava um soldado em língua árabe. "Saiam do edifício para o pátio e rendam-se", ouvia-se nos altifalantes, segundo um jornalista da AFP. Ao todo, cerca de 1.000 palestinianos dirigiram-se ao pátio; alguns foram despidos e inspecionados em busca de armas ou explosivos.

A operação "precisa e direcionada" - assim anunciada por Israel no complexo hospitalar de al-Shifa - continuou ao longo do dia. Os detalhes são escassos, até porque, lembra o Guardian, a falta de combustível provocou um apagão nas telecomunicações na Faixa de Gaza e tornou-se difícil contactar por telefone as pessoas que continuavam dentro do hospital. 

Ao final da tarde de quarta-feira, Munir al-Boursh, médico do al-Shifa que também é subscretário do Ministério da Saúde palestiniano, disse à Al Jazeera que as tropas israelitas ainda estavam no hospital. "Ainda estão aqui... doentes, mulheres e crianças estão aterrorizados", garantiu, acrescentando que os profissionais de saúde tinham prometido ficar com os seus pacientes "até ao fim". Muitos dos que tentaram sair nos dias que antecederam a operação viram-se de imediato no meio de disparos no exterior do complexo - a maioria optou por voltar para trás e ficar.

"Só trouxeram terror e morte"

Um porta-voz do Ministério da Saúde de Gaza - controlado pelo Hamas - disse à Al Jazeera que só médicos, doentes e pessoas deslocadas estavam no hospital quando os israelitas entraram pelos serviços de urgência. "Não temos nada que temer ou esconder", garantiu Ashraf al-Qudra. 

As forças israelitas admitiram ter matado militantes do Hamas em combates fora da unidade de saúde, assegurando também que, logo que entraram no complexo, não houve mais atritos. Divulgaram vídeos e fotografias de soldados a transportar incubadoras e caixas etiquetadas onde se lia "equipamentos médicos" ou "comida de bebé". Ao final da manhã, hora de Portugal Continental, as IDF garantiram que os seus soldados tinham encontrado "armas e infraestruturas terroristas" no al-Shifa, bem como "provas concretas de que os terroristas do Hamas usaram o hospital como sede das atividades terroristas". Prometeram para breve a divulgação destas provas. 

Mas Omar Zaqout, que trabalha no serviço de urgência do al-Shifa, garantiu à Al Jazeera que os soldados israelitas tinham agredido alguns homens que estavam refugiados no hospital. "Não trouxeram ajuda ou equipamentos, só trouxeram terror e morte", declarou. 

Na quarta-feira, o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde foi um dos que, publicamente, manifestaram preocupação com o desenrolar dos acontecimentos dentro do hospital de Gaza, admitindo que tinha sido perdido contacto com os profissionais de saúde. Os médicos do al-Shifa, aliás, sempre negaram - tal como o Hamas - que ali houvesse qualquer centro de comando dos militantes. 

Já esta quinta-feira, a Al Jazeera garante que Israel voltou a avançar dentro do complexo hospitalar, com tanques e escavadoras. A estação garante ainda que, segundo os correspondentes locais, um edifício do al-Shifa onde se realizavam cirurgias foi destruído e que um armazém de medicamentos e equipamento médico foi rebentado com recurso a explosivos. 

Há ainda relatos de cerca de 200 pessoas terem sido vendadas, interrogadas e levadas para locais desconhecidos - tudo enquanto a aviação israelita conduzia ataques em torno do hospital, dando cobertura aos soldados que ali se encontravam. 

Fonte do Hamas veio ainda na quarta-feira garantir que as alegações de Israel são uma "continuação das mentiras e propaganda barata através da qual continua a tentar justificar o seu crime", destruindo o sector da saúde de Gaza. Em comunicado divulgado no mesmo dia, o Hamas admitiu que o al-Shifa está agora sob controlo israelita. "Responsabilizamos a ocupação israelita pelas vidas e segurança dos profissionais de saúde, dos feridos, doentes, crianças prematuras e deslocados", lê-se na declaração, citada pela CNN Internacional.

A operação israelita provocou reações acesas da comunidade internacional, mesmo que o presidente norte-americano tenha vindo garantir que está convicto de que o Hamas tinha um centro de comando nos túneis sob o complexo do al-Shifa. 

Martin Griffiths, subsecretário-geral da ONU para os Assuntos Humanitários, revelou-se "chocado" com a operação israelita, defendendo que a proteção de recém-nascidos, doentes, profissionais de saúde ou civis tem de sobrepor-se a todas as outras preocupações.

 

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