Detinho (Leixões): «Se o Jardel marcar um, eu faço dois»

22 fev 2002, 14:16

Chamam-lhe Detigol Chamam-lhe Detigol. Para já, «torce» pelo Sporting, pensa na UEFA e quer agarrar a Taça no Jamor.

Começou tudo em Florença, faz algum tempo, com um certo argentino, que ainda hoje, já em Roma, responde pelo nome de Batigol. «É um carinho que me fazem», meneava a cabeça, encantado. Detinho, um brasileiro enorme e corcovado, com um fino bigode à galã, aparado a régua e esquadro, não podia evitar a risada no cerco dos adeptos, que, na ponta dos pés, se esticavam para lhe tocar os ombros. Chamavam-lhe Detigol. Embaraçado, o gigante limitava-se a sorrir.

A alcunha, num género adaptado, talvez excessivo, prolongava o sorriso e lembrava-lhe o instante em que decompôs a defesa do Braga. «Foi uma felicidade medonha», contou, enquanto esfregava os braços para minimizar o efeito pele-de-galinha. O remate, depois da sequência de dribles, dizia-lhe que o Jamor era mesmo ali, junto à vedação do 1º de Maio. «Matei-os naquele instante», recordou. «Quando uma equipa tenta desesperadamente chegar ao empate e toma o 3-1, desiste. Percebe que nada mais resta para fazer».

Sem esforço, incapaz de subtrair emoções ao discurso, Detinho recuperava todas as fracções de segundo do lance que lhe bailava persistentemente na cabeça. Sempre com a mesma precisão. «No momento em que matei no peito, tive a calma de fazer tudo certo, de tirar toda aquela gente da frente». Podia distinguir aquele momento como um dos mais felizes que já viveu, detectando o mais triste num retrocesso simples de poucos meses. «Descer à II Liga com o Campomaiorense foi muito duro. Ainda custa a acreditar». Quase tanto como a certeza de ir ao Jamor, que o mantinha suavemente nas nuvens.

A torcer pelo Sporting

Detinho queria voltar a pisar o chão, que parecia não sentir sob aqueles pés enormes. Numa tentativa falhada, falava no Freamunde, adversário de terça-feira e da modesta II Divisão B, em que procurava concentrar-se. «Temos de subir à II Liga. Isso é bem mais importante». Aplicava-se, tentava crer piamente em tudo quanto dizia, mas o Jamor intrometia-se, sem aviso, entre ideias e pensamentos.

O discurso voltava a ziguezaguear, driblava a teoria. Detinho, dispensando a pergunta, dispunha-se a «trazer a Taça para Matosinhos». Na verdade, a cabeça ia já bem longe, na UEFA. «Vamos torcer para que o Sporting seja campeão», juntou, outra vez com aquele enorme sorriso a avalizar o sonho. Não precisava de tanto, contudo. Bastava-lhe esperar que o adversário da final seja um dos dois primeiros no campeonato. Em alternativa, chega-lhe vencer o Sporting.

Aproveitando a sugestão do coro dos adeptos, o jornalista compôs um cenário provocador, reduzindo o jogo a um duelo, com o pontapé como arma: Jardigol contra Detigol. «Como é que é?», quase gritou. O desafio parecia-lhe desonesto, quase indecendente, mas aceitaria a proposta em segundos, sem pedir aos deuses uma tarde desgraçada para o compatriota, a quem desenha a vénia devida. «Ele pode até marcar um golo, mas eu faço dois», gargalhou, ao desafio.

Problema resolvido. Leviana e apressadamente, mesmo porque o autocarro, estacionado em frente à Câmara Municipal de Matosinhos, reclamava apenas a presença do ponta-de-lança, para encerrar o segundo capítulo de euforia, com prolongamento marcado em território «inimigo», num restaurante de Leça da Palmeira. Antes, contudo, a caneta do Maisfutebol serviu ainda para o desenho de mais uma dezena de autógrafos. Afinal, tratava-se de Detigol.

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