Após anos a cuidar de pacientes cirúrgicos num hospital no Canadá, uma enfermeira veterana abandonou a profissão para iniciar uma nova e exigente carreira como camionista de longo curso
Leah Gorham, de 42 anos, disse que adorava ser enfermeira, mas as frustrações relativas a constantes faltas de pessoal – que ela diz terem começado antes da pandemia da covid-19 – e à falta de progressão na carreira levaram-na a procurar novas oportunidades.
O namorado, que também é camionista e proprietário-operador independente, sugeriu que ela poderia gostar da vida na estrada.
“Eu ia ficar desiludida com a minha carreira da forma como estava, e o facto de não conseguir progredir estava a deixar-me louca”, disse Gorham à CNN. “Então, precisava de fazer outra coisa.”
A mudança de carreira aconteceu numa altura em que a indústria do transporte de carga tem dificuldade em preencher um grande número de vagas para ajudar a apoiar a cadeia de fornecimento. Em outubro, a American Trucking Associations disse que a indústria precisava de 80 mil condutores, o que é um recorde.
Em outubro, Gorham inscreveu-se numa formação de condução de camiões de 12 semanas. Gastou quase 8 mil dólares (7 mil euros) para ter a licença.
Agora, ela e o namorado conduzem juntos.
“Um dia, vamos acabar por trocar, eu vou dormir quando ele conduz, mas agora, enquanto ainda estou em formação, é como se fôssemos um super-condutor independente”, diz.
Gorham falou à CNN no dia 19, numa paragem para camiões em Tom Brooks, Virginia, onde o casal tinha parado a caminho da Carolina do Sul. No dia 21, foram para norte, levando uma carga de pneus para o Quebec e depois dirigem-se rapidamente para o Indiana.
Antes de começar a conduzir, Gorham não tinha viajado muito, nem tinha saído muitas vezes da província de New Brunswick nos últimos 20 anos. Agora, pode conhecer parte dos EUA e do Canadá dentro da cabine do camião.
A vontade de ser enfermeira foi-lhe passada pelos profissionais de saúde que cuidaram do seu pai, que morreu com cancro no pâncreas aos 40 anos.
“Foi assim que começou, e adorei. E durante muito tempo não conseguia imaginar-me a fazer outra coisa.”
Gorham trabalhou no Hospital St. John em New Brunswick durante quase 16 anos em neurocirurgia e depois em cirurgia geral. Candidatou-se para voltar à faculdade e fazer a licenciatura, mas foi sempre rejeitada.
Gorham disse que tinha chegado ao limite máximo na progressão da carreira sem aumentar as suas habilitações.
O Governo de New Brunswick tem tentado aumentar o número de vagas na faculdade de enfermagem na província e um relatório de 2019 do Ministério da Saúde previa uma falta de 130 enfermeiros por ano durante os próximos 10 anos – e isso foi antes das pressões causadas pela pandemia da covid-19.
“Este problema com os enfermeiros sempre existiu desde que sou enfermeira”, disse Gorham. “A pandemia só veio mostrar a verdadeira gravidade da situação.”
O sindicato de enfermeiros de New Brunswick disse à CBC, parceira da CNN, que a província tem mil vagas de enfermagem, entre lares e autoridades regionais de saúde.
O sindicato disse à CBC que também há falta de cerca de 300 enfermeiros licenciados.
O Diretor-geral da Autoridade de Saúde Pública do Canadá, a Dr. Theresa Tam, disse no dia 21 que as infeções com a variante Ómicron podem ter atingido o pico no país.
"No entanto, os números diários no hospital e nos Cuidados Intensivos continuam a aumentar e muitos hospitais no Canadá estão sob grande pressão”, disse Tam.
Gorham disse que a falta de pessoal dificultava a vida de todos e “não havia um fim à vista”.
Mas Gorham sente saudades de ser enfermeira e das pessoas com que trabalhou e tem imenso respeito pelo grande trabalho que fazem. Manteve a licença - sem remuneração - para um dia poder voltar à enfermagem.
“Assim, tenho tempo para ver se quero voltar casualmente ou algo do género, só para manter a licença, porque é algo que realmente adoro fazer”, diz.
Mas, por enquanto, é muito feliz ao volante.
Gorham ainda só recebeu um mês de salário, mas diz que é mais do que recebia no antigo emprego.
“Aquilo que nos interessa é ter liberdade e não trabalhar ao máximo das nossas capacidades e ainda viver”, disse. “É uma espécie de equilíbrio. Não temos de ser ricos a fazer isto.”
Gorham disse que conduzir é mais tranquilo do que aquela vida frenética e contínua do hospital, mas manobrar um veículo tão grande e com 13 mudanças apresenta novos desafios.
“Não tem nada a ver com o meu carro”, disse. “Há muitos perigos envolvidos. Apercebo-me de que muitas pessoas não sabem como isto é difícil.”