O "nim" como resposta, a reconciliação com os pensionistas e a fuga à máquina partidária. O último fôlego de Montenegro para convencer os indecisos

8 mar, 22:04

Aliança Democrática terminou a campanha eleitoral num comício no Campo Pequeno, onde voltou a sublinhar os argumentos que foi apurando ao longo dos quatro mil quilómetros que percorreu. No dia em que contou com Cavaco Silva num almoço-comício, ouviu também um elogio de Manuela Ferreira Leite: "Qualquer um de nós seria capaz de comprar um carro em segunda mão a Luís Montenegro"

A reconciliação com os pensionistas, a política assumida de responder com “nim” aos outros partidos, o apelo ao regresso dos jovens e a fuga à máquina partidária. Do primeiro ao último dia, Luís Montenegro tem insistido em quatro argumentos-chave para conquistar o voto dos indecisos e atrair os eleitores socialistas e do Chega. E esta sexta-feira, no comício no Campo Pequeno que encerrou a sua campanha, cinco mil quilómetros depois, o líder social-democrata voltou a apostar neles, deixando pelo caminho um aviso: “A decisão de domingo vai ter reflexos nas próximas décadas, temos de virar a página".

Montenegro arrancou a campanha com um objetivo em mente. Conseguir recuperar para os sociais-democratas o voto dos pensionistas e reformados, eleitorado-chave da maioria absoluta do PS, que se afastou durante o mandato de Passos Coelho e os tempos da Troika. Durante os primeiros dias, entre comícios e arruadas em Vila Real, Lamego e Faro, Montenegro concentrou os esforços em sublinhar aos mais idosos de que foi o governo de Sócrates que esteve por detrás dos cortes das pensões e, para vincar essa estratégia, fez também um “compromisso de honra”. “Se algum dia eu cortar um cêntimo de alguma pensão, demito-me de primeiro-ministro”, anunciou pela primeira vez a duas senhoras, num café em Portalegre, que lhe confessaram que tinham “medo” de votar nele pela “má memória” do governo de Passos Coelho.

O risco calculado de trazer Passos Coelho para a campanha levou-o também a repetir essa promessa durante quase todos os comícios nas regiões onde o envelhecimento populacional é mais nítido, como no Minho, Alentejo e Trás-os-Montes. No comício desta tarde, em Lisboa, recuperou essa estratégia. Se for eleito, garante, “os pensionistas e reformados terão acesso ao que lhes confere uma vida digna”. “Vamos retribuir o seu esforço”.

Comício de encerramento da campanha da AD/ LUSA

Outro dos pontos constantes na campanha da Aliança Democrática foi a mensagem de que o “o futuro de Portugal está em risco” pela constante fuga de jovens para o estrangeiro. Aliás, logo no primeiro comício da campanha, em Lamego, Montenegro foi claro: “Não tenho problema nenhum em assumir politicamente que a minha prioridade máxima para o próximo governo são os mais jovens, não nos podemos conformar com uma situação em que um em cada três sai do país”.

Ao fim de 15 dias na estrada, sublinhou novamente essa ideia: “É preciso dizer aos jovens portugueses que vale a pena investirem nas suas qualificações, e colocá-las ao serviço de todos”. “Quero que a juventude portuguesa acredite que, se ficar em Portugal, vamos ser mais fortes, vamos criar mais riqueza e através disso mais justiça social”, afirmou para uma plateia que o aplaudia no Campo Pequeno.

Ao longo das duas semanas em que a caravana deu a volta pelo país, Montenegro prometeu também praticamente todos os dias que ia fugir àquilo que diz ser as “tricas partidárias" e ao "discurso de políticos mais interessados em falar entre eles do que para os portugueses”. Salvo algumas exceções - a mais notória foi quando disse que Pedro Nuno não tinha “estabilidade emocional” para ser primeiro-ministro - o presidente do PSD fez por dedicar poucos minutos a criticar outros partidos. “Fui acusado muitas vezes de não responder a isto ou aquilo, mas naquilo que é acessório mais vale dizer “nim” do que perder muito tempo”, afirmou esta sexta-feira. 

Horas antes do seu discurso de encerramento da campanha, já tinha feito outra promessa relativamente a esta estratégia. “Nós não vamos governar a pensar no título do jornal, vamos governar a pensar nos trabalhadores, nos jovens, a olhar para os serviços públicos e dizer que o dinheiro dos impostos é para estar ao serviço do cidadão e não do governo”, afirmou durante um almoço-comício esta sexta-feira. Esta candidatura “perdeu o menor tempo possível a falar das outras candidaturas e dos outros candidatos, é verdade de vez em quando elevei o tom de voz, mas nunca falei mais alto para falar mal dos outros, mas para dizer que acredito em Portugal”.

Para além disto, e de forma mais intensa durante esta semana, Luís Montenegro tentou posicionar-se cada vez mais como candidato de um movimento que dá preferência a figuras independentes e reconhecidas da sociedade civil em relação àqueles que emergem da máquina partidária. Esse distanciamento foi visível num almoço-comício na Trofa, por exemplo, quando se regozijou ao dizer que “hoje o PSD e o CDS estão em minoria” e que isso “é um sinal de que estamos abertos à sociedade, para falar com as pessoas e resolver os problemas que eles enfrentam”. 

No almoço desta sexta-feira com Cavaco e Ferreira Leite, deixou, aliás um aviso à sua máquina partidária: “Não tenham a expectativa de ir invadir a administração pública portuguesa porque esse não é o nosso conceito”. E, horas mais tarde, no Campo Pequeno, voltou a reforçar que a AD tem “cada vez mais pessoas que não são nem do PSD nem do CDS, que não tem partido, ou que se identificam com outras forças partidárias, a virem ter connosco e dizerem-nos que perceberam que era convicto o convite dirigido a Portugal para que abraçassem uma aliança pela alma portuguesa”. 

“Qualquer um de nós seria capaz de comprar um carro em segunda mão a Montenegro”

Cavaco Silva marca campanha da Aliança Democrática

 

Depois de nomes como Passos Coelho, Santana Lopes e Durão Barroso emprestarem o seu peso político à caravana da AD, foi a vez de Cavaco Silva e de Manuela Ferreira Leite entrarem em cena num almoço-comício na Estufa Fria, em Lisboa, onde os dois foram os protagonistas do maior apelo ao voto útil antes da derradeira eleição. Cavaco, que só falou antes do começo do evento, num púlpito à parte, sublinhou que há 21 anos que não participava numa campanha eleitoral, mas que desta vez decidiu abrir uma exceção. “Em consciência não podia ficar calado, é o meu dever cívico dizer aos portugueses que só uma votação forte na AD garante a estabilidade política, a resolução dos problemas económicos e sociais do país e a mudança que Portugal precisa”, declarou ladeado pela mulher, Maria Cavaco Silva, e por Carlos Moedas. 

As atenções viraram-se, depois, para Manuela Ferreira Leite, que, num discurso no mesmo comício na Estufa Fria, acusou a governação socialista de conduzir o país a “uma situação de empobrecimento grave e profunda”.  “É muito característico deste governo tomar medidas que nos tiram o dinheiro do bolso através dos impostos e depois retribuem em esmolas”, disse antes de enaltecer a personalidade de Montenegro numa tentativa de chegar aos indecisos.  “Montenegro é um sujeito leal, é um sujeito sereno, é tranquilo, é sensato”. “É um indivíduo que se algum dia dever dinheiro, tenta de forma ponderada resolver o pagamento dessa dívida e nunca se lembraria de dizer que não pagaria”. Resumindo: “Qualquer um de nós seria capaz de comprar um carro em segunda mão a Luís Montenegro”.

Neste último dia de campanha eleitoral, a caravana da Aliança Democrática investiu muito mais em discursos e comícios em espaços fechados, do que em ações de rua. Por causa do mau tempo, não teve a tradicional descida do Chiado, mas, ainda assim, teve uma mais pequena e controlada arruada em Alvalade, onde Montenegro caminhou ao lado de ilustres do PSD, como Assunção Esteves - a primeira mulher presidente da AR -, Leonor Beleza, Teresa Leal Coelho e Paula Teixeira da Cruz. 

Já de forma mais discreta, mas sempre a par e passo com o líder da Aliança Democrática, esteve a sua mulher, Carla Montenegro. Quando a comitiva parou para tomar a bica, sublinhou estar confiante com a vitória e já com as malas prontas para se mudar para Lisboa, caso o marido vença as eleições no domingo. “Moro em Espinho, mas se tiver de me mudar para Lisboa farei com toda a boa vontade, porque o que interessa neste momento é estarmos e darmos força ao Luís”. 

“Eu acho que se nota pelo que podemos assistir aqui hoje que há uma grande vontade de mudança, acho que vamos assistir a essa mudança no próximo domingo”, realçou, sublinhando também que o casal já tem um “plano especial” para descansar a seguir às eleições, mas prefere deixá-lo em segredo. “Fica entre nós”.

Avançando pela Avenida da Igreja, o líder da Aliança Democrática foi também surpreendido por um abraço apertado de Valdemar Almeida, vice-presidente do PPM e o único dirigente do partido que integra a coligação a participar na caravana. O momento durou poucos minutos e Valdemar Almeida acabou por acompanhar de longe a caminhada. O presidente do partido monárquico não esteve presente, mas o nome Câmara Pereira ainda se fez ouvir durante a arruada. Só que não era o do líder do PPM, Gonçalo da Câmara Pereira, antes o de um primo afastado, o fadista José da Câmara que rejeitou comentar se a candidatura de Montenegro procurou esconder o seu familiar. “Eu não sei nada disso mesmo, gosto muito do Gonçalo, mas noutros locais, não aqui na política”. 

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