E, de repente, há millennials a entrar na meia idade. Eis os mitos e as realidades de quem pertence a essa geração tão criticada por outras.
Durante anos acreditei em muito do que ouvia sobre millennials - aqueles narcisistas fotógrafos de selfies, que comem torradas de abacate, bebem café com leite, ainda vivem nas caves dos pais e não conseguem organizar as suas vidas.
Depois apercebi-me de algo que me surpreendeu: eu sou um millennial, tal como muitas das pessoas que conheço e amo.
Durante muito tempo, pensei que os meus amigos e colegas de turma eram mais velhos e mais sábios do que este grupo geracional de tão má fama. Mas quando comecei a fazer a cobertura de dados demográficos para a CNN, soube que 1981 é o ano de nascimento que muitos investigadores identificam como o início da geração do milénio.
Eu nasci em 1982. Em 2022, fiz 40 anos. Tal como milhões de outros millennials nos Estados Unidos.
É isso mesmo: a geração há muito retratada como jovem e ingénua está a entrar na meia-idade.
É um marco notável e uma boa oportunidade para chamar a atenção para algo importante: o Mito da geração Millennial é muito diferente da realidade que muitos de nós vivemos.
Mito 1: só pensamos em nós próprios
Em maio, o meu marido viajou para fora da cidade e eu estava a cuidar sozinha da nossa filha pela primeira vez. “Eu consigo fazer isto”, pensei, tentando tranquilizar-me. “Não vai ser assim tão difícil.” Depois, uma noite, os dois primeiros dentes da minha filha começaram a sair das gengivas. Quando a vi no monitor de bebé que ela se revolvia no berço durante o que provavelmente foram apenas alguns minutos, mas que me pareceram uma eternidade, acabei por pegá-la ao colo durante o resto da noite para a confortar.
Os millennials como eu estão demasiado ocupados a fazer malabarismos com as nossas responsabilidades no trabalho e a cuidar dos outros em casa para serem tão obcecados consigo próprios como temos sido retratados ao longo de todos estes anos.
No esquema das coisas difíceis pelas quais os novos pais podem passar, isto não foi nada de especial. Mas eu estava exausta. E ela também.
Quando o sol nasceu, sentámo-nos juntas no chão do quarto dela, com os olhos a desmaiar. O pijama dela estava coberto com o Tylenol infantil com sabor a cereja que ela tinha cuspido quando lho tentei dar de noite. Mas durante alguns minutos nessa manhã, brincámos e ela sorria, parecia que tínhamos ultrapassado uma maratona e que podíamos finalmente relaxar.
Depois o meu telemóvel tocou com uma notícia inesperada e devastadora.
A minha mãe tinha morrido nessa manhã.
Fiquei abalada, atónita e a chorar. Olhei para a minha filha a brincar ao meu lado. Havia tantas perguntas que eu gostaria de ter feito à minha mãe sobre como cuidar dela... Em vez de telefonar à minha mãe nesse dia para lhe pedir conselhos, corri para Michigan para ajudar a planear o seu funeral.
De repente, o mesmo ano em que me tornei mãe tornava-se o ano em que também perdi a minha mãe.
Faltavam menos de dois meses para o meu 40º aniversário.
Os millennials apareceram na capa da revista TIME há quase uma década, sob o título "THE ME ME ME GENERATION" [à letra, “A GERAÇÃO EU EU EU”], cimentando a nossa imagem de auto-obsessão.
Mas para mim e para muitos outros, o que realmente significa ser um millennial hoje em dia é algo de muito diferente. Somos a mais recente geração “sanduíche”, sentindo uma pressão crescente entre criar os filhos mais pequenos e cuidar dos familiares mais velhos - ou, pelo menos, a querer cuidar deles, tendo em conta tudo o que fizeram para cuidar de nós, mas com dificuldade em saber o que fazer.
Os millennials como eu estão demasiado ocupados a fazer malabarismos com as nossas responsabilidades no trabalho e a cuidar dos outros em casa para serem tão obcecados consigo próprios como temos sido retratados ao longo de todos estes anos.
Tal como todas as gerações anteriores, estamos a crescer. Mas o mito da geração do milénio há muito que está desfasado da verdade.
Durante anos, por exemplo, as manchetes diziam que os millennials não estavam a ter filhos. A realidade, porém, é mais complicada, de acordo com Kim Parker, diretora de investigação de tendências sociais no Pew Research Center, nos EUA.
“As mulheres estão a ter filhos mais tarde. Mas quando olhamos para a fertilidade completa, não vemos que estejam necessariamente a ter menos filhos, apenas a começar mais tarde”, diz Parker. “Isso representa uma distância temporal, não necessariamente uma forma completamente diferente de abordar a vida familiar.”
Jason Dorsey, que escreveu vários livros sobre a geração millennial e fez carreira a ajudar as empresas americanas a compreendê-la melhor, afirma que os memes sobre a geração millennial egoísta não correspondem à realidade.
“Os millennials mais velhos dizem-nos que estão a ser puxados em três direções diferentes", afirma Dorsey, presidente do Center for Generational Kinetics, nos EUA. “Muitas vezes estão a tomar conta de um ou mais filhos. Estão frequentemente a tomar conta de um ou mais pais. E estão a tentar gerir os seus empregos. Por isso, tem muita coisa a acontecer e é uma altura muito stressante.”
As gerações passadas também entraram nesta fase da vida, diz Dorsey. Mas, desta vez, uma coisa é diferente.
“O que é novo é fazê-lo aos 40 anos”, diz ele, “com tantas pessoas a terem filhos muito pequenos”.
Muitos millennials de meia-idade, como eu, estão a sentir esta pressão mesmo nos nossos momentos mais alegres. E Dorsey diz que ainda há muita investigação a fazer sobre a forma como esta mudança está a alterar a nossa sociedade.
Como é que isto vai moldar o tipo de pais que nos tornamos, ou a forma como abordamos os nossos empregos, ou as escolhas que fazemos noutras partes das nossas vidas?
Mito 2: Todos partilhamos as mesmas experiências
Não é necessariamente surpreendente que, durante anos, eu não me tenha apercebido de que era uma dos mais de 72 milhões de millennials nos Estados Unidos.
Alguns especialistas argumentam que analisar a nossa sociedade utilizando rótulos de gerações é tão fiável e científico como utilizar o nosso horóscopo.
Eles defendem que muitos mais fatores podem moldar a vida de alguém além do ano em que ele nasceu - raça e estatuto socioeconómico, por exemplo. E quando se rotula e analisa todo um grupo de pessoas sem se aprofundar muito esses pormenores, acaba por perder-se nuances importantes sobre as mudanças sociais.
“Traçar linhas arbitrárias entre os anos de nascimento e atribuir-lhes nomes não ajuda”, escreveu Philip N. Cohen em 2021 num artigo de opinião do Washington Post. O professor de sociologia da Universidade de Maryland tem liderado um grupo de académicos que pressiona o Pew Research Center e outros a deixarem de promover rótulos geracionais.
Percebo o ponto de vista deles.
Alguns dos meus amigos mais jovens, na casa dos 20 anos, olham para mim com os olhos esbugalhados quando falo das cassetes de vídeo que vi enquanto crescia, ou de como era ouvir aquele tom delicioso, agudo e estático que significava que o computador de casa estava a ligar-se lentamente à Internet através de uma ligação telefónica. Os grandes acontecimentos que moldaram o nosso mundo ocorreram em alturas muito diferentes das nossas vidas. Eu estava na faculdade no dia 11 de Setembro [de 2001, dia dos ataques terroristas às Torres Gémeas em Nova Iorque, entre outros locais]; eles estavam na escola primária. Eu estava a tirar um curso superior e à procura de emprego durante a Grande Recessão; eles ainda viviam com os pais.
Há quem defenda que a diferença entre nós é tão grande que os millennials mais velhos como eu deviam ter a sua própria categoria (por vezes combinada com os membros mais jovens da Geração X). A nossa chamada microgeração foi apelidada de Xennials, Geração Oregon Trail e - mais recentemente e de forma controversa - millennials geriátricos.
“É importante não rotular todos aqueles que estão num intervalo de 20 anos como sendo iguais”, diz Erica Dhawan, investigadora, autora e consultora que cunhou o termo “Millennial Geriátricos” num artigo para a Medium no ano passado. Tal como eu, ela diz que nunca sentiu que o rótulo “millennial” fosse adequado para ela.
Toda a crítica feita aos millennials – foi feita em relação a todas as gerações, mas foram amplificadas pela Internet e pelas redes sociais". Lindsey Pollak, escritora e consultora
Para tornar as coisas ainda mais confusas, não existe uma definição concreta de quando começa e quando termina a geração millennial. O livro de 1991 que introduziu o termo afirma que os millennials nasceram em 1982. As definições amplamente citadas no site do Pew Research Center descrevem os millennials como os nascidos entre 1981 e 1996. Outros investigadores defendem a teoria de que os millennials nasceram no final da década de 1970 e até no início da década de 2000.
A forma como falamos de grupos de pessoas nascidas num determinado período - e os nomes que utilizamos para os descrever - pode mudar ao longo do tempo. A “geração Y” era a forma mais comum de rotular a nossa geração, antes de os “millennials” ganharem força.
Independentemente do nome ou da definição que se utilize, existe uma diferença de idade considerável entre os membros mais velhos e os mais novos da nossa geração, e um vasto leque de experiências de vida que todos nós tivemos.
Será que ainda há valor em olhar para as coisas desta forma?
“É uma lente útil, mas não é a única”, diz Parker, do Pew Research Center, “e é importante ter em conta todos os outros fatores que estão a causar estas diferenças, em vez do apenas fazer parte de uma geração”.
Agora que sei que sou um millennial, ainda não estou pronta para abandonar o rótulo. Mas quero ajudar a esclarecer as coisas e a eliminar estes estereótipos persistentes sobre a nossa geração (declaração de interesses: adoro tostas de abacate).
Mito 3: não queremos ter casa própria
A pergunta assombra-me a mim e ao meu marido, surgindo em conversas com amigos, entes queridos e até com estranhos.
“Estão a pensar comprar uma casa?”
Durante anos, esse marco não foi muito importante para nenhum de nós. Temos vivido em casas arrendadas e concentrado a nossa energia e finanças em fazer coisas de que gostamos no nosso tempo livre.
Mas agora que temos uma filha, comprar uma casa parece ser algo que já devíamos ter feito. Também parece algo que está cada vez mais fora do nosso alcance, uma vez que os custos da habitação continuam elevados e as taxas de juro dos créditos à habitação dispararam.
Não somos os únicos a sentir que estamos atrasados em dar esse grande passo, pelo menos segundo Kevin Mahoney, consultor financeiro em Washington especializado em ajudar a geração millennial.
“As pessoas estão muito stressadas por não serem proprietárias de uma casa”, diz. “Uma coisa que tento comunicar-lhes é que não há problema em arrendar. Estão a ganhar flexibilidade. Estão a ganhar tempo para descobrirem como querem que sejam os próximos 20 anos ou os próximos 10 anos.”
Apesar das frequentes críticas sobre o facto de os millennials não comprarem casa, Mahoney também salienta que muitos o fazem. Segundo ele, uma das razões para a crise da habitação nos Estados Unidos é o facto de haver mais millennials a entrar no mercado imobiliário.
»» Tornou-se mais difícil comprar uma casa se não se for já proprietário, o que torna muito difícil comprar uma casa se se estiver na casa dos 20 ou 30 anos e se se tiver arrendado durante anos. Gray Kimbrough, economista e professor
Os millennials mais velhos, com idades entre os 32 e os 41 anos, constituíram um quarto dos compradores de casa no ano passado nos EUA, de acordo com um relatório da Associação Nacional de Corretores de Imóveis, e os millennials têm sido a maior percentagem de compradores de casa desde 2014.
Mas, como já noticiou a CNN, muitos millennials estão em pior situação do que os seus pais.
E, nesta altura das suas vidas, é menos provável que a geração millennial tenha casa própria do que as gerações anteriores. Há uma boa razão para isso, diz Gray Kimbrough, economista e professor adjunto da American University, que tem recorrido repetidamente ao Twitter para desfazer mitos sobre a geração millennial.
“Tornou-se mais difícil comprar uma casa se não se for já proprietário”, diz ele, “o que torna muito difícil comprar uma casa se se estiver na casa dos 20 ou 30 anos e se se tiver arrendado durante anos”.
E isto para não falar do facto de a geração millennial ter enfrentado uma situação financeira muito mais sombria do que as gerações mais velhas, afirma Kimbrough.
“É muito difícil pensar em casar, ter filhos, sair de uma casa com colegas de quarto e fazer qualquer uma dessas transições com o mercado imobiliário como o que temos agora”, diz Kimbrough.
O meu marido e eu estamos a tentar não nos deixarmos abater por esta realidade assustadora.
Estamos a visitar “open houses” na maioria dos fins-de-semana e planeamos reunir-nos em breve com corretores de créditos à habitação.
Por esta altura, no próximo ano, esperamos estar a viver numa casa que seja nossa.
Mito 4: não levamos o nosso trabalho a sério e não nos mantemos nele durante muito tempo
Jason Dorsey diz-me que costuma fazer uma pergunta quando é convidado a visitar empresas e a falar com os seus empregados: “Quantos de vós são millennials?”
Geralmente, diz ele, apenas algumas mãos se levantam, timidamente.
“Eles supõem que sê-lo é negativo, porque, infelizmente, é assim que temos sido enquadrados nos últimos 15 anos”, diz Dorsey.
Foi por volta dessa altura que Dorsey diz ter visto intensificar-se a moda anti-millennial. Em 2007, houve num segmento do programa “60 Minutes” com o sinistro título “The Millennials Are Coming” [“Os millennials estão a chegar”].
O repórter Morley Safer não fazia rodeios na introdução da peça: “Uma nova geração de trabalhadores americanos está prestes a atacar tudo o que o você considera sagrado: desde dar ordens até à camisa branca passada a ferro e à gravata.”
E continuou: “O local de trabalho tornou-se um campo de batalha psicológico e os millennials estão em vantagem”, descrevendo uma geração capaz de “fazer várias tarefas ao mesmo tempo, falar, andar, ouvir, escrever e enviar mensagens”.
“Falavam de nós como se fôssemos extraterrestres”, recorda Dorsey.
Não vi esse episódio quando foi difundido; na altura, era repórter de um jornal, provavelmente a tentar cobrir notícias de última hora no turno da noite do fim-de-semana, com que iniciava a minha semana de trabalho muito mais longa do que 40 horas.
Acho que já nessa altura teria achado a premissa problemática, mas agora, com a clareza de uma visão retrospetiva, a história do "60 Minutes" parece quase caricatural - mais um capítulo de uma história tão antiga como o tempo. “Geração mais velha e ansiosa preocupa-se com a geração mais nova e ingénua que está a destruir tudo” poderia ter sido um título igualmente adequado.
A consultora e escritora Lindsey Pollak, que aconselha empresas sobre como gerir locais de trabalho multigeracionais, considera que a ascensão das redes sociais é em parte responsável pela má reputação de longa data dos millennials. Pollak diz que a nossa geração atingiu a maioridade sob uma lente diferente de qualquer geração anterior.
“Toda a crítica feita aos millennials – foi feita em relação a todas as gerações, mas foram amplificadas pela Internet e pelas redes sociais”, disse-me.
A geração millennial não tem sido mais propensa a mudar de emprego no início das suas carreiras. Na verdade, estão a mudar menos de emprego". Gray Kimbrough, economista e professor
Dorsey diz que, durante as suas apresentações, surgem frequentemente pormenores sobre a geração millennial que surpreendem muitas pessoas na sala.
“Acontece que eles são a maior geração na força de trabalho da empresa”, diz ele.
Dorsey apurou que muitos empregados tinham dado como adquirido o estereótipo e assumido que os millennials são preguiçosos ou desleixados. Mas, na verdade, diz ele, os millennials estão frequentemente entre os trabalhadores e gestores mais bem-sucedidos de uma empresa. E é assim que, no final da sua apresentação, todos eles levantam as mãos.
Kimbrough diz-me ainda que os millennials têm permanecido nos empregos durante tanto tempo como as gerações anteriores.
“Obviamente, as pessoas em início de carreira mudam de emprego a um ritmo mais elevado do que as pessoas em fase mais avançada da carreira”, afirma. “Os Millennials não têm sido mais propensos a mudar de emprego no início das suas carreiras. Na verdade, estão a mudar menos de emprego. Na verdade, tem havido um grande declínio na mudança de emprego desde cerca de 2000.”
Há mais de 12 anos que não mudo de emprego. E espero manter-me neste por muitos mais anos.
Tal como eu, muitos dos meus amigos estão a trabalhar para os seus empregadores há mais de uma década. Outros teriam ficado, mas foram vítimas de reestruturações empresariais.
A repetição de crises económicas é também uma parte importante da história dos millennials.
“Muitas vezes, os millennials dizem-me que finalmente sentem que estão no caminho certo”, diz Dorsey, “e depois acontece algo que está fora do seu controlo.”
Mito 5: somos eternamente jovens
Lembro-me de quando o meu pai fez 40 anos. A simples ideia de o fazer parecia-me ANTIGA. Os seus colegas de trabalho colaram papel preto à volta da sua fotografia e penduraram-na no escritório. Eu tinha 9 anos e ofereci-lhe um poema emoldurado que tinha escrito, sobre como ele não se devia sentir mal por estar a envelhecer.
“As engrenagens da tua cabeça ainda estão a girar”, escrevi, “e o teu cérebro, tanto quanto sei, ainda funciona”.
Portanto, sim, a ideia de que agora tenho 40 anos é, de alguma forma, algo que ainda estou a tentar compreender. Na maior parte dos dias, ainda me vejo como uma jovem adulta à procura do seu caminho neste mundo louco e confuso.
Mas quando falo com o meu marido sobre a nossa lista cada vez maior de dores estranhas, sobre o facto de já não gostarmos de ir a restaurantes barulhentos e sobre como as coisas costumavam ser, apercebo-me de que não estou propriamente velha, mas estou definitivamente mais na meia-idade do que gostaria de admitir.
Ainda assim, quando no ano passado li pela primeira vez que os millennials mais velhos estavam a começar a fazer 40 anos, esse pormenor chamou-me a atenção. O conceito pareceu-me surpreendente. Durante muito tempo, vimos sempre a mesma imagem da geração millennial.
“As pessoas falam da geração millennial como se fosse um termo universal para os jovens... e não é”, salienta Pollak.
Por vezes, quando olho para a minha filha, esta ideia torna-se mais clara e sinto a minha idade a aproximar-se de mim como uma tonelada de tijolos.
Ela é muito mais nova do que eu era nesta altura da vida dos meus pais. Ou, dito de outra forma, já sou muito mais velha do que os meus pais eram quando me estavam a criar. Eu tinha quase 39 anos quando a minha filha nasceu. O meu marido tinha acabado de fazer 41 anos. Quando ela acabar o liceu e for para a universidade, teremos ambos quase 60 anos. E se ela esperar tanto tempo como nós para ter filhos - se decidir que isso é o melhor para ela - poderemos ter 80 anos quando formos avós.
Pensar nestas coisas enche-me de ansiedade… e de uma pontinha de tristeza.
Crescemos a vermo-nos a nós próprios... como jovens emergentes, como agitadores, como as pessoas à volta das quais a cultura, e especialmente a cultura jovem, é moldada. É claro que nos vamos sentir incomodados com o facto de estarmos agora na meia-idade. Amil Niazi, escritora
A escritora Amil Niazi, que fez 40 anos em 2022 e tem dois filhos pequenos, descreve-o na perfeição - falando de como se encontra constantemente a fazer este tipo de contas e a “ficar presa aos números”.
“Agora que tenho estas crianças pequenas, doces e amorosas, tudo o que quero é mais tempo com elas, para fazer uma pausa, não sobre o seu crescimento e mudança, mas sobre mim e na versão de mim própria como a mãe que sou neste momento”, escreveu num artigo recente para o The Cut, onde também explorou o quão difícil e confuso é estar na meia-idade. “Fazer uma pausa nas dores de costas e de joelhos que aumentam um pouco mais a cada ano, parar os cabelos brancos e o colesterol alto, saltar os inevitáveis sustos médicos e a exaustão que parecem envolver cada vez mais os meus dias.”
Niazi, tal como eu e tantos outros millennials de meia-idade, tem vindo a aceitar o que significa já não ser jovem.
“Durante toda a minha vida... a história cultural foi sempre sobre a nossa juventude. E sempre foi sobre nós como uma espécie de geração jovem e disruptiva que era demasiado mimada, com um limite ao desenvolvimento, que estava a bater de frente com a vida familiar, a reforma, a habitação, o emprego”, disse-me Niazi. “Crescemos a vermo-nos a nós próprios dessa forma, como jovens emergentes, como agitadores, como as pessoas à volta das quais a cultura, e especialmente a cultura jovem, é moldada. É claro que nos vamos sentir incomodados com o facto de estarmos agora na meia-idade.”
Recentemente, passei por uma livraria com a minha filha para comprar alguns presentes.
Ela tem quase 18 meses, já caminha e, assim que a pousei no chão, foi a correr para a secção das revistas, onde havia muitas coisas para explorar ao nível dos seus olhos.
“Mamã!” exclamou ela, apontando alegremente para a capa de uma revista e arrancando-a da prateleira.
Uma morena radiante olhava para mim por baixo do título: “Pareça Ótima Com Mais de 50 anos”.
“Ela tem mesmo um ótimo aspecto”, pensei para mim, “mas com MAIS DE 50 ANOS?!”
Talvez a minha filha estivesse apenas a partilhar a sua alegria por estar a vasculhar a livraria? Certamente, ela não podia pensar que eu era mais de uma década mais velha do que já sou.
Mas, enquanto vagueava pela secção de revistas durante os 20 minutos seguintes, não parava de voltar àquela, dizendo sempre “Mamã”.
Quase a corrigi. “Oh, essa não é a mamã”, estava na ponta da minha língua quando me apercebi que não importa se, de alguma forma, ela me vê na capa da revista.
Há tanta coisa que ainda estou a tentar perceber, tanta coisa com que todos nós - millennials e não millennials - nos debatemos à medida que avançamos na vida…
Como refere Niazi, a matemática é verdadeiramente assustadora. E como este ano tão dolorosamente me recordou, nunca sabemos quanto tempo vamos ter com aqueles que amamos.
Com toda esta incerteza, há uma coisa que eu sei: a minha filha e eu temos muita sorte por estarmos juntas neste momento, a partilhar uma noite numa livraria - algo que eu fazia com os meus pais e que sempre sonhei fazer se alguma vez tivesse filhos meus.
Enquanto a observo a passear pelos corredores da loja, sinto-me muito orgulhosa de como ela parece ser feliz e curiosa.
A sua geração ainda nem sequer tem um nome - ou pelo menos não um que saibamos que se vai manter. Independentemente do nome que lhes dermos um dia, estou ansiosa por ver o que eles fazem.
Nota: artigo publicado originalmente na CNN a 31 de dezembro de 2022