opinião
Advogada e Especialista em matérias de segurança e defesa

Ano novo, política nova: valorizar as Forças Armadas como prioridade e imperativo nacional

5 jan, 17:43

No ano que agora se inicia, Portugal comemora os cinquenta anos do 25 de Abril, a Revolução que nos trouxe “o dia inicial, inteiro e limpo” evocado por Sophia e data histórica indelével na qual deixámos para trás um regime autoritário e demos início a um processo vibrante de construção democrática. Nesta ação decisiva, que nos trouxe a Liberdade e que resgatou o futuro do país, as Forças Armadas portuguesas desempenharam o papel principal. A elas devemos a transição pacífica para a democracia e, por isso, as FA devem ser merecedoras da gratidão de todos os portugueses.   

A celebração do cinquentenário da democracia portuguesa tem lugar num tempo em que a guerra está de regresso à Europa. Após um longo período de trégua, no qual o nosso continente prosperou e assegurou um lugar de paz e desenvolvimento para milhões de pessoas, a guerra levada pela Rússia à Ucrânia expôs a fragilidade da ordem mundial, causando incerteza e reavivando temores que se julgavam ultrapassados entre os países democráticos ocidentais. 

A injustificada agressão russa, contudo, teve o condão de revitalizar a NATO e de tornar evidente para todos a sua pertinência e a atualidade da sua existência! Num momento em que alguns líderes europeus chegaram a vaticinar a morte cerebral da Aliança, como foi o caso do presidente francês Emmanuel Macron, ou em que se mostravam muito céticos face à necessidade deste sistema de defesa coletivo, antes preferindo criar um alternativo exército comum europeu, como o chanceler alemão Olaf Scholz, a Europa de forma mais alargada claramente compreendeu o óbvio: que a segurança europeia depende, e muito, da proteção americana que vem através da NATO. 

O conflito em curso na Ucrânia, que não tem fim previsível à vista, contribuiu diretamente também para a redefinição do panorama da segurança internacional. É hoje claro para todas as democracias ocidentais que existe uma necessidade contínua de reforçar a vigilância e de aprofundar a cooperação militar internacional para manter a paz e a estabilidade. O panorama de segurança e defesa é muito mais complexo hoje do que se poderia imaginar há apenas uns anos. Às ameaças reais de guerra física na Europa, somam-se as decorrentes do terrorismo internacional, da criminalidade organizada violenta transnacional, de redes internacionais de comércio ilícito, do tráfico de droga e de seres humanos, para não falar do cibercrime, muitas vezes financeiramente apoiado por Estados totalitários com interesse na desestabilização social e económica dos sistemas democráticos.  

Em Portugal, contudo, observa-se uma divergência preocupante entre a necessidade evidente de fortalecer as Forças Armadas – face a este novo contexto mais amplo e vasto de ameaças, que exigiriam uma redefinição do seu papel e abrangência de atuação – e a triste, manifesta e inegável realidade do seu declínio. Desde já afirmo que não tem que ser assim, não deve ser assim e não pode ser assim. Portugal tem que saber ler o passado e honrar a história das suas FA, mas sobretudo tem que perceber que elas são imprescindíveis e absolutamente necessárias a Portugal, à sua soberania e integridade territorial e são insubstituíveis na segurança e defesa do país. Este não é um tema retórico ou de conceção ideológica, é uma evidência perante o mundo instável e crescentemente inseguro no qual vivemos. 

Compete ao titular da pasta da Defesa fazer compreender ao Conselho de Ministros, e em particular ao Ministro das Finanças, que há investimentos imprescindíveis e inadiáveis que têm de ser feitos, em pessoas e em equipamentos. Temos obrigações a cumprir no âmbito da NATO e devemos cumpri-las, em nosso próprio benefício. Isto não pode estar em causa. Sem prejuízo da relevância das políticas de igualdade de género, que marcaram quase de forma exclusiva os anos mais recentes da governação política da instituição militar, convenhamos que é muito, mas muito poucochinho e escasso face ao papel que se espera de um Governo para as FA.

Meio século volvido da Revolução de Abril – e num contexto de múltiplas ameaças – as FA portuguesas têm que sair da encruzilhada de esquecimento e desvalorização em que foram postas e entrar numa rampa de reconhecimento e de valorização. E isso só acontecerá com mudança de políticas e com o reconhecimento por parte do Governo do país de que o tempo das ameaças e das incertezas não é passageiro e transitório, mas uma realidade infelizmente mais perene, e que as FA são um elemento integral e vital do Estado, dedicado ao serviço da nação e dos seus cidadãos, e essenciais para a sua proteção, segurança e defesa.

A melhor forma de celebrarmos a liberdade é celebrarmos em liberdade.  E só seremos verdadeiramente livres, se nos sentirmos seguros e livres de ameaças. Nas próximas eleições devemos, como país e como povo, também escolher que caminho e vida queremos para as nossas FA e, por conseguinte, para a nossa própria soberania e liberdade. 

Colunistas

Mais Colunistas

Mais Lidas

Patrocinados