Minutos de tragédia em que o pior até foi evitado: tudo o que se sabe sobre o colapso da ponte de Baltimore

26 mar, 22:32

Ainda se procuram vítimas na água que chegou a estar com temperaturas negativas. Autoridades descartam intencionalidade no acidente com um navio que já tinha dado vários problemas

À hora a que a ponte Francis Scott Key colapsou não se sabia quase nada. Havia um vídeo estranho que mostrava um barco, o DALI, a ir contra um dos pilares e a estrutura a desfazer-se como se fosse uma folha de papel. Não havia informações sobre vítimas ou sobre a causa do acidente que marcou o dia internacional. Várias horas depois há muito que continua por responder, até porque ainda há desaparecidos na gélida água que corre debaixo da ponte de Baltimore.

Minuto a minuto: o colapso (horas locais, mais quatro horas em Lisboa)

00:28: o cargueiro DALI deixou o porto e começou a mover-se para um longa viagem que tinha como destino Colombo, no Sri Lanka, de acordo com dados da Marinha analisados pela CNN;

01:24: as luzes do DALI piscam à passagem pelo rio Patapsco, de acordo com o vídeo;

01:26: o navio começa a mudar de rota e vai em direção ao pilar da ponte, mostra a análise da CNN;

01:26: as luzes do navio continuam a piscar;

01:27: o navio colide com a ponte, causando o seu colapso quase imediato, confirmou a Guarda Costeira, que destacou logo pessoal para o local;

01:40: as autoridades começam a reencaminhar chamadas para os bombeiros. À medida que começam a responder, os bombeiros recebem relatos de pessoas na água;

01:50: chega a primeira unidade de resgate ao local e confirma o colapso total da ponte.

Quantas pessoas estavam no local?

A informação inicial apontava que estavam no local sete pessoas e que todas tinham sido dadas como desaparecidas. Isto às 01:30 locais, e quando os serviços de emergência recebiam chamadas sem parar a relatar que um navio tinha colidido com a ponte.

“É uma emergência terrível. O nosso foco está em resgatar as pessoas”, afirmava pela mesma altura, à agência Associated Press, o diretor de comunicação dos bombeiros de Baltimore.

Na altura falava-se no “desenvolvimento de um evento de acidente em massa”, confirmando-se depois que estavam pessoas a trabalhar na ponte na altura do impacto. Rapidamente se destacaram equipas de mergulhadores para o local.

Mais tarde soube-se que os sete desaparecidos passaram a duas pessoas levadas para o hospital e seis desaparecidos. Os bombeiros chegaram mesmo a relatar à CNN que havia 20 pessoas desaparecidas.

Fontes: Google (imagem), Comandante dos Bombeiros de Baltimore, MarineTraffic, Maryland Transportation Authority, StreamTime LIVE, This Morning

Gráficos: Lou Robinson e Henrik Pettersson, CNN

Evitou-se o pior

Mesmo que ainda não se perceba a real dimensão do caso, uma coisa é certa: se não fosse um aviso do navio a situação podia ter sido pior.

O DALI soltou a âncora ainda antes de bater na estrutura e depois de perder velocidade, como mandam os procedimentos de emergência, de acordo com a Autoridade Portuária de Singapura, de onde era a bandeira do navio que estava ao serviço da dinamarquesa Maersk. Em paralelo fazia piscar incessantemente as luzes, num claro sinal de que algo não estava bem. E não estava: a tripulação tinha perdido o controlo da embarcação.

Foi a perda dessa propulsão, de acordo com as autoridades, que terá levado à perda de controlo dos comandos, resultando na colisão.

Além disso, uma chamada feita a partir do navio a alertar para a situação deu tempo às autoridades para fecharem o tráfego na ponte e evitar que mais carros lá estivessem, confirmou o governador do Maryland, Wes Moore.

“Estou grato que, assim que o aviso chegou, houve um alerta, o que literalmente evitou que mais carros fossem para a ponte. Essas pessoas são uns herois. Salvaram vidas”, acrescentou, reiterando que o barco tinha avisado as autoridades da perda de potência e tinha emitido um aviso mayday.

Para investigar o que aconteceu estão no local dezenas de equipas, incluindo da autoridade que fiscaliza os transportes em solo norte-americano. Da NTSBC estão 24 especialistas, entre os quais administradores, informáticos ou até recursos humanos.

Um navio de carga com problemas anteriores

O cargueiro DALI foi inspecionado por 27 vezes desde a construção, em 2015. De acordo com os dados do Sistema de Informação de Qualidade Eletrónica de Navegação, citados pela CNN, foram encontradas duas “deficiências” nessas avaliações.

Em junho de 2023, no Chile, as autoridades assinalaram uma “deficiência” na “propulsão e na maquinaria auxiliar”, incluindo nos termómetros.

Antes disso, em 2016, as autoridades belgas atribuíram “deficiência” por “condições estruturais”, falando em “danos no casco que afetam a navegação”. Foi um acidente na cidade de Antuérpia, onde bateu no cais depois de uma avaria ter resultado num forte impulso da popa.

A última inspeção tinha sido em 9 de setembro de 2023, tendo sido feita pela Guarda Costeira de Nova Iorque, que não encontrou quaisquer problemas.

Navio embateu no pilar e a ponte desfez-se como uma folha de papel (Roberto Schmidt/AFP via Getty Images)

Condições muito complicadas

Um resgate desta dimensão nunca seria difícil, mas um conjunto de fatores tornou tudo muito mais complicado. Era início da madrugada numa cidade onde o frio é intenso durante grande parte do ano.

Os mergulhadores admitiram logo que o frio, fora e dentro de água, além da visibilidade limitada, colocavam em causa as suas operações. O diretor de comunicações dos bombeiros de Baltimore confirmou à CNN que as autoridades trabalhavam em condições difíceis, nomeadamente com a temperatura exterior de um grau negativo.

"Isto aconteceu à 01:30 com uma visibilidade limitada. Estamos a trabalhar agressivamente, a considerar as temperaturas do ambiente e da água para tentar resgatar as pessoas", afirmava Kevin Cartwright no início da operação.

Era aí que a temperatura estava a um grau negativo, mas as notícias eram piores: o responsável avançava que a água estaria ainda mais gelada.

Vista aérea do momento do acidente em Baltimore (Maxaar Technologies via AP)

Qual é a importância desta ponte (e do porto)?

Trata-se de uma "ponte muito importante" para a região, avançou o correspondente da CNN, Gabe Cohen. Um acidente "significativo" desta dimensão, numa ponte com 366 metros de comprimento, que liga o rio Patapsco ao porto de Baltimore, um dos mais importantes da costa este norte-americana.

Com mais de 52 milhões de carga movimentada em 2023, este porto rendeu aos Estados Unidos cerca de 74 mil milhões de euros, tornando-se no nono porto que mais faturou em 2023 no país.

Ao todo este porto é responsável por 15.330 empregos diretos e mais de 139 mil postos de trabalho em todo o Maryland. Basicamente, a população de Baltimore vive à volta do porto. É também ali que chega a maioria dos carros e carrinhas importados - só no ano passado foram 850 mil. Mas este é também o porto líder na agricultura e na maquinaria, além de importação de açúcar na exportação de carvão, na qual é o segundo mais importante.

Com este colapso há uma ameaça de todas as operações em torno do local. A Maersk, que tinha fretado o navio, já anunciou a suspensão de todas as operações por aquela rota.

A ponte abriu em 1977, tendo sido apelidada pelo autor do hino norte-americano, "The Star-Spangled Banner". Terá sido ali que Francis Scott Key se sentou a ver o bombardeamento do Forte McHenry em 1814, o que o inspirou a escrever a letra.

A reação das autoridades

O presidente dos Estados Unidos quer o governo federal a pagar os custos da reconstrução da ponte de Baltimore. Essa foi uma das mensagens fortes de Joe Biden, que prometeu fazer de tudo para ajudar a cidade, incluindo mover fundos federais.

“É minha intenção que o governo federal pague o custo inteiro da reconstrução da ponte”, disse, a partir da Casa Branca, esperando que o Congresso “apoie o esforço”, até porque “vai levar algum tempo” a transferir os fundos e a chegar a um acordo.

Uma reação relativamente tardia que também serviu para confirmar o que o FBI já tinha dito: o caso não foi intencional e não há qualquer ligação a terrorismo.

Ainda antes disso o governador do Maryland decidiu declarar estado de emergência, para depois o autarca de Baltimore fazer o mesmo, mas por um período de 30 dias.

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