Caso Sara Carreira. MP pede penas de prisão suspensas para três arguidos e multa para um: "Assobiaram todos para o lado"

Inês Pereira , AM - notícia atualizada às 12:50
24 nov 2023, 10:27
Sara Carreira

 

 

 

Três dos quatro arguidos do processo, entre os quais o ator Ivo Lucas e a fadista Cristina Branco, estão acusados de homicídio por negligência. Leitura da sentença está marcada para 12 janeiro

O Ministério Público deu como provados todos os factos da acusação no caso do acidente que vitimou Sara Carreira a 5 de dezembro de 2020 na A1, junto a Santarém, e pediu, esta sexta-feira, pena de prisão suspensa superior a 2 anos e meio para Ivo Lucas, pena suspensa superior a um ano para Cristina Branco, pena suspensa superior a três anos e meio para Paulo Neves e multa para Tiago Pacheco. A leitura da sentença ficou marcada para 12 de janeiro às 9:30.

A fadista Cristina Branco está acusada de homicídio por negligência, passível de pena de prisão até três anos, enquanto Ivo Lucas  está acusado de para homicídio negligente na forma grosseira, passível de pena de prisão até cinco anos. O mesmo crime foi imputado a Paulo Neves. O quarto arguido, Tiago Pacheco, está acusado de condução perigosa de veículo.

Esta sexta-feira, no Tribunal de Santarém, o procurador do Ministério Público começou por apresentar os pêsames aos pais, amigos e namorado de Sara Carreira antes de começar as alegações do caso. Fazendo referência ao número de mortes nas estradas nacionais, o procurador referiu que se continua a assistir a condutores alcoolizados na estrada e como foi o caso do dia do acidente que vitimou a filha de Tony Carreira.

"Pela visualização do vídeo as imagens falam por si, não estava nevoeiro, havia visibilidade a dois quilómetros, chuva miudinha que não colocava obstáculos. O primeiro impacto terá acontecido as 18:44 e a análise ao sangue a Paulo Neves só aconteceu as 22:30. A análise foi feita mais de três horas depois do primeiro embate. No final o resultado era de 1,18g/l", afirmou.

O procurador falou ainda da garrafa de vinho consumida pelo arguido Paulo Neves ao lanche, referindo que na altura do embate a taxa tinha de ser bem mais superior à registada na análise, o que acabou por não lhe permitir ter o comportamento normal de alguém numa situação de acidente.

“O arguido Paulo Neves fez zero. Não ligou para o INEM, não vestiu colete, não colocou triângulo. Seguia até abaixo da velocidade sem ter noção".

Quanto à arguida Cristina Branco, o Ministério Público considera que esta "ia distraída", apontando que neste primeiro embate que "há culpa de Paulo Neves, mas também de Cristina Branco", cuja viatura acionou automaticamente os quatro piscas.

Ivo Lucas e Cristina Branco (DR)

Já o carro onde seguiam Ivo Lucas e Sara Carreira percorreu 500 metros sem perceber que estava um acidente à frente uma vez que o ator "também estava distraído".

Quanto ao arguido Tiago Pacheco, cujo carro embateu no veículo de Ivo Lucas e Sara Carreira, "é evidente que circulava em excesso de velocidade".

Para o Ministério Público, os factos da acusação foram considerados todos provados.

"A conduta dos arguidos agravou ou não o resultado? Todos eles com as suas condutas levaram ao falecimento de Sara. Devem ser condenados pelas suas práticas", afirmou o procurador do MP, acrescentando que "os arguidos ainda não interiorizaram as suas condutas. Assobiaram todos para o lado".

Esta sexta-feira foi ouvida em tribunal uma testemunha arrolada pela defesa de Ivo Lucas, o agente do ator, que perante o Tribunal de Santarém, afirmou que o "cliente e amigo é um excelente profissional, muito humano, de bom trato".

"O Ivo é um pacificador. Muito respeitado por todos. O Ivo antes do acidente era uma pessoa feliz, apaixonado, com carreira numa boa fase. A seguir ao acidente o Ivo passou a ser uma pessoa triste. Que precisa de ter a vida reconstruída", afirmou João Louro.

Pais de Sara Carreira "não querem qualquer indemnização"

Depois das alegações do Ministério Público, o advogado dos pais de Sara Carreira, Magalhães e Silva alegou perante o tribunal, afirmando que Tony Carreira Fernanda Antunes "não querem qualquer indemnização", queriam "apenas o reconhecimento humano que houve comportamento errado"

"Todo este quadro de sofrimento e angústia foi enfatizado pelos arguidos terem assobiado para o lado. Tinha bastado um pedido de desculpa e mais rapidamente se teria conseguido a paz social que agora só se vai conseguir com esta sentença", afirmou.

Segundo o advogado, a atuação de Ivo Lucas é a de quem "circulava numa velocidade absolutamente excessiva" e "desatento".

"O arguido Ivo Lucas podia ir até a 90km/h, mas pelos carros que passaram pelo acidente é evidente que estava desatento. Houve vários carros que passaram pelo primeiro acidente e não embateram".

Já quanto a Paulo Neves, Magalhães e Silva diz não haver "todas a certezas de que a taxa de álcool do arguido era apenas 1,18". "1,18 tinha seguramente, é evidente que circulava aquela velocidade porque estava bêbedo (expressão pela qual pediu desculpa posteriormente). A sua contribuição para o acidente é evidente".

"Quanto a Cristina Branco, não sei quais as circunstâncias de ter um acidente com um filho, no entanto, ia distraída e a uma velocidade superior que lhe permitisse evitar o embate", afirmou.

O advogado, que considerou as penas pedidas pelo MP ajustadas, disse ainda que a sentença é importante pela difusão que o caso tem, "não por se tratar da filha de Tony Carreira, mas porque será uma forma de prevenção pelo que não se deve fazer na estrada e porque não se pode assobiar para o lado".

"Atuação de Paulo Neves, por si só, não provocou a morte de Sara"

A advogada de Paulo Neves considera que a atuação do seu cliente, "por si só, não provocou a morte de Sara, ouve a atuação dos restantes condutores". Admitindo que o "arguido conduzia com taxa de álcool acima da permitida por lei, bem como circulava abaixo da velocidade mínima na autoestrada", a advogada diz a reação de Paulo Neves no acidente terá sido natural.

"Parece-me natural que na sequência de um embate o arguido estivesse combalido sem capacidade de reação para sair da viatura, colocar triângulo", afirmou, acrescentando que "passaram carros por Paulo Neves antes de Cristina Branco.

A advogada Carla Santos admitiu a pena suspensa para Paulo Neves.

Cristina Branco não assistiu ao julgamento

A advogada de Cristina Branco apresentou um relatório médico que atesta que a arguida não está em condições psicológicas para assistir ao julgamento. Perante o tribunal, afirmou que "não existe esta coisa do tempo de reação universal".

"Estamos aqui a discutir que Cristina Branco tinha um segundo para perceber a situação e sete para reagir. Estamos aqui a falar de uma grande falha de análise. Nós não podemos dizer que quando Cristina Branco viu a viatura devia ter visto que não estava parado! É uma situação inesperada. Aquela velocidade 30 quilómetros era imperceptível. Como é que um condutor nestas circunstâncias tem apenas um segundo para reagir e sete para começar a travar e desviar? Em autoestrada não é expectável encontrar um objeto", alegou a defesa da fadista, considerando que "matematicamente é impossível que tivesse evitado a colisão".

A advogada Carmo Afonso considerou ainda que "Paulo Neves causou um perigo que Cristina Branco não poderia ter evitado".

"Este tribunal não pode imputar responsabilidade à única condutora que respeitou todas as regras. Não ficou aqui provado nada que demonstre a culpa nesta primeira colisão. Passaram 8 carros pelo carro imobilizado na faixa central, sendo que Cristina branco também se lembra de passar um camião", alegou Carmo Afonso, considerando que "Cristina Branco não pode ser responsável por homicídio".

"Ivo Lucas não andou a assobiar para o lado"

Perante o tribunal, o advogado de Ivo Lucas garantiu que o seu cliente "não mostrou falta de arrependimento".

"O senhor Ivo Lucas não andou a assobiar para o lado e não mostrou falta de arrependimento. Não posso deixar de manifestar o meu espanto por apontarem o senhor Ivo Lucas de culpado", afirmou Rodrigue Devillet Lima, considerando que "do ponto de vista emocional, a carga que aqui está é simbólica".

Relacionados

Crime e Justiça

Mais Crime e Justiça

Patrocinados