“Estamos a preparar um plano para cada uma das regiões com maior dificuldade”, que terá como um dos pilares a abertura de vagas para médicos de família, assegurou a secretária de Estado, Margarida Tavares
O BE denunciou esta quarta-feira que quase 1,7 milhões de utentes estão sem médico de família, uma situação que o Governo reconheceu ser difícil, mas garante estar a responder com a abertura de vagas para especialistas.
Em abril, 1.678.226 utentes não tinham médico de família, “160% mais do que no final de 2019”, afirmou a deputada Catarina Martins, num debate de urgência requerido pelo BE sobre a "degradação dos cuidados de saúde primários”.
Na sua intervenção, a coordenadora do BE responsabilizou o Governo por terem voltado as “filas à frente dos centros de saúde”, a “ida de madrugada a ver se se arranja uma consulta” e as “horas e horas na rua, ao sol e à chuva para ter acesso à saúde”.
Catarina Martins apontou os centros de saúde de Odivelas, Algueirão Mem-Martins e Marvila como exemplos da falta de médicos de família, mas salientou que “estas situações multiplicam-se por muitos outros concelhos e muitos outros centros de saúde” do país.
“O problema da falta de médicos de família não é um problema de carência de médicos. É um problema de ausência do Governo, que nesta matéria pura e simplesmente não quer fazer nada para que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) melhore”, criticou a parlamentar no BE.
Governo reconhece "situação difícil" com um "grande número" de aposentações
Na resposta, a secretária de Estado da Promoção da Saúde reconheceu que se trata de “uma situação difícil” e com muitos fatores, que atinge, sobretudo, as regiões de Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve.
“Reconhecemos igualmente que 2021, 2022 e ainda 2023 e 2024 serão anos de grande número de médicos a aposentar-se”, afirmou Margarida Tavares, ao adiantar que, este ano, entraram 507 médicos no internato de medicina geral e familiar, dos quais 168 em Lisboa e Vale do Tejo.
Segundo disse, para compensar estas reformas dos médicos, é necessário preencher as vagas a concurso para internato e para ingresso na carreira, um “esforço que não foi feito há muito tempo atrás”.
“Estamos a preparar um plano para cada uma das regiões com maior dificuldade”, que terá como um dos pilares a abertura de vagas para médicos de família, assegurou Margarida Tavares.
A secretária de Estado sublinhou ainda que a recente abertura de todas as 978 vagas de medicina geral e familiar “não é uma manobra”, mas sim uma tentativa para que todos os médicos que querem ficar no SNS “encontrem a melhor vaga, seja ela onde for”.
“Mesmo que sejamos realistas e digamos que apenas, provavelmente, 200 a 250 dos 355 médicos que acabaram agora a especialidade, ou seja, uma retenção de 60% a 70%, possam ficar nessas vagas”, reconheceu.
Neste debate de urgência, o deputado do PSD, Ricardo Batista Leite, alertou que os profissionais de saúde “estão a sair em números recorde” do SNS, não apenas devido à sua situação remuneratória e de carreira, mas também por “questões como a qualidade de vida e o respeito pelo trabalho feito”.
“Já estamos em quase 1,7 milhões de portugueses sem médico de família atribuído” em todo o país, salientou o social-democrata, ao apontar o exemplo do concelho de Sintra, onde “mais de 125 mil pessoas” não têm acesso a um especialista de medicina geral e familiar.
A deputada do PS, Maria Antónia de Almeida Santos, lamentou que o BE tenha “agora uma atitude completamente diferente”, aconselhando Catarina Martins a não se deixar “contaminar por discursos populistas”.
Pedro Frazão, do Chega, também exemplificou com o caso de um centro de saúde de Vila Franca de Xira, que serve 11 mil utentes e que, “a partir de 01 de janeiro deste ano, ficou sem médico de família”, ao questionar como foi possível, em quatro meses, “aumentar em 100 mil" o número de portugueses sem médico atribuído.
Para a deputada da Iniciativa Liberal, Joana Cordeiro, a falta de médicos de família demonstra que “há muito tempo que o SNS está num verdadeiro SOS, a definhar, estrangulado e amarrado a um centralismo que o sufoca”.
Pela bancada do PCP, João Dias deu os “parabéns” ao Governo pelo sucesso da sua política da saúde de entregar “os serviços públicos nas mãos dos privados”, desde logo nos cuidados de saúde primários, alegando que “quando se perde um médico de família, perde-se o acesso ao SNS”.
Rui Tavares, deputado único do Livre, questionou o Governo se tinha desistido de atribuir a todos os portugueses um médico de família e qual a estratégia alternativa que tem para essa situação, enquanto Inês de Sousa Real, do PAN, lamentou a “ausência de políticas de prevenção” e de proximidade em especialidades como a maternoinfantil e a saúde mental.