€339.149,16: ADN não contava receber tanto dinheiro do Estado mas vai pedir a subvenção e até já sabe onde a vai gastar

11 mar, 20:22
Bruno Fialho, da Alternativa Democrática Nacional (ADN) (LUSA/Carlos M. Almeida)

Mesmo sem eleger qualquer deputado, a Alternativa Democrática Nacional (ADN) tem direito a mais de 339 mil euros de subvenção. O partido já sabe como usar o dinheiro

Quer taxar a interrupção voluntária da gravidez, diz que o país esteve refém de “onipresença de uma chamada ‘pandemia’” e rejeita o “ensino e doutrinação” do que diz ser “ideologia de género”. O partido Alternativa Democrática Nacional (ADN) nasceu em 2021 e passou de 10 mil votos nas eleições de 2022 para mais de 100 mil votos este domingo. O resultado: 339 mil euros de subvenção.

À CNN Portugal, o presidente do ADN, Bruno Fialho, diz que o partido apenas está à espera que seja eleito um presidente da Assembleia da República para pedir a subvenção a que agora tem direito. E assegura que já sabe como quer gastar o dinheiro.

Iremos tentar fazer uma coisa que é ajudar as pessoas, o ADN vai usar a subvenção para ajudar as pessoas, tentar fazer o bem. Os partidos políticos têm de se adaptar às novas necessidades e o que o ADN vai fazer é devolver esse dinheiro através de ações e apoios aos cidadãos”, assegura Bruno Fialho. 

Mas não são apenas as pessoas que irão beneficiar deste montante. Bruno Fialho admite que “não estava a contar com um valor tão alto”, mas que quer usá-lo também para colocar o partido num outro nível, garantindo uma “gestão criteriosa” destas três centenas de milhares de euros. “Pretendemos divulgar as nossas ações, o nosso programa eleitoral, o nome do ADN que agora todos conhecem. Será mais fácil as pessoas procurarem o nome ADN e encontrar algo que desperte proximidade”, adianta, rejeitando a conquista de mais votos do que o esperado à boleia da polémica nos boletins de voto, até porque, diz, “contava superar 50 mil votos e eleger [deputados]”.

Bruno Fialho adianta que estes mais de 300 mil euros a que agora o ADN vai ter direito irá ainda ser usado para tornar o partido “mais profissional”, “a própria comunicação será mais profissional”.

Como funciona a atribuição da subvenção?

Há “três tipos de subsidiação pública aos partidos” prevista pela lei: “a subvenção para o funcionamento dos partidos políticos; a subvenção para o financiamento das campanhas eleitorais e a subvenção para o funcionamento dos grupos parlamentares”, começa por explicar Vitalino Canas, professor de Direito Constitucional e Direito Administrativo na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e ex-deputado socialista. No caso do ADN, a subvenção agora conquistada diz respeito ao financiamento dos partidos políticos, estipulado pela Lei n.º 19/2003, de 20 de junho.

De acordo com o artigo 5.º desta lei, a subvenção pública é concedida aos partidos que concorrem a eleições e conseguem eleger deputados, mas não só: é também dada aos “partidos que, tendo concorrido à eleição para a Assembleia da República e não tendo conseguido representação parlamentar, obtenham um número de votos superior a 50.000”. O ADN conseguiu até o dobro desse número de votos e, por isso, conquistou uma “quantia em dinheiro equivalente à fração 1/135 do valor do IAS, por cada voto obtido na mais recente eleição de deputados à Assembleia da República”, de acordo com a alínea 2 do mesmo artigo. O valor do indexante dos apoios sociais é atualmente de 509,26 euros e cada voto vale aproximadamente 3,39€ (já com o desconto de 10% que é aplicado). Contas feitas: 339.149,16 euros.

Para receber este valor, que é pago anualmente e em duodécimos, Bruno Fialho está apenas à espera que “um novo presidente da Assembleia da República tome posse”, uma vez que é a ele que deve ser feito o pedido, tal como explica a lei.

Margarida Salema, ex-presidente da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos e professora de direito comunitário, diz que “não há regras” para os partidos usarem esta subvenção, desde que o montante seja aplicado para o funcionamento do próprio partido - sem quaisquer desvios para terceiros.

“Este partido, mesmo não tendo qualquer representante parlamentar, com este dinheiro, que é muito dinheiro para um partido pequeno, pode fazer coisas bastante interessantes e preparar-se para a próximas eleições de uma forma bastante desafogada”, diz Vitalino Canas.

Segundo o constitucionalista, os partidos “podem usar [a subvenção] para o funcionamento do partido, para a sede do partido, para pagar a funcionários do partido, fazer ações de propaganda fora das eleições, cobrir despesas do funcionamento dos órgãos do partido, divulgar a imagem, mensagem e programa do partido”, exemplifica.

Pode este dinheiro ser empregado para pagar as despesas da campanha? “Em princípio sim, os partidos não estão impedidos desde que respeitem o limite das despesas campanhas”, valor que comunicam à Entidade das Contas e Financiamento Políticos. “Da interpretação que faço da lei, embora não tenha direito a subvenção para campanha eleitoral, pode usar o dinheiro que recebe para pagar o despendido”, continua o constitucionalista.

Uma vez que o ADN não elegeu qualquer deputado, não tem direito à subvenção para o financiamento das campanhas eleitorais (artigos 17.º e 18.º) e à subvenção para o funcionamento dos grupos parlamentares (artigo 5º. alínea 2).

Podemos ter mais ADN nas próximas eleições?

Pelo fator surpresa, sim. Pelo fator imitação ou perspetiva de negócio, não. Tanto Margarida Salema como Vitalino Canas rejeitam que possa haver partidos a ver o ADN como exemplo para lucrar com a política. “Em princípio, fazer política partidária não é um negócio”, diz o constitucionalista.

Vitalino Canas rejeita que possa haver um “efeito imitação”, até porque, defende, “os partidos podem tentar imitar, mas antes de terem a sorte de chegar a este nível, muitos deles morrem”.

Embora reconheça que “é evidente que muitos partidos pequenos almejam os votos necessários para ter uma subvenção pública, o que permite exercer atividade partidária”, Margarida Salema vinca que “a política não é um negócio”. E diz mesmo que, no caso da ADN, estamos perante uma situação “insólita”, “parece ter sido uma espécie de lotaria nacional”. “É inédito um partido como o ADN ter uma subvenção pública anual, inédito porque se trata de um partido que não tinha essa previsibilidade de crescimento”, continua ex-presidente da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.

Vitalino Canas vinca que “não é suposto os partidos usarem a subvenção pública para fazer negócio, os partidos, por norma, precisam de mais dinheiro do que a subvenção pública para as suas despesas”, continua Vitalino Canas, explicando que muitos optam por ações com militantes e população em geral, dando como exemplo a Festa do Avante que o PCP organiza todos os anos.

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