Bombardeamento de hospital ucraniano aumenta a pressão sobre os aliados para que façam mais para parar a Rússia

CNN , Maeve Reston
11 mar 2022, 23:00

Está a aumentar a pressão sobre a administração Biden e os seus aliados europeus para que mostrem que estão a fazer o suficiente para pôr termo às atrocidades que estão a ser infligidas ao povo ucraniano, numa altura em que surgiram novas imagens horrendas na quarta-feira de um alegado bombardeamento russo de uma maternidade e de um hospital pediátrico em Mariupol.

As fotografias de mulheres grávidas a saírem do hospital devastado por bombas com a roupa manchada de sangue são o tipo de imagens certamente capazes de agitar a consciência de pessoas de todo o mundo, que observam os seus líderes numa tentativa de responderem à crescente campanha do presidente russo Vladimir Putin, que tem vindo a originar cada vez mais vítimas civis.

As imagens dos quartos de hospital de Mariupol, com os seus fraldários cor-de-rosa cobertos de vidro e destroços de janelas rebentadas, sublinham a brutalidade insensível da invasão. Pelo menos 17 pessoas ficaram feridas, de acordo com informações provisórias da polícia na região de Donetsk, e o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, que designou o bombardeamento como a “prova de um genocídio”, disse que as autoridades continuam a procurar vítimas entre os escombros.

O incidente deu origem a uma impressionante posição ambígua na quarta-feira, com a postura defensiva das autoridades dos EUA, que procuraram destacar todas as medidas que têm tomado para tentar desacelerar o ataque russo ao mesmo tempo que traçavam uma nova linha vermelha, anunciando que não poderiam ajudar a Polónia na sua proposta de enviar caças da era soviética para a Ucrânia. Alegaram que a perspetiva de um eventual envio de jatos para a Ucrânia através de uma base da Força Aérea dos EUA na Alemanha implicava um enorme risco de escalada do conflito.

Mas a análise clínica das avaliações de risco a partir de púlpitos em salas de imprensa não têm muitas vezes contido o mesmo peso emocional que os intensos apelos de Zelensky por mais assistência para proteger os civis em situação vulnerável no seu país. O ataque ao hospital na cidade cercada de Mariupol aconteceu a despeito da concordância da Rússia com um cessar-fogo de 12 horas destinado a retirar refugiados de certas cidades e vilas por toda a Ucrânia. E levou Zelensky a lançar outro apelo acirrado por uma zona de exclusão aérea, a qual tem sido até agora recusada pelos aliados da NATO, com receio de que tal possa levá-los a um confronto direto com a Rússia.

“Há pessoas, crianças debaixo dos escombros. Atrocidade!” Zelensky disse na sua conta do Telegram após o ataque de quarta-feira, questionando se os aliados estavam a “perder” a sua humanidade. “Durante mais quanto tempo irá o mundo ignorar o terror e ser cúmplice?”

“Temos de encorajar alguns líderes ocidentais para que possam finalmente fazer o que deveriam ter feito no primeiro dia de invasão”, disse numa mensagem de vídeo publicada posteriormente no Telegram. “Fechem o espaço aéreo ucraniano a mísseis e bombas russas ou deem-nos aviões militares para que possamos lidar com tudo isto sozinhos.” Um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo acusou a Ucrânia de ter estabelecido posições de combate no hospital, uma alegação que a CNN não foi capaz de confirmar.

“Quem somos nós enquanto país?”

Aquilo que as nações democráticas do mundo estão dispostas a fazer perante o aumento de vítimas ucranianas e os milhões de refugiados que fogem do país é a questão mais desconcertante com que se deparam neste momento os EUA e os seus aliados.

Numa série de declarações na quarta-feira, as autoridades dos EUA, incluindo o secretário de Estado Antony Blinken, a assessora de imprensa da Casa Branca Jen Psaki e o porta-voz do Pentágono John Kirby, insistiram que os EUA e os aliados estão a fazer tudo ao seu alcance para ajudar os ucranianos ao nível da defesa - sem adotar medidas provocadoras que possam dar azo a uma guerra mais alargada com a Rússia.

Mas têm começado a surgir algumas fissuras na fachada de união que os EUA têm tentado apresentar. O deputado democrata Mike Quigley, do Illinois, copresidente da Comissão para a Ucrânia do Congresso, questionou veementemente porque é que os aliados permanecem tão obcecados com o facto de a Ucrânia não ser membro da NATO, argumentando que “a luta do povo ucraniano e o espírito ucraniano são exatamente as razões pelas quais a NATO foi fundada.”

“Podemos perder tempo a debater se realmente importa se um avião descola da Polónia ou da Alemanha, mas chegará uma altura em que teremos de nos perguntar: quem somos nós enquanto país? Porque é que formámos a NATO? E vamos permitir que isto aconteça?” disse Quigley a Kate Bolduan no programa “At This Hour” da CNN na quarta-feira. “Se alguém pensa que isto vai melhorar em breve -- isto vai ser um longo inferno na Terra.”

A crescente pressão sobre os EUA e os seus aliados da NATO para que façam mais ficou evidenciada pela rejeição por parte dos EUA do plano da Polónia de enviar os caças que Zelensky havia pedido para a Ucrânia. As autoridades norte-americanas foram apanhadas desprevenidas pelo anúncio feito pela Polónia na terça-feira de que estava pronta para enviar os jatos através da Base Aérea de Ramstein, uma posição que pôs a nu uma potencial clivagem entre os aliados da NATO, precisamente na altura em que a vice-presidente Kamala Harris se preparava para viajar para a Polónia.

Kirby explicou que os serviços de informação acreditam que se os EUA assumirem um papel de intermediário isso pode ser encarado por Putin como um “aumento da escalada”. Sublinhou ainda que os EUA acreditam que a melhor forma de apoiar a Ucrânia é através do fornecimento das armas e dos sistemas “de que mais precisam para derrotar a ofensiva russa” e observou que a força aérea ucraniana ainda tem “vários esquadrões de aeronaves totalmente capazes de cumprir missões”.

“É preciso termos cuidado com todas as decisões que tomamos, para que não estejamos a aumentar o potencial para uma escalada”, disse Kirby aos repórteres durante a conferência de imprensa do Pentágono de quarta-feira. Acrescentou que uma nova escalada poderia complicar a vida do povo ucraniano, uma vez que existe o potencial para que “uma guerra destrutiva e terrível” possa ficar “ainda mais destrutiva e terrível, atendendo ao facto de o Sr. Putin ter outros recursos à sua disposição.”

"O nosso objetivo é acabar com a guerra, não expandi-la."

Blinken, que tinha apoiado a ideia de fornecer jatos da era soviética à Ucrânia no início desta semana, expressou uma opinião semelhante no início do dia durante uma conferência de imprensa conjunta com a Ministra dos Negócios Estrangeiros britânica Elizabeth Truss, durante a qual Truss afirmou que o Reino Unido planeia ajudar a Ucrânia a proteger o seu espaço aéreo através do envio de “armas antiaéreas”.

Quando Blinken e Truss foram pressionados a responder aos persistentes apelos de Zelensky para a criação de uma zona de exclusão aérea, Blinken sublinhou que “ambos os nossos países, e tantos outros, têm feito coisas extraordinárias para garantir que os ucranianos têm à sua disposição os meios para se defenderem de forma eficaz contra esta guerra escolhida pela Rússia”.

Para evitar um maior “derramamento de sangue incessante e sem sentido”, Blinken disse: “o nosso objetivo é acabar com a guerra, não expandi-la”.

Reconheceu que, apesar das “possíveis saídas” que os EUA e os aliados ofereceram a Putin, este escolheu “carregar no acelerador e continuar por este caminho horrível”. Mas Blinken disse que estava confiante de que as “sanções devastadoras” e as pressões que os EUA e os seus aliados têm colocado sobre a Rússia, em conjunto com a coragem e a resiliência do povo ucraniano, irão levar a “uma derrota estratégica” de Putin, independentemente de algumas vitórias táticas no curto prazo.

“Economicamente, as medidas que temos tomado têm eliminado os 30 anos de progresso na integração da Rússia no mundo”, acrescentou Blinken. “Este êxodo dramático de praticamente todas as empresas internacionais da Rússia continua - e isso está a ter um impacto profundo não apenas no presente como também no longo prazo. Por isso, a questão é perceber se o Presidente Putin irá finalmente procurar ou não minimizar as perdas que infligiu a si próprio e ao povo russo. Não podemos decidir isso por ele. Tudo o que podemos fazer é continuar este esforço extraordinário para aumentar a pressão sobre ele.”

A Casa Branca avisou na quarta-feira que a Rússia poderia vir a usar armas químicas na Ucrânia. Psaki, desmentindo aquilo a que chamou de falsas alegações por parte da Rússia de que os EUA estariam a desenvolver armas químicas na Ucrânia, alertou no Twitter que “devemos estar todos atentos para a possibilidade de a Rússia usar armas químicas ou biológicas na Ucrânia, ou criar uma operação de bandeira falsa para usá-las”.

À medida que o debate continua sobre se as pressões são suficientes para deter Putin, o Pentágono está a enviar milhares de tropas adicionais para a Europa, ao mesmo tempo que envia armas defensivas para a Polónia, como mísseis Patriot, para combater qualquer ameaça potencial aos aliados dos EUA e da NATO.

Até ao momento, os EUA e outros membros da NATO já forneceram à Ucrânia 17 000 mísseis antitanque e 2000 mísseis antiaéreos Stinger, de acordo com um alto quadro do governo dos EUA.

E a Câmara dos Representantes dos EUA aprovou na noite de quarta-feira uma avultada lei de financiamento público que inclui 13,6 mil milhões de dólares em ajudas urgentemente necessárias para a Ucrânia. A presidente da Câmara, Nancy Pelosi, que teve uma conversa telefónica de 45 minutos com Zelensky na quarta-feira, disse que tinham falado sobre o ataque à maternidade, assim como do pedido de aviões de combate que os pilotos ucranianos consigam pilotar.

Mas também ela rejeitou o apelo para uma zona de exclusão aérea: “Eles sabem que não podemos fazer isso. Putin está a tentar montar uma armadilha para que nós entremos no conflito, e isso é o começo, poderá ser o começo, da Terceira Guerra Mundial.”

Mundo

Mais Mundo

Mais Lidas

Patrocinados