Alegado violador e a mãe pegaram fogo a uma adolescente depois de saberem que estava grávida

CNN , Rhea Mogul, Swati Gupta e Manveena Suri
12 out 2022, 23:00
Índia

Uma rapariga de 15 anos está a ser tratada num hospital no norte da Índia, depois de ter sido alegadamente incendiada por um homem acusado de a violar e engravidar, no último caso de violência contra as mulheres que chocou o país.

Kamlesh Kumar Dixit, um alto funcionário da Polícia do estado de Uttar Pradesh, informou a CNN que o homem de 18 anos e a sua mãe foram presos na segunda-feira por suspeita de tentativa de homicídio, depois de alegadamente terem deitado querosene sobre a rapariga e terem-na incendiado, a 6 de outubro.

A Polícia também acusa o homem - que é um primo da alegada vítima - de a violar há cerca de três meses, tendo consequentemente engravidado a vítima, afirmou Dixit.

Ao saber da gravidez da rapariga, a sua família e a família do alegado violador tinham discutido se os dois deviam casar, acrescentou.

Citando a Polícia, o Press Trust da Índia - a maior agência de notícias do país - relatou que a rapariga foi atraída para a casa do alegado violador sob o pretexto de casar com ele, tendo então sido alegadamente incendiada. No entanto, Dixit recusou-se a comentar quando questionado sobre este detalhe do caso.

A Índia há muito que se debate com uma epidemia de violência contra mulheres e raparigas neste país extremamente patriarcal. E os ativistas afirmam que o alegado envolvimento de uma mulher neste último caso demonstra a escala de misoginia enraizada na sociedade.

“Tornei-me tão apática a histórias como esta. Há uma falta de empatia no nosso país”, afirmou Yogita Bhayana, uma ativista anti-violação de Nova Deli. “Durante anos, temos tentado mudar as coisas. Este caso demonstra uma falha do nosso sistema. Esta rapariga devia ter sido ajudada.”

A condição da rapariga e o estado da sua gravidez são desconhecidos. A CNN contactou o hospital onde ela está a ser tratada para obter comentários.

‘Lacunas por todos os lados’

Dixit, o funcionário da Polícia, referiu que a alegada violação ocorreu há cerca de três meses em Mainpuri, cerca de 270 km a sudeste da capital da Índia, Nova Deli.

O distrito no estado mais populoso da Índia, Uttar Pradesh, é um dos grandes alvos da campanha “Beti Bachao Beti Padhao” (Salvem a Rapariga Eduquem a Rapariga) do Primeiro-Ministro Narendra Modi, destinada a melhorar a igualdade de género no país.

Os painéis publicitários com o slogan da campanha e a fotografia de Modi são um elemento fundamental nos estados do norte do país. Mas os ativistas dizem que nos sete anos desde a sua implementação, pouco tem sido feito para dar poder às mulheres e raparigas, e os crimes violentos contra as mulheres persistem.

Em dezembro do ano passado, a campanha esteve sob escrutínio por gastar quase 80% dos seus fundos em publicidade, em vez de programas de educação para facilitar a mudança.

“Podemos ter todos os cartazes do mundo, mas só isso não resolverá esta enorme crise no nosso país”, salientou Bhayana, acrescentando que o dinheiro deveria ser gasto na educação de jovens rapazes e raparigas sobre consentimento, respeito e direitos das mulheres, e na formação de agentes policiais para melhor lidar com os casos de agressão sexual.

Segundo Bhayana, muitos homens ainda encaram a violação como um “ato de poder” sobre as mulheres. E, na maioria das vezes, a violência não é denunciada, uma vez que a vítima tem demasiado medo de ir à Polícia, ou é muitas vezes ensinada a sentir-se culpada de qualquer ato ilícito, acrescentou.

Essas crenças parecem também ter sido defendidas neste caso, uma vez que a rapariga não denunciou a sua alegada violação durante três meses, de acordo com Dixit.

“Há lacunas por todo o lado”, disse Bhayana, referindo-se ao tecido social patriarcal da Índia e ao sistema jurídico, que é claramente lento.

Em 2019, o governo central aprovou um plano para abrir mais de 1.000 tribunais de tramitação prioritária em toda a Índia para ajudar a eliminar uma acumulação de casos de violação e ofensas sexuais contra menores.

No entanto, de acordo com dados apresentados pelo ministro da lei e da justiça na Câmara Alta do Parlamento, em dezembro de 2021, foram criados menos de 700 tribunais desse tipo.

O patriarcado nos tribunais

Os atos brutais de violência são frequentemente notícias de primeira página no Uttar Pradesh.

Em dezembro de 2019, uma mulher morreu no estado depois de ter sido incendiada, enquanto viajava para testemunhar no julgamento de dois homens acusados de a terem violado. No ano seguinte, uma mulher de 19 anos da comunidade Dalit - os estratos mais baixos do sistema de castas da Índia - morreu depois de ter sido alegadamente violada e estrangulada por homens das castas superiores, num caso que evidenciou as lutas enfrentadas pelas comunidades minoritárias.

E embora a Índia tenha, nos últimos anos, dado alguns passos em frente para proteger as mulheres, os tribunais do país foram alvo de duras críticas no passado por algumas das suas sentenças controversas em casos de agressão sexual.

Em agosto, um juiz do estado sulista de Kerala decidiu que uma mulher usava roupas “provocatórias”, rejeitando efetivamente a sua queixa de agressão sexual, o que causou indignação no país.

Em 2017, um juiz do Supremo Tribunal de Deli disse que um homem merecia “o benefício da dúvida”, enquanto o absolvia de acusações de violação, acrescentando que um “fraco 'não'” poderia ainda dar a entender que existia vontade por parte de uma alegada vítima.

Num outro caso, em janeiro de 2021, um juiz do Supremo Tribunal de Bombaim declarou que um homem de 39 anos não era culpado de agressão sexual a uma rapariga de 12 anos por não lhe ter tirado a roupa, o que significava que não tinha havido contacto pele com pele.

Foram introduzidas reformas legais e penas mais severas por violação na sequência da brutal violação em grupo a uma estudante de Medicina em Deli, em 2012. Mas ativistas como Bhayana afirmam que devem ser tomadas mais medidas para proteger as mulheres e raparigas no país.

“Estamos a falhar às nossas mulheres. Nunca deveria haver lugar para violência deste género”, afirmou Bhayana.

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