A guerra da energia: Rússia ameaça cortar o gás à Europa e avisa para explosão dos preços

8 mar 2022, 03:25

EUA prepara boicote aos combustíveis russos, Europa promete reduzir dependência. Em retaliação, Moscovo ameaça cortar fornecimento de gás natural e acena com aumento dos preços que pode chegar aos 300 dólares por barril de crude

Conforme a UE e os EUA discutem a possibilidade de proibir (no caso americano) ou reduzir (no caso europeu) as importações de petróleo e gás da Rússia, Moscovo ameaça com retaliações, e alerta para a provável explosão dos preços dos combustíveis.

"É absolutamente claro que uma rejeição do petróleo russo teria consequências catastróficas para o mercado global", disse o vice-primeiro-ministro russo, Alexander Novak, numa declaração na televisão estatal. "O aumento dos preços seria imprevisível. Seria de 300 dólares por barril, se não mais", acrescentou, citado pela agência Reuters.

Para além de acenar com preços incomportáveis que penalizariam os consumidores e as economias globais caso fosse decidido um boicote à energia russa, o responsável do Kremlin acrescentou a ameaça de encerramento do principal gasoduto Rússia-Alemanha.

Os preços do petróleo dispararam nesta segunda-feira para os níveis mais elevados desde 2008, depois do Secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, ter dito que Washington e os aliados europeus estão a considerar proibir as importações de petróleo russo.

A resposta do Kremlin é de desafio. "Os políticos europeus precisam de avisar honestamente os seus cidadãos e consumidores do que devem esperar", disse Novak. "Se quiserem rejeitar o fornecimento de energia da Rússia, vão em frente. Estamos prontos para isso. Sabemos para onde podemos redirecionar a produção". Recorde-se que a China, um dos maiores consumidores globais de energia, e um grande importador de petróleo, já se disponibilizou para aumentar as compras à Rússia.

 

Ameaça de fechar a torneira do gás

 

Segundo o governante russo, a Rússia fornece 40% do gás da Europa, e a UE levaria mais de um ano a substituir o volume de petróleo que recebe atualmente da Rússia. E, entretanto teria de pagar preços muito mais elevados. Com uma agravante: segundo Novak, no atual contexto a Rússia vê-se com o direito de retaliar contra a União Europeia após a Alemanha ter congelado no mês passado a certificação do gasoduto Nord Stream 2.

"Em ligação com ... a imposição de uma proibição ao gasoduto Nord Stream 2, temos todo o direito de tomar uma decisão correspondente e impor um embargo ao bombeamento de gás através do gasoduto Nord Stream 1", disse Novak. "Até agora, não estamos a tomar tal decisão. Mas os políticos europeus, com as suas declarações e acusações contra a Rússia, empurram-nos nesse sentido".

 

EUA preparam proibição de importações…

 

A Administração norte-americana está a ponderar os prós e contras de um boicote ao petróleo russo, ao mesmo tempo que está em conversações com a UE no mesmo sentido. Entretanto, no Congresso, democratas e republicanos estão de acordo para aprovar uma lei que proíba a importação de petróleo russo. As iniciativas legislativas bipartidárias também deverão atingir todas as restantes importações de produtos da Rússia e da Bielorrússia. Segundo os legisladores dos dois partidos citados pela comunicação social norte-americana, as proibições em questão deverão ser aprovadas já esta semana.

Biden tem evitado dar este passo com receio do seu impacto  sobre o preço dos combustíveis para os consumidores norte-americanos, e as consequências no aumento generalizado da inflação. O facto de os Estados Unidos importarem apenas 7% do seu petróleo da Rússia, facilita a decisão, e a líder da maioria democrata na Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, já admitiu a aprovação de legislação impedido a importação de petróleo russo. 

Perante as dificuldades da UE, que é muito mais dependente da energia russa, os Estados Unidos mostram-se dispostos a avançar para o boicote mesmo sem os aliados europeus. A Alemanha e a Hungria têm sido, na UE, os principais opositores de sanções à Rússia no plano da energia.

 

…e UE faz plano para diminuir dependência

 

Na Europa, a dependência do gás e petróleo russos torna a proibição imediata uma impossibilidade. Atualmente, a UE compra à Rússia 45% do seu gás importado, cerca de um terço do seu petróleo e quase metade do seu carvão. 

Segundo dados da Reuters, cerca de metade das exportações de petróleo da Rússia são para a Europa, destacando-se a Alemanha (11%) e a Holanda (11%) entre os grandes consumidores europeus de petróleo russo. Mas o principal país cliente do petróleo russo é a China, que recebe 31% do que a Rússia exporta. No gás, o cenário de dependência europeia é ainda mais acentuado: cerca de 62% das exportações russas de gás vão para a Europa, destacando-se a Alemanha (maior consumidor individual, recebendo 18% do total de gás exportado pela Rússia) e a França (9%). A China recebe apenas 5% das exportações russas de gás natural.

O caminho da UE, para já, é reduzir a dependência da energia russa. Esta semana, os líderes dos 27 deverão assinar um acordo para eliminar gradualmente a dependência da União em relação ao gás, petróleo e carvão russos. 

Os líderes da UE vão reunir-se em Versalhes na quinta e sexta-feira, e está sobre a mesa um projecto de declaração que deverá marcar um ponto de viragem na dependência europeia em relação à energia russa. "Concordámos em eliminar gradualmente a nossa dependência das importações de gás, petróleo e carvão da Rússia", diz o projeto de declaração dos líderes, adiantado pela Reuters.

 

A dificuldade de substituir a energia russa

 

No início deste conflito, os EUA contactaram outros grandes produtores mundiais de gás - nomeadamente os Emirados Árabes Unidos - no sentido de desviarem para a Europa parte significativa da sua produção, como forma de compensar a eventual interrupção de fornecimentos russos de gás e petróleo. Mas o ministro da energia do Qatar - um dos maiores produtores de gás liquefeito do mundo - avisou desde logo que "o volume de gás de que a UE precisa não pode ser substituído unilateralmente por ninguém sem interromper o fornecimento a outras partes do mundo". Ou seja, neste contexto, "a segurança energética da Europa exige um esforço coletivo de muitas partes".

Para que a Europa receba um volume tão mais alto de gás líquido do Qatar, os principais clientes do leste asiático, como Japão e Coreia do Sul, teriam de concordar em adiar algumas das suas entregas.

O Japão, apesar de ser altamente dependente de importações de petróleo e gás natural,  já declarou que, se for necessário, poderá desviar para a Europa uma parte das suas encomendas, desde que isso não ponha em causa a segurança energética do país.

Os Estados Unidos também discutiram com a Austrália o fornecimento de gás à Europa, e estão disponíveis para fornecer o seu próprio gás natural.

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