Inquilinos estão "satisfeitos" com aumento de 6,94%. Porquê? Porque "vai aumentar a confiança" de quem arrenda - proprietários garantem apenas que "não haverá retração da oferta"

26 out 2023, 21:23
Habitação em Lisboa (Getty Images)

Tanto as associações que representam os inquilinos como as que representam os proprietários admitem estar satisfeitas com as medidas anunciadas pelo Governo para mitigar os efeitos da crise no arrendamento. Ainda assim, a Associação dos Inquilinos Lisbonenses avisa que é preciso acabar com a "lei Cristas"

"São apenas paliativos e medidas circunstanciais para o próximo ano." É assim que Luís Mendes, da Associação de Inquilinos Lisbonenses, descreve as medidas anunciadas esta quinta-feira pelo Governo para apoiar os arrendatários. O executivo decidiu não aplicar qualquer travão à atualização das rendas em 2024 e, em contrapartida, aprovou um apoio de 4,94% aos inquilinos.

A Associação de Inquilinos Lisbonenses já esperava o fim do travão ao aumento das rendas, tendo em conta "toda a pressão que o imobiliário e os senhorios fizeram" sobre o Governo para pôr termo a essa medida e, por isso, "nunca" pediu uma norma-travão ao Governo nem um coeficiente de atualização em específico.

"Na verdade, a norma-travão não foi aplicada porque ela gerou sempre muito contrassenso no setor dos proprietários", observa o responsável, acrescentando que a medida acabava por ter "um efeito perverso, porque levava os proprietários a não querer renovar os contratos com os inquilinos, porque sabiam que, senão renovassem, poderiam sempre optar por receber um novo inquilino e estabelecer o valor que entendessem".

Nesse contexto, "entendeu-se que a norma-travão no próximo ano teria mais efeitos perniciosos e nefastos do que propriamente benefícios, coisa que a Associação de Inquilinos Lisbonenses acabou por concordar", acrescenta Luís Mendes, em declarações à CNN Portugal.

Os inquilinos consideram até que o fim do travão ao aumento das rendas "vai aumentar a confiança" dos proprietários nas autoridades públicas, "no sentido de não serem tão intervencionistas e não estarem a colocar uma barreira na possibilidade da subida das rendas". "Portanto, nós achamos que isto vai acabar por trazer algum aumento de confiança no mercado. Contudo, insistimos que isto não seja feito à custa de uma contínua subida das rendas de forma completamente descontrolada e que não existam benefícios para os inquilinos ao mesmo tempo. Neste caso existem alguns benefícios", aponta.

Apesar de não ter havido qualquer compromisso entre as partes - nomeadamente entre inquilinos, proprietários e Governo -, Luís Mendes salienta que as medidas anunciadas vão ao encontro das reivindicações da Associação de Inquilinos Lisbonenses nas "várias audiências" que tiveram com a ministra da Habitação, Marina Gonçalves.

"O que pedimos da nossa parte - e por isso é que vemos com bons olhos as medidas tomadas - é que, independentemente do que se fizesse com a norma-travão ou o coeficiente de atualização das rendas, as famílias com uma taxa superior a um terço do seu rendimento médio pudessem ser apoiadas pelo Estado, (...) e que se fizessem deduções em sede de IRS, no caso dos inquilinos, ao nível dos 20%", indica o responsável.

Os inquilinos consideram por isso que "o Governo foi justo" na adoção destas medidas, mas notam que estas medidas, assentes na atribuição de apoios e subsídios, não serão "sustentáveis" a longo prazo. "Funcionam na escala de um ano ou de alguns meses. A longo prazo não funcionam", reforça, salientando a importância de medidas estruturais, nomeadamente criar uma entidade reguladora do valor do arrendamento em Portugal e promulgar a lei do arrendamento.

É que, no entender de Luís Mendes, "o Governo está a tomar decisões com base numa lei que tem mais de 10 anos, que é a lei de 2012, 'a lei Cristas' [assim conhecida por ter sido da iniciativa da então ministra Assunção Cristas] e que tem de ser revogada porque deu rédea solta ao mercado, portanto, não aumentou o número de casas no mercado a preços acessíveis, não garantiu a estabilidade e mais segurança ao mercado de arrendamento".

Sem travão "não haverá retração da oferta"

As novas medidas também agradam aos proprietários. "Pelo que estamos a ver, está-se a adotar o que nós propusemos e por isso só podemos ficar satisfeitos", diz Luís Menezes Leitão, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários, salientando que o Governo está a perseguir a "política correta", aplicando as "regras que existem desde 1985" e que estabelecem a atualização das rendas, ao contrário do que fez no ano passado, quando decidiu aplicar o travão ao aumento das rendas. 

"Foi uma situação muito grave, como se viu, e muito contraproducente para o mercado de arrendamento", argumenta. 

Quanto aos apoios anunciados para os arrendatários, o responsável considera que esse é "um bom princípio", defendendo que a proteção dos inquilinos é competência do Estado e não dos proprietários, que "celebram um contrato e não têm funções de segurança social". "Nesse aspeto é ao Estado que cabe desempenhar isso e por isso é que nós descontamos para a Segurança Social", reforça.

Questionado sobre se o fim do travão ao aumento das rendas pode traduzir-se num aumento do número de casas no mercado de arrendamento, Luís Menezes Leitão diz não saber "se vai ter efeitos imediatos" no mercado, mas destaca que "pelo menos não haverá retração da oferta".

 

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