Nova descoberta. Cientistas identificam composto de fruta que pode potenciar imunoterapia

4 fev 2022, 13:20
Cientistas identificam composto de fruta que pode potenciar imunoterapia

Um recente estudo publicado esta semana na revista Cancer Discovery vem reforçar a importância do microbioma para a eficácia da imunoterapia e aponta a fruta camu-camu como uma das chaves

Um grupo de investigadores do Canadá descobriu que a fruta camu-camu, originária do Brasil, pode ser um escudo-protetor contra o cancro. Segundo o estudo, publicado esta semana na revista Cancer Discovery, os polifenóis desta fruta promovem as bactérias intestinais que, por seu turno, têm um papel determinante na imunoterapia.

Levado a cabo pela University of Montreal Hospital Research Centre (CRCHUM), em parceria com a Université Laval e a McGill University, o estudo revela que a castalagina - um polifenol (composto orgânico encontrado em frutas e vegetais) - atua como prebiótico (hidrato de carbono não digerível) e modifica o microbioma intestinal, melhorando a resposta nesta terapêutica contra o cancro.

O estudo foi realizado em ratinhos e os investigadores estão já a recrutar pacientes para avançar para ensaios clínicos em humanos: 45 com cancro do pulmão e melanoma.

O que diz o estudo

Para o estudo, os cientistas recorreram aos modelos tumorais MCA-205 (células fibrosacaroma, tumor de tecidos moles raro) e E0771 (células de adenocarcinoma mamário) e foram usados ratinhos fêmea de sete semanas de idade.

Para avaliar os efeitos benéficos deste composto com ação prebiótica, os cientistas administraram oralmente a castalagina em ratinhos que receberam um transplante fecal de pacientes resistentes aos inibidores de checkpoints imunológicos (a imunoterapia), simulando, assim, uma má resposta ao tratamento. 

Como resultado, perceberam que o composto desta fruta brasileira, comercializada em Portugal sob a forma de pó, consegue ligar-se a uma bactéria intestinal 'boa', a Ruminococcus bromii, promovendo a resposta da imunoterapia contra o cancro.

O polifenol castalagina, isolado de uma baga, tem efeito antitumoral por interações com bactérias comensais, reprogramando assim o microambiente tumoral”, lê-se no estudo.

Deste modo, os cientistas acreditam que a castalagina pode ser usada a par dos medicamentos inibidores de checkpoints imunológicos, que são uma classe de medicamentos de imunoterapia (cuja finalidade é estimular o sistema imunitário da pessoa com cancro a ser capaz de atuar contra o tumor). 

Esta não é a primeira investigação que associa as bactérias intestinais à eficácia da imunoterapia, mas os cientistas do Canadá vão mais longe: acreditam que o composto desta fruta pode ser eficaz até mesmo em cancros que são resistentes a este tipo de terapêutica, que tem sido usada como padrão em vários tipos de tumor.

O já descoberto poder das bactérias intestinais

Tal como a CNN Portugal já tinha revelado neste artigo sobre os últimos avanços da ciência na luta contra o cancro, uma revisão científica publicada na revista Frontiers in Immunology em 2021 revela que a “era da imuno-onco-microbióticos está bem e verdadeiramente em andamento” e José Carlos Machado defendeu mesmo que o tema das bactérias intestinais “é muito excitante”. Na prática, a ciência defende que as bactérias intestinais têm um papel importante no sistema imunitário e que este, beneficiando de um microbiota equilibrado, pode combater mais eficazmente o cancro.

Um ensaio clínico publicado em 2021 na revista Science veio reforçar o papel que o microbioma pode ter na resposta à imunoterapia, mas focando-se apenas num tipo de cancro - aliás, esta é uma das ressalvas da imunoterapia e da microbiota, a sua combinação ou atuação em separado não é igual para todos os tipos de cancro. Neste estudo, pacientes com melanoma (cancro de pele que tem origem nas células deste órgão, os melanócitos) receberam bactérias intestinais (através de transplantes de fezes) e à boleia disso voltaram a responder à imunoterapia.

“Já sabíamos há imenso tempo que boa parte da saúde do sistema imunitário é ditada pela saúde dos nossos intestinos, isto é, o microbiota é um regulador importante do sistema imunitário”, esclareceu o investigador José Carlos Machado. E no cancro acontece o mesmo, diz. 

“Tem sido mostrado recentemente que pela qualidade do microbioma podemos prever se aquele doente será o melhor ou pior respondedor à imunoterapia”, podendo o microbioma fazer “parte dos marcadores” da imunoterapia em alguns tipos de cancro.

 

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