Há 30 anos, Portugal foi a primeira seleção a derrotar a Alemanha numa fase de qualificação, e conseguiu o apuramento para o Mundial do México
Efeméride é uma rubrica que pretende fazer uma viagem no tempo por episódios marcantes ou curiosos da história do desporto, tenham acontecido há muito ou pouco tempo. Para acompanhar com regularidade, no Maisfutebol.16 de outubro de 1985, há 30 anos. Portugal garantiu a qualificação para o Mundial de 1986, no México, com um golaço de Carlos Manuel contra a Alemanha (RFA) já que o país ainda estava dividido pelo Muro de Berlim). Uma vitória histórica para a formação lusa por diversos motivos.
Em jogo estava a possibilidade de Portugal conseguir chegar pela segunda vez na história a uma fase final do campeonato do Mundo, mas as dificuldades eram grandes. Portugal e Alemanha, vice-campeã mundial, tinham-se defrontado meses antes, em território luso, num encontro que terminou com uma derrota portuguesa por 2-1. Aliás, apenas num particular os portugueses tinham levado a melhor sobre os germânicos.
Mas, se é certo que Portugal nunca tinha conseguido vencer a Alemanha num jogo oficial, também é verdade que quase ninguém o tinha feito. A RFA só perdera um jogo oficial em território alemão, e fora com a vizinha RDA, em 1974, na fase final do Mundial. E nunca tinha perdido em casa numa fase de qualificação.
O caso era ainda mais sério já que Portugal não dependia só de si. As contas obrigavam a Checoslováquia a vencer a Suécia para que a Portugal bastasse só (!!!) vencer a Alemanha.
«Nós tínhamos poucas hipóteses», recorda ao Maisfutebol
Antes de a equipa entrar em campo no Neckarstadion, em Estugarda, chega uma boa notícia. «O jogo da Checoslováquia com a Suécia foi antes do nosso e soubemos o resultado no balneário ainda antes do jogo. Isso foi uma injeção de moral, uma motivação maior. Todos rejubilámos ao saber que dependíamos só de nós».
E assim, com uma verdadeira revolução no onze por causa de lesões, com jogadores que vestiam a camisola das Quinas pela primeira vez, Portugal entra em campo para defrontar o gigante alemão, que até já estava apurado, mas levou as estrelas todas no onze.
A Mannschaft entrou assim, como se previa, com a missão de fazer tiro ao alvo à baliza portuguesa, mas as coisas não lhe corriam bem. «Tínhamos um herói na baliza, que era o Bento, secundado por mais dez guerreiros», lembra Jaime Pacheco. A verdade é que os ferros da baliza também ajudaram e a Alemanha continuava sem conseguir marcar.
E depois, aos 54 minutos, acontece o impensável. «Numa jogada no meio campo o Littbarski perdeu a bola, eu intercetei-a, e dei-a ao Carlos Manuel», conta Jaime Pacheco. E Carlos Manuel, «A Locomotiva do Barreiro» resolve, a 30 metros da baliza, arriscar o remate.
A bola voou em direção ao ângulo superior esquerdo e só parou dentro da baliza. O guarda-redes Harald Schumacher, titularíssimo na seleção alemã, nem pestanejou. Pensava, tal como o narrador da televisão portuguesa, que o pontapé saíra ao lado. Enganou-se.
«Foi um milagre», contou há três anos o ex-guarda-redes da Alemanha em entrevista ao Maisfutebol
Mas Jaime Pacheco não ficou nada surpreendido. «Ele fazia aquilo muitas vezes, claro que nem sempre com a felicidade de fazer golos. Chutava muito bem e tinha aquele egoísmo, entre aspas, que é necessário nestas situações. Era um daqueles jogadores que têm qualidade para fazerem grandes golos do nada».
E quando o viu rematar, acreditou no golo? «Eu estava perto, fiz o passe e fui o primeiro a abraçá-lo depois. Quando o vi a rematar e a bola a levar aquela trajetória, cada centímetro, cada metro mais que a bola voava, mais eu acreditava que ia ser golo», garante o antigo internacional português.
«Além de ter sido um golo excecional, foi num momento em que se fez história. Foi uma coisa soberba e só ao nível de um grande jogador como o Carlos Manuel. Ele foi, na década de 80, um dos melhores jogadores do Benfica na sua posição, quiçá até de toda a história», frisa.
Ainda faltava muito tempo para o apito final, e os restantes minutos de jogo foram passados com o coração nas mãos. Hans Peter Briegel ainda acertou duas bolas no ferro da baliza de Bento», mas o destino estava traçado.
Com o apito final estava garantida a ida à fase final do Mundial 86, no México, e Portugal fazia história. «Já tínhamos feito história em 1984 por sermos os primeiros portugueses a participarem num Europeu. Depois a mesma geração de jogadores acaba por conseguir outra proeza, fomos a segunda equipa a conseguir a presença num Campeonato do Mundo, depois da célebre seleção de 1966, com o Eusébio», lembra Jaime Pacheco.
«A festa no balneário foi enorme porque as adversidades eram muitas. O tempo passa e não nos esquecemos, ainda valorizamos mais esse feito», garante. E realmente é um feito difícil de esquecer.