"É absurdo, absolutamente estranho": militares vítimas de explosão em Santa Margarida não recebem subsídio de risco

3 mar 2023, 13:55
Exército

Associação Nacional de Sargentos sublinha problema que se arrasta há anos. Família do sargento que morreu deverá receber subsídios

Um militar morreu e outros cinco ficaram feridos depois de uma explosão ocorrida no Campo Militar de Santa Margarida, em Constância. O grupo estava a desativar minas, sendo que uma delas acabou por explodir na sequência do processo. Nenhum dos militares em causa, todos sargentos, recebe subsídio de risco associado à função, que estaria associada à “destruição de explosivos, munições e foguetes”, segundo o Exército.

O presidente da Associação Nacional de Sargentos afirma à CNN Portugal que se trata de uma "questão antiga" que já foi várias vezes debatida com os altos cargos das Forças Armadas. O sargento-mor António Lima Coelho diz que este é um assunto já abordado junto das chefias do Exército, nomeadamente os responsáveis pela engenharia, uma vez que instrutores e inativadores não estão a receber um subsídio "que a lei prevê para este tipo de atividades".

 

"Em alguns cursos que dão, os instrutores recebem subsídios e, curiosamente, os sargentos que realizam as operações não. É absurdo, absolutamente estranho", acrescenta.

O problema, refere António Lima Coelho, está por resolver desde cerca de 2007, altura em que deu entrada no Exército um despacho que o sargento-mor diz precisar apenas de uma autorização de um general. "Há anos que é assim e não reconhecem um subsídio que é necessário", sublinha.

O sargento-mor garante que a situação é igualmente do conhecimento do Ministério da Defesa, que acaba por se "desculpar" referindo que se trata de uma "questão interna" do Exército.

A CNN Portugal pediu esclarecimentos ao Estado-Maior-General das Forças Armadas, que remeteu esclarecimentos para o Exército. A CNN Portugal contactou também o Exército e o Ministério da Defesa, mas não obteve respostas até ao momento.

Subsídio por invalidez

Dois dos feridos são considerados graves, havendo para todos possibilidade de sequelas posteriores ao acidente. O regime de responsabilidade da Caixa Geral de Aposentações prevê o pagamento de prestações a casos deste género, equivalendo-os a doença profissional.

Desde logo, existe um subsídio único caso haja uma incapacidade permanente igual ou superior a 70%. Neste caso, o doente terá direito a um subsídio igual a 12 vezes ao salário mínimo, ou seja, 9.120 euros.

O cálculo de uma pensão de invalidez a atribuir mensalmente depende sobretudo do ano de início de funções. No caso dos militares feridos, assumindo pelas idades que todos iniciaram funções após 1993, aplica-se uma pensão que terá de ter em conta os seguintes fatores: remuneração mensal ou número de anos em que se trabalhou mais de 120 dias. Todos os anos a pensão deve ser atualizada, normalmente indexada à taxa de inflação.

Sem prejuízo disso, um militar que fique com 30% de invalidade terá sempre direito a uma pensão de invalidez a atribuir mensalmente. É essa a incapacidade mínima para auferir uma pensão, de acordo com o Balcão Único da Defesa. Já o cálculo é feito com recurso à percentagem de incapacidade atribuída a um Deficiente das Forças Armadas (DFA), cuja garantia será concedida por uma junta de saúde e homologada pelo Ministério da Defesa. Essa percentagem terá influência na "remuneração mínima mensal devida por trabalho em tempo completo", ou seja, é paga mensalmente uma percentagem do salário mínimo de acordo com a invalidez atribuída.

Se essa capacidade for igual ou superior a 90%, havendo lesões profundas ou limitação de movimentos, também será devido o pagamento de uma prestação suplementar de invalidez.

Família da vítima mortal com direito a subsídios

O Estado terá de pagar à família de Carlos Mota, o sargento-ajudante que morreu na sequência do caso que o Exército diz ser um “grave acidente”. De acordo com a lei em vigor, e que é referida num documento do Ministério da Defesa, as duas filhas e a mulher da vítima têm direito a um subsídio por morte.

Esse valor era calculado em seis vezes o valor da remuneração mensal auferida pelo militar, neste caso um sargento-ajudante, que ganha entre 1.561 e 1.716 euros, de acordo com a folha salarial publicada pelas Forças Armadas, e cuja aplicação se fez em 2013. Na prática, cada um destes familiares poderia vir a receber um valor bruto entre os 9.366 e os 10.296 euros. Mas, como lembra o sargento-mor António Lima Coelho, uma medida do governo de Pedro Passos Coelho reverteu este valor, sendo que, atualmente, o subsídio atribuído é de apenas três vezes o valor do Indexante de Apoios Sociais (IAS), atualmente fixado em 480 euros, o que significa que estes subsídios só poderão ir até um limite de 1.440 euros. A família tem ainda direito ao reembolso do montante pago pelo funeral.

A mulher de Carlos Mota terá também direito a uma pensão de sobrevivência pela morte do marido. De acordo com a lei aprovada em 2006, e que regula situações de pensões na Administração Pública, o valor terá de ser calculado com recurso a duas parcelas diferentes, contabilizando o tempo em que foram feitos descontos até 2005, e, numa segunda parcela, o tempo descontado desde então.

Neste caso, segundo a Caixa Geral de Aposentações, será atribuído 60% do valor do salário que era auferido pelo militar. Os descendentes, desde que tenham menos de 18 anos, também terão direito a um valor mensal até completarem a maioridade. Neste caso, havendo duas crianças, será pago 30% do valor. Ou seja, a família de Carlos Mota receberá uma pensão de sobrevivência de 90% do salário até que as filhas sejam adultas, sendo que a mulher ficará a receber os 60% até morrer.

O sargento-mor António Lima Coelho alerta que, apesar de terem direito a todos estes apoios, os militares feridos (caso necessitem de pensão) e a viúva terão de esperar pela decorrência dos trâmites legais.

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