Professores faltam cerca de dois milhões de dias por ano

Agência Lusa , AM - notícia atualizada às 11:36 para corrigir a autoria do estudo
29 jan, 06:52
Regresso às aulas em confinamento

Nas escolas, há cada vez menos alunos e mais professores. Ao longo dos cinco anos em análise verificou-se um aumento de professores contratados que foi equivalente à redução de efetivos

Os professores do ensino obrigatório faltam cerca de dois milhões de dias por ano, segundo um estudo que mostra que todos os dias faltam, em média, onze mil docentes nas escolas, afetando cinco mil turmas.

Um estudo promovido pelo EDULOG, sob a coordenação de Isabel Flores (investigadora do ISCTE), analisou o absentismo entre a classe docente ao longo de cinco anos e concluiu que, em média, os professores do ensino básico e secundário faltam “cerca de dois milhões de dia por ano”, contou à Lusa a coordenadora do estudo, Isabel Flores.

Em média, 11 mil docentes faltam diariamente ao trabalho e essa ausência significa que, todos os dias, cinco mil turmas são afetadas pela falta de, pelo menos, um professor, segundo o estudo “A realidade demográfica e laboral dos professores do ensino público em Portugal 2016/2017 – 2020/2021”.

Apesar da grandeza dos números, a grande maioria dos professores nunca falta ou falta menos de 10 dias por ano e por isso “nem é justa a ideia de imaginar que as escolas ficam abandonadas”, lê-se no estudo a que a Lusa teve acesso.

A professora Isabel Flores acrescenta que os níveis de absentismo entre os professores das escolas públicas são semelhantes aos das restantes classes da Administração Pública.

Entre 30% e 40% dos professores nunca faltam e outros 50% faltam menos de dez dias por ano, havendo um grupo de 10% que é responsável por 80% dos dias de faltas.

A saúde é o principal motivo das faltas e, em metade dos casos analisados, são doenças crónicas que justificam as ausências, mas também há muitos registos de doenças pontuais (25%).

Em declarações à Lusa, a professora sublinhou que o envelhecimento da classe docente acaba por ter influência no absentismo: Entre os 40 anos e os 55 anos os professores apresentam menos faltas de longa duração (5%), a partir dos 62 anos os casos aumentam exponencialmente (20%).

“A possibilidade de os professores terem faltas de longa duração é sete vezes maior entre os docentes que já tinham faltas de longa duração no ano anterior”, acrescentou.

Olhando para o mapa de Portugal percebe-se que existem “pequenas manchas territoriais” onde as faltas de longa duração são mais frequentes, nomeadamente nas regiões da Beira Baixa e do Alto Tâmega.

Fazendo um ‘zoom’, destacam-se os concelhos de Proença-a-Nova e Idanha-a-Nova, seguindo-se Penedono e Freixo de Espada à Cinta e finalmente Montalegre e Vimioso.

A Sul do Rio Tejo, apenas Borba apresenta uma percentagem elevada de professores com faltas com duração superior a 30 dias.

O estudo revela ainda que no ano em que a pandemia de covid-19 foi declarada, o absentismo disparou também nas escolas: No ano letivo de 2020/2021, houve mais de meio milhão de dias de faltas do que o padrão dos anos anteriores, que rondou sempre os dois milhões.

As questões de saúde são a principal razão das faltas dos professores, mas também existem outros motivos como questões cívicas, incluindo a adesão a greves: “No ano letivo de 2017/2018, apesar de mediaticamente visíveis, as greves representaram apenas 4% das faltas”, lê-se no estudo.

Os investigadores fizeram também um retrato mais alargado dos professores: quem são, que tipo de contratos os liga às escolas, como são os seus horários e quais as disciplinas que lecionam. 

O retrato é o de uma classe envelhecida e mais concentrada no litoral do país. No ano letivo de 2020/2021, a média de idades dos professores era de 51 anos, sendo que 19% já tinha mais de 60 anos.

Nas escolas, há cada vez menos alunos e mais professores. Ao longo dos cinco anos em análise verificou-se um aumento de professores contratados que foi equivalente à redução de efetivos.

Dificuldades em substituir docentes de baixa justificam alunos sem aulas

A dificuldade em substituir temporariamente professores de baixa é o principal motivo para os casos de alunos sem aulas, segundo o estudo, que nega a falta de docentes do ensino básico ou secundário.

“Neste momento, não temos falta de professores para as colocações permanentes e anuais. Nós temos é uma enorme dificuldade em substituir os professores que estão fora do sistema por ausência de longa duração”, disse à Lusa Isabel Flores, coordenadora do estudo.

Isabel Flores lembrou que nos vários concursos nacionais há sempre excesso de candidatos para as vagas que abrem e que o problema dos alunos sem aulas ganha dimensão quando um docente fica doente.

O estudo revela que a maioria dos professores nunca ou raramente falta às aulas e que apenas 10% dos docentes são responsáveis por mais de 80% de todas as faltas.

Com uma classe cada vez mais envelhecida – a média de idades em 2020/2021 estava nos 51 anos – aumentam os professores doentes: As faltas de todos os docentes equivalem a “cerca de dois milhões de dia por ano”, segundo o estudo a que a Lusa teve acesso.

Diariamente faltam 11 mil professores ao trabalho e essa ausência significa que, todos os dias, há cinco mil turmas em que falta, pelo menos, um docente, revelou Isabel Flores.

Mas “substituir é muito mais difícil do que criar um posto de trabalho”, alertou a coordenadora, explicando que são poucas as pessoas disponíveis para aceitar um emprego que pode ser de apenas uns dias, uma vez que dura apenas enquanto alguém está de baixa médica.

Além disso, a maioria dos docentes que ficam doentes têm redução de horário, por causa da avançada idade ou por acumularem outros cargos nas escolas. Resultado: Menos horas de aulas significam um salário mais baixo.

“Muitas pessoas não estão disponíveis quando são chamadas para ocupar uma vaga muito temporária e em condições salariais muito deficitárias”, disse Isabel Flores.

Segundo a coordenadora, “há muitos professores disponíveis a entrar no sistema se tiverem um contrato anual, mas não estão disponíveis para um contrato mensal, porque as pessoas organizam as suas vidas”.

Isabel Flores defende uma reconfiguração da gestão dos professores nas escolas, que deveria passar pela criação de uma bolsa de docentes com contratos anuais. Estes professores podiam dar apoio nas escolas e, quando fosse preciso, estavam disponíveis para substituir colegas doentes.

“Se abrirmos uma vaga anual com um contrato de trabalho e essa pessoa estiver no seio de uma região, que pode ser um ou mais agrupamentos de escolas, com um contrato anual nós conseguimos contratar. Uma coisa completamente diferente é nós dizermos: surgiu uma vaga de um professor que tem uma baixa de um mês”, sublinhou.

O estudo hoje divulgado revela que o número de professores que entraram nas escolas em regime de substituição equivale, na maioria dos anos, a 85% dos professores que faltaram mais de 30 dias.

Sobre quantos professores seriam precisos, Isabel Flores disse que ainda vão fazer essas contas, estimando-se que possam passar os 20 mil docentes.

“Quando as substituições eram feitas aos 30 dias, eram precisos cerca de 15 mil professores por ano para substituir”, disse, explicando que este valor equivale a cerca de 10% do universo dos professores das diversas áreas disciplinares.

Mas, desde que as substituições passaram a ser feitas aos 12 dias, o valor “aumentou substancialmente, passando para mais de 20 mil”.

Bolsa com 20 mil professores punha fim a alunos sem aulas

A investigadora Isabel Flores estima que, para acabar com os casos de alunos sem aulas, seria preciso criar uma bolsa com cerca de 20 mil professores, disponíveis para substituir os docentes que faltam.

Os professores do ensino básico e secundário dão quase dois milhões de dias de faltas por ano, sendo muitas vezes substituídos por colegas, revela o estudo. No entanto, todos os dias cerca de cinco mil turmas são afetadas por este absentismo.

Em declarações à Lusa, a coordenadora do estudo, Isabel Flores, defendeu que um dos principais motivos para a existência de turmas sem professores é a dificuldade em substituir os professores.

Para Isabel Flores, a solução deveria passar pela criação de uma bolsa com professores com contratos que lhes dessem estabilidade.

Em vez de as escolas tentarem encontrar alguém disponível para trabalhar apenas algumas horas enquanto o colega não regressa ao trabalho, era criada uma bolsa de docentes que poderiam dar apoio à escola e, quando fosse preciso, substituíam colegas, exemplificou.

“O sistema educativo deve preparar-se todos os anos para substituir 12% dos seus docentes por razões de doença”, refere o estudo, indicando que essas substituições têm, maioritariamente, uma duração de 120 a 240 dias.

Isabel Flores estima que sejam precisos cerca de 20 mil docentes, sendo que nem todas as disciplinas necessitam do mesmo numero de professores.

Tendo em conta estas variáveis, os investigadores concluíram que a bolsa de recrutamento deveria ter cerca de 3.200 docentes de 1.º ciclo, que poderiam ser chamados ao longo do ano para substituir colegas.

A bolsa teria também 1.485 docentes de Educação Pré-Escolar, 1.167 professores de Português e outros tantos de Educação especial (1058). Na lista, seguem-se os de Matemática e Inglês (com 700 e 654, respetivamente), até chegar ao fim da tabela com a definição de apenas 12 professores de Eletrotecnia.

O estudo mostra também quem são e que tipo de contratos liga os professores às escolas portuguesas, assim como revela como são geridos os horários e quais as disciplinas que lecionam. 

O retrato é o de uma classe envelhecida e mais concentrada no litoral do país. Há cada vez menos alunos e cada vez mais professores,  que devido à avançada idade mas também cargos que desempenham nas escolas, acabam por ter uma redução da componente letiva.

A investigadora sublinha que em Portugal existe um “rácio baixíssimo” de alunos por professores: No 1.º ciclo ronda entre os 11 e 12 alunos por docente e nos restantes ciclos baixa para 6 ou 7 alunos por professor.

“É muitíssimo baixo, porque as turmas são pequenas, ao contrário do que é vulgarmente espalhado. Em Portugal temos turmas pequenas, temos turmas maiores em Lisboa e no Porto, que são zonas de maior pressão populacional, mas depois no interior são turmas muito pequenas”, salientou, garantindo que é um dos valores mais baixos da OCDE.

A professora salientou que neste momento ainda não são apresentadas recomendações para políticas públicas, mas estas serão incluídas no estudo final.

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