Investigação da endometriose está, finalmente, "em rápida evolução" e pode estar para breve um novo medicamento

CNN Portugal , BCE
8 fev, 19:15
A menstruação está geralmente associada a um desconforto, mas há doenças que tornam as dores insuportáveis (Polina Zimmerman/ Pexels)

Os investigadores lamentam que o estudo sobre a endometriose esteja com um atraso de "30 a 40 anos" em comparação com outras doenças, o que tem consequências para o diagnóstico e tratamento. Mas o panorama parece estar finalmente a mudar no mundo da investigação

Uma equipa de investigadores da Escócia está a desenvolver um ensaio clínico do primeiro tratamento não hormonal e não invasivo para a endometriose, uma doença que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), afeta uma em cada dez mulheres em todo o mundo.

Andrew Horne, professor de ginecologia e ciência reprodutiva na Universidade de Edimburgo e presidente da Sociedade Mundial de Endometriose, que lidera a investigação, explica à revista The Economist que este ensaio clínico surge na sequência de exames mais aprofundados sobre a forma como se desenvolvem as lesões desta doença.

Ao recolher amostras durante o diagnóstico, os investigadores descobriram que as doentes apresentavam níveis elevados de uma substância química chamada lactato - uma substância produzida quando o organismo decompõe a glicose (e que é também a causa das incómodas pontadas que podem surgir subitamente durante uma corrida).

A equipa de investigadores acredita que a presença de níveis elevados desta substância pode ser a causa para o desenvolvimento das lesões da endometriose, à semelhança do que acontece na proliferação das células cancerígenas. Neste contexto, procuraram então um medicamento no mercado que já tivesse sido testado em doentes com cancro, tendo optado pelo Dicloroacetato (conhecido pela abreviatura dca).

Numa primeira fase, testaram um pequeno grupo de doentes com este mesmo medicamento, que relataram melhorias após o tratamento. Segue-se agora um ensaio clínico com uma amostra de maior dimensão de forma a perceber se o dca tem efetivamente os resultados esperados. Se este medicamento for aprovado - o que, a acontecer, pode demorar entre cinco a sete anos - o dca será o primeiro novo medicamento para a endometriose em 40 anos.

Andrew Horne lamenta que a investigação sobre esta doença esteja tão atrasada em comparação com outras, como a diabetes, que também afeta uma em cada dez pessoas em todo o mundo. "Ainda há um problema - e detesto dizê-lo - com questões de saúde que só afetam as mulheres", lamenta o professor, que diz mesmo que a investigação em torno da endometriose está "30 a 40 anos atrasada" quando comparada com as restantes doenças.

A observação do investigador é sustentada por um relatório publicado no mês passado pela consultora McKinsey, que conclui que a "falta de compreensão da doença" conduziu a uma perda anual de 40 a 45 milhões de anos de vida por incapacidade para as mulheres, o que equivale a quatro dias perdidos de "vida saudável" por ano e por mulher em todo o mundo.

Um outro estudo realizado por cientistas da Manchester Metropolitan University, publicado em janeiro passado, na revista científica Journal of Health Communication, entrevistou mulheres britânicas em diferentes fases do diagnóstico (que demora em média dez anos). Várias inquiridas disseram que os seus sintomas foram inicialmente descartados como sendo dores normais da menstruação ou como a consequência de fatores relacionados com o estilo de vida, como excesso de peso, ou até mesmo psicológicos.

De acordo com a The Economist, uma das razões pelas quais o diagnóstico da endometriose é um processo tão demorado e desgastante é o facto de exigir quase sempre uma intervenção cirúrgica. É que a maior parte das lesões só pode ser detetada através da introdução de uma câmara (embora as lesões que dão origem a quistos apareçam geralmente nas ecografias).

Para acelerar o processo, os investigadores têm procurado "biomarcadores", isto é, características biológicas mensuráveis que ajudam a prever, diagnosticar e tratar doenças, através da recolha de amostras biológicas, como sangue, urina ou saliva. A farmacêutica francesa Ziwig tem estado a trabalhar precisamente nesse sentido, com o desenvolvimento do "Endotest", um dispositivo de diagnóstico in vitro, de utilização exclusiva por parte de profissionais de saúde, para o diagnóstico da endometriose a partir de uma amostra de saliva.

Em janeiro passado, as autoridades de saúde francesas aprovaram um projeto-piloto para avaliar a eficácia deste dispositivo antes de um possível lançamento no mercado.

Com estes avanços para o diagnóstico e tratamento da endometriose, Andrew Horne acredita que a investigação sobre a doença está agora a entrar num "campo de rápida em evolução" e assume-se "confiante" com o futuro do tratamento para esta doença.

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