As viagens de Oswald, a máfia e um plano para matar Fidel. Os documentos desclassificados sobre a morte de JFK

18 dez 2021, 14:44
Lee Harvey Oswald, o homicida de JFK, após a detenção em 1963 Foto: AP

Foram desclassificados 1.500 novos documentos sobre a investigação à morte de Kennedy, mas 10.000 continuam secretos. Numa primeira análise, investigadores dizem que informação nova é pouco relevante e interessa a quem estuda espionagem no período da Guerra Fria

O Arquivo Nacional dos Estados Unidos da América divulgou 1.500 novos documentos sobre a investigação ao homicídio do presidente John F. Kennedy, em 1963. São, na maioria, memorandos internos da CIA e FBI, telegramas ou registos de chamadas telefónicas que, segundo uma primeira análise, não deverão alterar de forma substancial o que já se sabe sobre a morte de JFK às mãos de Lee Harvey Oswald em Dallas, a 22 de novembro de 1963. 

Ainda assim, esta nova fatia de documentação - que pode ser consultada aqui -  era aguardada com expectativa por historiadores e investigadores: 58 anos após o crime, subsistem dúvidas sobre a verdadeira autoria, bem como muitas teorias da conspiração que duvidam de que um jovem problemático, com simpatia pela União Soviética, seja o único responsável pelo homicídio. 

Os documentos agora desclassificados incluem telegramas da CIA ou anotações sobre as visitas de Lee Harvey Oswald às embaixadas da União Soviética e Cuba na Cidade do México. Estas deslocações do homicida de Kennedy já eram conhecidas mas nunca foram explicadas. Nos registos lê-se também que a comissão que investigou a morte de Kennedy - a Comissão Warren - analisou um potencial envolvimento de Cuba no crime.

Um dos telegramas da CIA agora divulgados descreve como Oswald pediu um visto à embaixada da União Soviética no México, tendo igualmente demonstrado interesse numa autorização para viajar para Cuba, onde queria aguardar o visto que lhe permitiria chegar depois à URSS. Mas, cerca de um mês antes de disparar contra o presidente dos EUA, Oswald acabaria por abandonar a Cidade do México, regressando aos EUA pela fronteira do Estado do Texas.

Outro registo, com data do dia a seguir à morte de Kennedy, revela que o homicida tinha comunicado com um agente dos serviços secretos russos quando esteve na embaixada soviética na Cidade do México. E há mesmo um documento que revela um plano dos EUA para assassinarem Fidel Castro em 1960 que envolveria "o recurso ao submundo criminoso com contactos dentro de Cuba".

Um pormenor dos documentos agora desclassificados Foto: AP

Outro ficheiro revela vários relatórios do FBI sobre os esforços dos agentes para investigarem e vigiarem os homens fortes da máfia na altura, conhecidos como Santo Trafficante Jr. e Sam Giancana, que são frequentemente referidos nas teorias da conspiração sobre o homicídio de JFK.

E há também uma anotação que questiona se, quando Oswald vivia em Nova Orleães, poderá ter sido influenciado pela publicação num jornal local de uma entrevista da Associated Press a Fidel Castro, em que Castro avisava para a "retribuição" aos EUA no caso de serem depostos líderes cubanos.

Sabe-se também, a partir desta nova informação agora divulgada, que as autoridades mexicanas prenderam uma funcionária da embaixada cubana, com quem Oswald tinha comunicado, e que esta terá revelado que o homicida de John F. Kennedy dizia ser "um comunista e admirador de Castro". 

Os especialistas admitem que serão ainda necessários alguns dias até que toda a documentação agora libertada seja passada a pente fino, mas a maior fatia de informação deverá interessar a académicos, curiosos ou estudiosos das técnicas de espionagem e contraespionagem do período da Guerra Fria, uma vez que há várias páginas que detalham os métodos, equipamento e pessoal envolvido na vigilância das embaixadas de Cuba e da União Soviética na Cidade do México. Até ao momento, foram divulgados cerca de 90% dos ficheiros classificados da investigação. 

Mais de 10.000 documentos por divulgar

Permanecem por divulgar, parcialmente ou na totalidade, mais de 10.000 documentos, que não deverão ser tornados públicos antes de dezembro de 2022 na sequência de uma decisão do presidente Biden no passado mês de outubro, recorda a CNN. A medida veio prolongar o braço de ferro entre o governo dos EUA e os investigadores que se dedicam a analisar o caso, que alegam que a CIA, o FBI e outras agências de segurança norte-americanas estão a opor-se à divulgação de documentação que foi decidida pelo Congresso. 

"É sempre na próxima vez", disse à CNN Larry Sabato, académico reconhecido no estudo do homicídio, que diz que a maioria dos documentos agora divulgados já era conhecida. Os novos ficheiros deixam visíveis palavras antes censuradas, nomeadamente nomes de agentes da CIA ou a localização da agência de segurança que forneceu dados de investigação.

 "A razão pela qual é tão importante [a divulgação de documentos secretos] não é sequer porque iremos aqui encontrar uma prova irrefutável que mude toda a teoria sobre o assassínio de Kennedy", explicou Sabato. O investigador diz que a falta de transparência e secretismo são a razão da enorme quantidade de teorias da conspiração em torno do crime. 

Em 1992, e na sequência da propagação de teorias da conspiração motivadas pelo filme JFK, de Oliver Stone, o Congresso dos EUA decidiu que todos os registos relacionados com a investigação ao homicídio deveriam ser tornados públicos até outubro de 2017. Mas o presidente Trump permitiu que milhares de documentos permanecessem secretos a pedido do FBI, da CIA e outras agências de segurança nacional, que alegam eventuais riscos para os EUA devido à informação sensível ali divulgada.

Em outubro de 2021, Biden voltou a atrasar, agora para dezembro de 2022, a divulgação dos documentos na totalidade, alegando que os dados poderiam trazer perigo às operações dos serviços secretos, forças de segurança ou relações internacionais dos EUA, com o risco inerente a suplantar o eventual interesse público no homicídio do presidente democrata. 

E.U.A.

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