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Para a oposição que há, este Governo basta

23 mar 2022, 21:22

O novo Governo ainda nem sequer tomou posse e António Costa já levou um raspanete do Presidente da República, que não gostou de ver desfiados na televisão os ministros antes da audiência desta quarta-feira. E talvez este seja o primeiro sinal do que nos espera nos próximos quatro anos de maioria absoluta socialista.

Costa enxugou o Governo, mas não resistiu à tentação de o transformar numa espécie de aparelho do PS. Com os cinco magníficos – Mariana Vieira da Silva, Pedro Nuno Santos, Fernando Medina, José Luís Carneiro e Ana Catarina Mendes –, temos a certeza de que sobrará pouco espaço para mais egos dentro do Conselho de Ministros e, assim como assim, lá se cumpre o mandamento de Lao Tsé: “Mantém os teus amigos por perto e os teus inimigos ainda mais perto”. 

Se a estes cinco juntarmos Duarte Cordeiro – que sobe a ministro do Ambiente —, consegue-se retirar uma segunda ilação: que Costa vê o governo de um país como uma espécie de estágio político para outro tipo de voos e de ambições.

Mas o novo Executivo dá-nos vários outros sinais. O primeiro é que a Justiça e a Segurança Social, dois setores que esperam há anos para serem reformados, vão ficar exatamente na mesma ou ainda pior. Nestes dois ministérios, as escolhas de António Costa recaíram sobre figuras sem qualquer peso político e, no caso de Ana Mendes Godinho, com um histórico governativo pouco abonatório. E é uma pena que se perca mais esta oportunidade: se há momento para se fazerem grandes reformas é quando se tem maioria absoluta.

Não deixa também de ser significativo que todas as grandes bandeiras que António Costa ergueu há seis anos como absolutamente críticas para o desenvolvimento do país, agora já não o sejam. O Mar, essa enorme fonte de riqueza que merecia um ministério próprio, afinal, agora, já pode ser ali “enfiado” na Economia. A Modernização Administrativa e as vacas que voavam deixaram de voar, como se os problemas estivessem todos resolvidos.

Há depois os “cabeças de cartaz”: Elvira Fortunato na Ciência e Ensino Superior e António Costa Silva na Economia. As honrosas excepções que vêm da chamada sociedade civil para duas pastas essenciais para o país. O percurso dos dois, o que já deram ao país e o que já provaram são cartão de visita mais do que suficiente para podermos dizer que são boas surpresas. A dúvida, que só o tempo resolverá, é saber que condições vão ter para fazerem o seu trabalho. De que adianta ter uma das melhores cientistas do país num governo, se não lhe derem um tubo de ensaio e os vários reagentes para as mãos? De que adianta ter um homem cheio de experiência no mundo empresarial, se não lhe for dado o peso político no Conselho de Ministros para tirar o país da letargia económica por onde tem andado? A ver.

Mas a marca mais evidente deste Governo é mesmo o à vontade com que António Costa se sente neste novo quadro político. Uma maioria absoluta e uma oposição quase inexistente dão para tudo. Para fazer um Governo onde parece que muda quase tudo, ficando quase tudo na mesma.

António Costa sabe que o centro-direita vai demorar tempo a rearrumar-se e que uma maioria absoluta lhe dá mais tempo de estado de graça do que uma geringonça à esquerda. Se a isto acrescentarmos uma guerra na Europa, os próximos tempos — por mais conturbados que sejam — prometem ser um passeio no parque para o primeiro-ministro. Sobra o Presidente da República que, antes mesmo de dar posse ao novo Governo, já foi obrigado a ser o fiel da balança da nova maioria absoluta. Porque, para a oposição que temos, este Governo basta.

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