Eleições em Espanha: "Os extremos sofreram perdas pesadas", mas "serão decisivos" para formar governo

Agência Lusa , BCE
27 jul 2023, 08:25
Parlamento espanhol (AP Photo/Bernat Armangue)

Apesar de o PP ter ganhado as eleições, “é pouco provável que venha a governar”, admitem os politólogos

As eleições locais, regionais e nacionais dos últimos dois meses em Espanha originaram análises e notícias sobre "o reforço do bipartidarismo", embora formar um novo governo pareça mais complicado do que nunca num parlamento com 11 forças políticas representadas.

O fim do bipartidarismo em Espanha, dominado à esquerda pelos socialistas (PSOE) e à direita pelos conservadores do Partido Popular (PP), foi decretado em Espanha em 2015, com a irrupção no parlamento do Podemos (extrema-esquerda) com 42 deputados e do Cidadãos (liberais de centro-direita) com 40, a que se juntou, em 2019, o VOX (extrema-direita).

Todos estes partidos estavam representados no parlamento espanhol até às eleições de domingo passado, assim como várias forças regionalistas, nacionalistas e separatistas das Canárias, Galiza, Cantábria, Astúrias, Navarra, País Basco ou Catalunha, num total de 18 partidos e plataformas.

Nas eleições de domingo, PSOE e PP aumentaram o número de votos em relação às eleições anteriores, assim como o número de deputados: os populares passaram de 89 para 136 e os socialistas de 120 para 122.

Em paralelo, partidos como o Cidadãos, a plataforma da Espanha Vazia e outros regionalistas e separatistas mais pequenos deixaram de estar representados por não se terem apresentado sequer às eleições, por não terem conseguido os votos suficientes para eleger deputados ou por se terem integrado dentro da nova coligação de esquerda, o Somar (como aconteceu ao Podemos).

Por fim, o VOX perdeu 19 deputados (tinha 52) e o Somar ficou com menos sete do que os 38 que tinham os partidos que agora integra.

Assim, no novo parlamento espanhol, que vai constituir-se formalmente em 17 de agosto, além de PSOE e PP terem grupos parlamentares maiores, haverá menos forças representadas (11 quando eram 18).

"Espanha é um dos poucos países da União Europeia que ainda tem tanto um grande partido social-democrata como um grande partido conservador. A maioria tem apenas um ou nenhum", diz o professor universitário de Ciência Política e diretor da representação em Espanha do Conselho Europeu das Relações Externas (ECFR, na sigla em inglês), José Ignacio Torreblanca, numa análise escrita das eleições espanholas enviada à agência Lusa.

Torreblanca acrescenta que "estas eleições mostraram que os extremos (VOX e os partidos separatistas) sofreram perdas pesadas", mas, "no entanto, parece que serão decisivos, dada a incapacidade dos dois principais partidos chegarem a acordo entre si".

É certo que o PP ganhou as eleições, mas “é pouco provável que venha a governar”, admite o politólogo José Ignacio Torreblanca (AP Photo/Alvaro Barrientos)

Os partidos nacionalistas e independentistas já viabilizaram o governo da última legislatura, uma coligação do PSOE com a plataforma de esquerda Unidas Podemos.

Este ano voltam a ser decisivos, mas com as contas ainda mais apertadas, para viabilizarem ou para bloquearem um novo governo em Espanha porque nem PP nem PSOE conseguiram uma maioria absoluta sozinhos com os aliados que têm à esquerda e à direita (VOX e Somar, respetivamente).

As análises das eleições de politólogos e jornalistas, mas também dos dirigentes políticos, parecem consensuais na conclusão do "reforço do bipartidarismo", mas nenhuma conclui que esteja em causa um "regresso do bipartidarismo" que marcou a democracia espanhola até 2015.

Para o politólogo Pablo Simón, professor da Universidade Carlos III, de Madrid, o que se instalou em Espanha nos últimos anos foi "a lógica dos blocos" de esquerda e direita.

"A lógica de blocos já é total em Espanha", disse o politólogo, ainda antes das eleições, num encontro com jornalistas da imprensa estrangeira em Madrid, entre eles, a Lusa.

Pablo Simón manteve a análise depois das legislativas, na segunda-feira, num debate público em Madrid sobre as eleições promovido pela organização Forum Nova Economia.

Para o politólogo, o resultado das eleições de domingo deveu-se, precisamente, "à ativação dos blocos" ideológicos que, neste caso, o PSOE conseguiu fazer mobilizando o eleitorado de esquerda a ir votar, com a mensagem, durante a campanha eleitoral, de que a extrema-direita poderia entrar no Governo de Espanha.

Também para José Ignacio Torreblanca “os receios em relação ao VOX mobilizaram os eleitores socialistas”, embora o PSOE vá ter “dificuldades em reunir uma coligação” para se manter no poder e possa haver uma repetição das eleições.

Quanto ao PP, ganhou as eleições, mas “é pouco provável que venha a governar”, por ter menos aliados no parlamento do que o PSOE e poder contar apenas com o VOX e com um deputado de um partido de Navarra, acrescenta.

Juntos, PP e PSOE têm no novo parlamento espanhol mais de 60% dos deputados, num regresso ao que aconteceu nas eleições de 2011, antes de surgirem os novos partidos na assembleia, em 2015.

Entre 2011 e 2019, ano das eleições anteriores, o PP e o PSOE chegaram a ter os grupos parlamentares mais pequenos da sua história e os dois partidos viram como o Cidadãos, no primeiro caso, e o Podemos, no segundo, quase os alcançavam em número de deputados.

O Cidadãos, que após sucessivas derrotas eleitorais nem sequer apresentou listas este ano, chegou a ter 57 deputados num momento em que o PP elegeu 66.

O Podemos elegeu este ano cinco deputados dentro das listas do Somar, onde os seus dirigentes ocuparam um papel secundário, depois de numas eleições em 2016 ter conseguido 71 lugares no parlamento, no mesmo ano em que o PSOE teve 85.

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