EXCLUSIVO: Mercenários russos mortos em combate na República Centro-Africana

28 nov 2021, 08:00
República Centro-Africana (arquivo AP)

Quatro mercenários russos do grupo Wagner morreram em combates com os rebeldes do movimento 3R a 18 de novembro, em Pare, República Centro-Africana, apurou a CNN Portugal

Mercenários russos do grupo Wagner lançaram um ataque contra uma posição do movimento rebelde 3R (Regresso, Reclamação e Reabilitação) na República Centro-Africana. A CNN Portugal confirmou detalhes sobre o ataque, que teve lugar em Pare, a cerca de 15 quilómetros de Baboua, na prefeitura de Nana Mambéré, a 18 de Novembro, segundo um serviço de informações militares.

É a primeira vez que se noticia um ataque com estas caraterísticas, desferido pelo grupo Wagner contra os rebeldes 3R apoiados pelos "Peuls Mbororo" (grupo minoritário muçulmano). O grupo armado 3R integra a Coligação dos Patriotas para a Mudança (CPC), que motivou o colapso dos acordos de paz assinados em 2019, e atua principalmente nas regiões a Oeste do país.

Segundo fonte de um serviço militar de informações, "à chegada à entrada da localidade, os rebeldes do 3R abriram fogo sobre os elementos da Wagner tendo desencadeado um combate violento".

Três mercenários russos morreram no local e um ferido grave foi evacuado para Baboua, onde viria a falecer devido à gravidade dos ferimentos. Nos confrontos morreram ainda um guerrilheiro do 3R e um elemento da milícia cristã anti-balaka.

Os mercenários russos foram enterrados no mato. As suas armas (essencialmente AK-47), segundo uma fonte rebelde, foram capturadas.

Algumas das armas capturadas aos mercenários russos do grupo Wagner. FOTO: Movimento rebelde da RCA. 
Algumas das armas capturadas aos mercenários russos do grupo Wagner. FOTO: Movimento rebelde da RCA. 

A República Centro-Africana está a ferro e fogo há oito longos anos. Catorze grupos armados controlam 80% do território onde o Estado faz figura de ausente. A influência da Federação Russa não pára de aumentar na RCA desde 2017.

Os confrontos aumentaram em número e em intensidade (incluindo com o recurso a minas) nos últimos dois anos, designadamente nas regiões mineiras da República Centro-Africana.

Em Nova Iorque, o Conselho de Segurança da ONU modificou em 2018 o mandato da MINUSCA, força multinacional de paz integrada na missão das Nações Unidas para a estabilização da República Centro-Africana. Forças militares portuguesas, dos três ramos das Forças Armadas, integram as missões da ONU e da EU neste país, mas não há qualquer relação entre elas e os confrontos aqui noticiados entre os grupos Wagner e 3R.

Tráfico sem controlo

O parágrafo sobre a “exploração ilícita e o tráfico de recursos naturais” da resolução votada em 2017 pelo Conselho de Segurança da ONU desapareceu, entretanto, da que foi adotada a 13 de Dezembro de 2018.

Dali em diante, a MINUSCA deixou de ter legitimidade ou competência para atacar as redes de traficantes e impedir o rapinanço dos diamantes, ouro, urânio e de todos os outros recursos naturais do país.

O regime de Moscovo oferece à RCA armas e munições (desde 2018), treina parte das Forças Armadas (FACA), propõe medidas políticas, garante a proteção do presidente Touadéra, e desenvolve ainda tarefas supostamente humanitárias, fornecendo proteção a colunas de viaturas provenientes do Sudão que ninguém controla ou com hospitais como o de Bria, que não tinha médicos nem enfermeiros).

Hospital russo em Bria. FOTO: Serviço de Informações.

Os mercenários russos do grupo Wagner são acusados de crimes de guerra, violações e saque das riquezas do país.

"A investigação de Junho de 2021 realizada pela CNN revelou que mercenários russos tinham executado civis e expulsado populações locais nas zonas de exploração mineira", refere o Parlamento Europeu na resolução 2021/2982 (RSP) adotada esta semana, no dia 25 de Novembro, sobre as "violações dos Direitos do Homem cometidas por empresas militares e de segurança privadas, em particular o grupo Wagner."

Segundo o mesmo relatório do Parlamento Europeu, "os relatores especiais das Nações Unidas sobre a tortura e sobre as execuções extra-judiciais, sumárias ou arbitrárias concluíram conjuntamente em Outubro de 2021 que o grupo Wagner tinha cometido violações flagrantes e sistemáticas dos Direitos do Homem, incluindo execuções sumárias de massa, detenções arbitrárias, violências sexuais, pilhagens, desaparecimentos forçados e actos de tortura aquando dos interrogatórios".

Uma outra fonte de um dos 14 grupos rebeldes da RCA revelou à CNN outro massacre cometido pelos mercenários russos ocorrido há escassas semanas em Kouki, na prefeitura de Ouham (Nordeste).

O número de vítimas civis é uma incógnita e oficialmente não há confirmação do massacre. Vladimir Monteiro, porta-voz da MINUSCA disse à CNN Portugal que esta força da ONU “não tem conhecimento” dos factos denunciados. “A MINUSCA faz o monitoramento semanal das violações dos direitos humanos, mas nem sempre consegue ir a todos os sítios devido aos combates, engenhos explosivos, etc.”, acrescentou o porta-voz.

Josep Borrell, vice-presidente da Comissão Europeia, anunciou, entretanto, a existência de um consenso por parte dos ministros dos Negócios Estrangeiros dos 27 a favor da adopção de medidas restritivas contra o grupo Wagner aquando do próximo Conselho dos Negócios Estrangeiros da União Europeia, em Dezembro.

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